Voltar à Página da edicao n. 380 de 2007-05-15
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“Escutar a surdez” pela Língua Gestual

O facto é desconhecido de muitos, mas a Língua Gestual Portuguesa é um dos três idiomas oficiais no nosso País. Por isto, e pelo papel cada vez maior que a comunidade surda-muda assume, Sofia Videira organizou dois dias de palestras e workshops abertos.

> Igor Costa

A fraca afluência às diversas conferências agendadas não retirou mérito e valor à iniciativa promovida por Sofia Videira, aluna finalista de Ciências da Comunicação da Universidade da Beira Interior (UBI). O número de assistentes acabou por permitir uma dinâmica mais intensa nas tardes de 7 e 8 de Maio. No decorrer dos dois dias houve tempo para falar da situação dos surdos-mudos em Portugal, nos seus empregos, na escola e na sua vida social, e para aprender elementos essenciais da Língua Gestual Portuguesa. O encontro contou com a presença de Rosalinda Lima e Carla Silva, professoras, Sara Barbosa, intérprete, e António Araújo, formador e presidente da Associação de Surdos de Braga.
Por tudo isto, Rosalinda Lima referiu a importância de a comunidade em geral, para além dos círculos de amigos ou familiares, terem uma educação bilingue, que conjugue a Língua Portuguesa com a Língua Gestual Portuguesa. São muitas as dificuldades que se levantam a este nível, a começar pelos erros na utilização da terminologia. A expressão “linguagem gestual” é mais vasta, e diz respeito aos gestos e expressões faciais que, também nos falantes, acompanham as palavras. O espaço pessoal, a postura, o toque, o contacto visual, o sorriso e os movimentos com a cabeça são, neste particular, áreas problemáticas.
Já a Língua Gestual diz respeito aos movimentos das mãos que, de país para país, definem arbitrariamente a percepção da comunidade não-falante. Trata-se de uma língua que, no seu ambiente natural, pode evoluir de forma constante e criativa. Este ambiente natural e a forma como são geridos os espaços de integração são alguns dos aspectos que Rosalinda Lima mais refere: “Inclusão não quer dizer que somos iguais, mas vê com respeito a nossa necessidade, a nossa diferença”. Isto porque, ao longo da História, a comunidade surda-muda sempre foi estigmatizada, sendo a sua condição associada a incompetência. De Sócrates a Aristóteles, só no século XVI foi reconhecida a capacidade cognoscitiva dos surdos.
Carla Silva, também oradora, identifica ainda hoje muitas dificuldades com que se deparam estes cidadãos. A falta de abertura da sociedade é uma delas, e nem as famílias conseguem deixar de ser atingidas pelas críticas.
Uma comunicação que a professora caracteriza de essencial, até porque “todas as pessoas gesticulam quando não se conseguem expressar verbalmente”. Desde 1992 que a comunidade já dispõe de um gestuário, de forma a facilitar a comunicação gestual. Isto porque um dos tratamentos a que os surdos mais recorrem, o aparelho auditivo, apresenta mais desvantagens que benefícios. O implante coclear é, muitas vezes, rejeitado pelo organismo. Dores de cabeça, náuseas, comichões no ouvido são factores que fazem os surdos optar por aprender a Língua Gestual.
Uma outra batalha é a travada nas escolas e, neste particular, Rosalinda Lima estabelece três condições para a criação de um projecto pedagógico de qualidade: respeito pelos diferentes ritmos de aprendizagem, flexibilidade de currículos e tentar mudar a realidade. Carla Silva encontra dois aspectos que dificultam este projecto: “Primeiro, muitas das escolas não têm um intérprete a tempo inteiro, e para além disso, numa turma de ouvintes, estar com portadores de deficiência auditiva faz com que eles, muitas vezes, não consigam acompanhar as aulas”.


Data de publicação: 2007-05-15 00:03:00
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