Raquel Recuero, oradora convidada do segundo dia da IV Conferência Internacional Comunicar Ciência, deu especial importância ao contexto de polarização e às bolhas ideológicas que as redes sociais proporcionam, criando terreno fértil para a desinformação e impedindo o seu combate.

Os novos algoritmos das redes sociais, a automação dos meios de comunicação e a ineficácia dos sistemas de verificação de informação falsa foram alguns dos fatores apontados pela investigadora da Universidade Federal de Pelotas, durante a sua comunicação “Desinformação, Discurso e Mídia Social”. Mas foi no enquadramento político e na legitimação de um discurso falso por essas autoridades que Recuero viu o principal fator para a onda de desinformação que se instalou durante o combate à pandemia, sobretudo no Brasil, país a partir de onde acompanhou os acontecimentos.

Para Raquel Recuero, que esteve na Covilhã pela primeira vez , no Brasil “o papel das autoridades foi importantíssimo no descrédito da pandemia, das vacinas e das ações de combate”, afinal “quando a desinformação provém de autoridades, principalmente de pessoas que detém um cargo político ou possuem expertise na área da saúde, esse conteúdo tende a espalhar-se muito mais rápido e entre muito mais gente”, até fazer desacreditar as instituições credíveis, como são as científicas.

Esse cenário tende a criar “bolhas ideológicas que compartilham apenas conteúdo alinhado a seu posicionamento político” e em que “fica difícil a verificação de factos entrar”, daí a “dificuldade na circulação da informação qualificada, checada, nos grupos onde circula a desinformação sobre a pandemia”. Discursos populistas e “estratégias discursivas de disputa de sentido” ou seja, afirmações como «isto não é verdade», «eles estão-vos a enganar», também foram destacados nesta teia de propagação.

Para Raquel Recuero, “a covid-19 foi o início de uma onda de desinformação que agora se estende a outros conteúdos” e considerando esse um “problema sistémico”, a investigadora diz serem necessárias “estratégias sistémicas”, que se adaptem aos tempos e aos meios tanto como a desinformação. A solução passará então pela melhoria dos sistemas de verificação abrangente a todos os meios de comunicação, mesmo os tradicionais; campanhas “massivas” contra a desinformação e sobretudo, literacia digital e científica.

“Nós precisamos de checagem e autoridades que protejam a ciência ao invés de minar a ciência, precisamos, enquanto cientistas, de chegar às pessoas. Há muitos argumentos falaciosos mas a ciência é um processo”, respondia a investigadora durante o debate do terceiro painel de conferências.

Levar a ciência ao povo

A ideia de que “é preciso levar a ciência ao povo e o povo à ciência” é partilhada por Carlos Fiolhais, Professor da Universidade de Coimbra e conhecido pelo seu pioneirismo na comunicação e divulgação de ciência em Portugal. Mas o investigador admite que “hoje em dia isso é cada vez mais é difícil com todo o ruído existente na comunicação”.

No segundo dia da “IV Conferência Comunicar Ciência: Desinformação durante o combate à pandemia covid-19” destaque ainda para o investigador e catedrático da Universidade do Minho, Moisés de Lemos Martins e a sua comunicação sobre “Pandemia, informação e comunicação da ciência”.

O encontro terminou com a apresentação de trabalhos e perspetivas metodológicas sobre “Comunicar Ciência e Tecnologia”, onde participaram dezenas de investigadores de todo o país e do estrangeiro.

Felisbela Lopes, docente da Universidade do Minho, trouxe ao evento uma comunicação em torno dos desafios da comunicação no pós-pandemia.