Editorial
Verdes
anos
Anabela Gradim*
Editorial
Verdes Anos
Anabela Gradim*
Os últimos 20 anos não deixaram pedra sobre pedra no campo dos media. O
Urbi@Orbi celebra este mês duas décadas de vida e de então para cá, desse agora já
longínquo ano 2000, quase tudo mudou para o jornalismo. A crise que as tecnologias
digitais levaram a tantos sectores económicos, e que abalou todo o mundo do
trabalho, foi particularmente sentida no sector dos media, e dentro destes, naqueles
que se dedicavam a fazer notícias em formato jornalístico.
Os últimos vinte anos trouxeram ao campo dos media alterações económicas e
políticas (globalização, desindustrialização, financeirização da economia, crise do
trabalho), alterações tecnológicas (convergência de plataformas e formatos,
emergência do webjornalismo, multiplicação de produtos “para-jornalísticos”,
passagem para modelos de transmissão da informação multidirecionais e em rede),
alterações de mercado (inexistência de um modelo de negócio consolidado para o
online, a par da consolidação de lógicas concorrenciais de mercado lesivas dos valores
tradicionais do jornalismo, nomeadamente aposta na espectacularização,
infotainment, tabloidização da informação, compressão de custos, esvaziamento do
jornalismo de investigação), e alterações das condições de produção (aceleração dos
processos de acesso e controlo da informação, com consequências ao nível do fact checking
e da credibilidade das empresas jornalísticas, democratização do espaço
público e perda do poder de agenda setting).
A crescente falta de confiança do público acompanhou o desenvolvimento destes
processos. Com um modelo de negócio – vender a atenção do público, captada através
de informação gratuita, a anunciantes – esgotado ou à beira disso, os próximos 20
anos serão decisivos para o futuro do jornalismo, que terá de adaptar-se a públicos
cada vez mais exigentes, no meio de um desnorte ético e uma superabundância
informativa que o colocam, muitas vezes, como um discurso entre os demais. Este
discurso consubstancial à democracia – pois que não existem uma sem a outra –
certamente evoluirá na forma e no conteúdo; mas é sobretudo ao nível do
financiamento, do modelo de negócio e do reconhecimento do seu estatuto de bem
público que se joga o seu futuro.
Este não será um problema do Urbi@Orbi, que enquanto laboratório pode dedicar
todos os seus recursos à prática dos valores do jornalismo, à descoberta de novos
formatos e à inovação, prosseguindo a sua missão de treinar as novas gerações de
profissionais dando especial ênfase aos valores e responsabilidade social do
jornalismo, à ética e deontologia da praxis jornalística, e ao cultivo dos seus géneros
clássicos, sem os quais (sem cânone), não há transgressão nem inovação.
Linguagem com mais de um século, vive tempos conturbados o jornalismo. Mas no
Urbi, que ainda é um jovem, ensinamos que não há nenhuma empresa jornalística em
que a seriedade, o talento, a competência e o rigor não sejam valorizados. Os nossos
alunos, que fizeram e fazem o jornal, têm em abundância essas qualidades que juntos
cultivamos.
*Diretora do Urbi et Orbi