A noite da Covilhã já
não é o que era. A opinião, quer dos proprietários
dos bares e discotecas quer dos clientes parece ser unânime:
"Antigamente, há três ou quatro anos atrás,
havia mais gente na rua do que hoje em dia". As causas apontadas
para o decréscimo de clientela nocturna são muitas
e passam, essencialmente, por factores de ordem económica.
Uma diminuição do poder de compra é indicada,
pela grande maioria dos empresários, como o principal
entrave à saída dos jovens. Um problema que afecta
sobretudo os estudantes universitários. Um sector de mercado
extremamente importante e vital para a indústria da noite
que, só aos fins-de-semana, pode contar com outro tipo
de clientela, constituída, essencialmente, pelos adolescentes
covilhanenses.
Outro dos motivos mais advogados para a inibição
dos estudantes é a nova política pedagógica
da Universidade da Beira Interior. "O novo sistema de calendarização
de exames e prescrições da UBI também contribuem
para que os alunos não saiam tanto à noite porque
têm que se aplicar", explica Guilherme Carreira, proprietário
do "Lá em cima bar". "Há uns anos
atrás a universidade facilitava mais do que hoje em dia
e os alunos andavam mais na borga", afirma António
Almeida, sócio gerente do Rosa Negro e da discoteca Ex-Libris.
Hoje a mentalidade é outra. Chegados de vários
pontos do País, os alunos empenham-se mais no estudo e
em acabar o curso no menor espaço de tempo possível.
"A tendêcia, de alguns anos a esta parte, é
para os universitários ficarem mais tempo em casa".
acrescenta Pedro Figueiredo, dono da discoteca "& Companhia".
E continua: "A preocupação agora, é
estudarem para não deixar cadeiras para trás, o
que é bom. Estão a acabar aqueles que chegam às
oito ou nove matrículas e isso reflecte-se na assiduidade
da noite". De qualquer modo o empresário acredita
que a noite da Covilhã continua a ser "frequentada"
pelo mesmo número de pessoas. "O que se passa é
que, há uns anos atrás havia um grupo de uma ou
duas centenas de boémios que saíam todas as noites.
Hoje esse grupo é muito diminuto e dá a impressão
que há menos gente na rua mas, o resto do pessoal continua
a saír aos dias do costume". Mas se os dias do costume
antes eram as terças e quintas-feiras, para os universitários,
e os fins-de-semana para os residentes da Covilhã e arredores,
hoje ficam-se pelo quinto dia da semana e pelo sábado.
Segundo Mário Diogo, funcionário do Rosa Negro,
são estas as noites "mais complicadas". "As
pessoas escolhem dias muito específicos para saír.
Se umas vezes os bares estão quase vazios, outras estão
na lotação máxima porque as pessoas aparecem
em doses maciças e tornam mais difícil o trabalho
dos funcionários".
Quem parece não ter razões de queixa é Jorge
Pinto, gerente do bar do PC. "Há dias de maior e
menor afluência mas, fora a época de exames, a casa
costuma estar sempre cheia". O segredo, afirma, "não
é apenas o facto de ser mais barata, mas a simpatia que
se tem para com o cliente".
A guerra da cerveja
Ainda não se pode falar em crise do sector. Se assim fosse,
reitera José Pinto, dono do "Fora d'Horas",
mais valia fechar. De qualquer modo, os bares passam hoje por
dificuldades inexistentes há meia dúzia de anos.
Os elevados impostos pagos pelos empresários para a Sociedade
Portuguesa de Autores (SPA), Finanças e pela concessão
de alvará estão a reduzir cada vez mais a margem
de lucro. Mas o problema, queixa-se a maioria, não reside
no imposto em si. "São os cafés e os bares
de associações que estão a dificultar a
vida dos bares", esclarece Marco Leão, proprietário
do "Forum". "Passa tudo por uma questão
de horários. Esses estabelecimentos não têm
que pagar os impostos que nós pagamos e podem estar abertos
até à mesma hora que nós e até vender
as bebidas a um preço muito inferior. A anarquia reina
e ninguém faz nada para proteger os investimentos que
fazemos. Devia distinguir-se, de uma vez por todas, os bares
dos cafés".
Por outro lado, revelam off the record alguns proprietários,
"há uma espécie de guerra entre as duas mais
conhecidas cervejeiras portuguesas que se estende a alguns bares
dos quais são fornecedoras". Uma situação
que se reflecte nas promoções utilizadas para cativar
clientes e que passam, na maior parte das vezes, pela diminuição
do preço da imperial. "Um incentivo ao consumo abusivo
do álcool", avisa Marco Leão. Mas o dono do
Fórum aponta outras causas para o decréscimo de
clientes e fala mesmo em "degradação da noite".
"Antes havia algo de místico quando se saía
à noite. Procurava-se algo e não se sabia como
e onde se ia acabar. Hoje, pelo contrário, as pessoas
saem predestinadas. Procuram o álcool e vão onde
ele é mais barato. As associações"
(ver caixa ao lado). Pedro Figueiredo, não vê as
coisas da mesma forma. "É natural que os donos dos
bares se sintam prejudicados, mas as tascas, os bares de associações,
são necessários. Não pagam tantos impostos,
são mais baratos e, claro, são mais procurados
porque o estudante universitário não tem muito
dinheiro". Quanto ao facto de os clientes procurarem nas
associações o álcool mais barato em vez
da qualidade de outros bares, Figueiredo é peremptório:
"Ninguém está no negócio da noite para
vender leite". |