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Comandante dos Bombeiros Voluntários da Covilhã não tem dúvidas
Fogo posto na Vila do Carvalho



 

POR CATARINA MOURA

 

De dia e de noite, a sirene dos bombeiros dá o alerta constante: fogo. Na altura em que se completam dez anos sobre o incêndio que a destruiu parcialmente, a Serra da Estrela volta a arder. Vila do Carvalho, Santo António, Erada, Ourondo, Verdelhos, Sarzedo, Orjais, Aldeia do Souto e Trigais, têm deixado os bombeiros da Covilhã e as diversas corporações da região sem mãos a medir. Apesar de alguns serem acidentais, a maioria destes fogos poderá ter mão criminosa na sua origem. As colinas de fumo negro tornam-se parte da paisagem serrana, que é agora mais um dos pontos críticos do País. 

São cerca de 30 as pessoas que, ao cair da noite de terça-feira, se juntam no jardim público da Covilhã para observar a progressão das chamas que, há 24 horas, consomem a encosta da Vila do Carvalho. Sentados nos bancos, os mais velhos relembram o grande incêndio que, há dez anos, destruiu parcialmente a Serra da Estrela, temendo que a montanha volte novamente a vestir-se de negro.
Na manhã de quarta-feira, cerca de 36 horas depois do seu início, o incêndio é finalmente declarado circunscrito, apesar de as chamas ainda não estarem completamente extintas. De acordo com o comandante dos Bombeiros Voluntários da Covilhã, José Flávio, há mão criminosa na origem do incêndio. "Este fogo está a ser trabalhado inteligentemente, tanto aqui como em Santo António, de modo a aproximar as chamas que consomem os flancos da encosta. A pessoa sabe exactamente o que está a fazer, pois o fogo surgiu simultaneamente em vários sítios, a maioria de difícil acesso aos bombeiros", revela.
O incêndio da Vila do Carvalho vem juntar-se às dezenas que, na última semana, têm fustigado a região, a maioria com origem criminosa, de acordo com os bombeiros, que já solicitaram a intervenção da Polícia Judiciária. Os incêndios da Erada e de Orjais foram já classificados como "os piores da última década no distrito de Castelo Branco". Apesar de a área ardida ainda não ter sido calculada, levantamento que ficará a cabo da Direcção-Geral de Floresta, sabe-se já que na Erada mais de 70 por cento da área florestal ficou destruída.

Governo esqueceu Interior

E é assim que, a meio do Verão, o número de fogos no distrito supera já o total de todo o ano anterior. De acordo com dados do Centro de Coordenação Operacional da Sertã, desde o princípio de Agosto ocorreram cerca de 150 fogos no distrito de Castelo Branco, mobilizando 2267 bombeiros e 521 viaturas. A falta de meios tem sido uma das principais dificuldades enfrentadas pelos bombeiros, a que se juntam as condições climatéricas e os complicados acessos aos locais em chamas.
O edil covilhanense Carlos Pinto declara, em comunicado, que "só a irresponsabilidade do Governo permitiu esta calamidade". De acordo com este responsável, ao não serem dados meios às autarquias para combater eficientemente os incêndios, o Governo demonstra negligência e incompetência, acentuadas pela inexistência de uma política coordenada para o sector florestal.
"A Covilhã, que possui o melhor aeródromo do Interior, por uma irreflectida atitude política do Governo deixou de ter quatro aviões de combate ao incêndio. Dispõe agora apenas de um helicóptero para socorrer uma vasta região e para combater o fogo que, por vezes, lavra em várias frentes", continua o presidente. Carlos Pinto refere ainda a insuficiência de meios para a desmatação e vigilância das florestas, acusando o Governo de ter esquecido o Interior e "a regionalização na hora de distribuir os meios de combate aos incêndios, na hora de equipar os bombeiros, na hora de defender as florestas".

Regeneração natural em perigo

O incêndio na Vila do Carvalho faz temer pela regeneração natural da serra, que ainda está a recuperar da tragédia de há dez anos. De acordo com os especialistas, são necessários 15 a 20 anos para conseguir novamente uma floresta em condições. Por outro lado, a reincidência de incêndios pode tornar o solo estéril, além de que é todo um ecossistema que fica destruído com as chamas.
A reflorestação de uma área ardida é uma tarefa complexa, que exige cuidado, sapiência e responsabilidade. Contrariamente ao que difunde o senso-comum, não basta plantar árvores. Em primeiro lugar, há que ter em conta os valores naturais do terreno, respeitando a aptidão do mesmo ora para a floresta ora para o mato. Outro factor a ter em conta é a proliferação de espécies infestantes, que são muito resistentes e abafam as outras espécies, causando a perda da biodiversidade. Um bom exemplo é a acácia, também conhecida por mimosa, uma planta muito resistente e de difícil erradicação, pois não basta cortá-la para a destruir. Depois do incêndio de há 10 anos, a ausência de um plano de reflorestação para a Serra da Estrela levou ao aparecimento massivo das acácias, cujo nascimento é potenciado pelo fogo.
Os planos de reflorestação só seriam bem sucedidos se fossem baseados em cartografias florestais, que indicassem com precisão as espécies que ocupavam as áreas ardidas. Mas a única carta que existe não é pública e não cobre todo o País.

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