Empresários e trabalhadores
são unânimes
Livre comércio
não põe fim ao têxtil da Covilhã
POR RICARDO GUEDES PEREIRA*
A liberalização
do comércio mundial do têxtil, marcada para 2005,
não preocupa os agentes ligados ao sector. A concorrência
estrangeira já é agressiva. Industriais e trabalhadores
só lamentam a pouca "vontade política"
do Governo para resolver a situação.
Industriais e trabalhadores partilham
da mesma opinião: a liberalização do comércio
mundial de têxteis e vestuário, prevista para 2005,
não vai ditar o fim da produção de lanifícios
na Covilhã. Afastam este cenário dramático
porque, dizem, o têxtil já sofre, neste momento,
uma concorrência estrangeira muito agressiva.
No entanto, José Alberto Robalo, vice-presidente da Associação
Nacional dos Industriais de Lanifícios (ANIL), e Luís
Garra, presidente da União dos Sindicatos de Castelo Branco
CGTP-IN, acreditam que o sector apenas sobreviverá se
o Governo se empenhar na criação de instrumentos
de apoio ao sector e, ao mesmo tempo, acautelar junto da União
Europeia (UE) as especificidades do têxtil português,
nomeadamente os lanifícios.
"Concorrência desleal"
Apesar de recusarem recorrer
a um discurso "dramático", os dois responsáveis
alertam para a necessidade de serem impostas penalizações
para os países que não cumpram direitos sociais
mínimos. Uma política global que evite "uma
concorrência desleal" que obriga os empresários
portugueses a praticarem preços com margens de lucro cada
vez mais reduzidas. As confecções são, talvez,
o sector mais exposto à liberalização.
"Fala-se agora no desarme alfandegário, mas isso
nos lanifícios pouco nos afecta. Infelizmente, há
muito tempo que não estamos a ser protegidos e quando
alguns artigos têm quotas, estão sempre a ser ultrapassadas",
argumeta o representante dos empresários.
A harmonização do progresso dos direitos sociais,
que abranja o conjunto dos países produtores de têxteis,
é uma medida que sindicatos e empresários reclamam
desde a entrada de Portugal na UE.
Mas outro factor pode pôr em risco a produção
portuguesa: a deslocação de fábricas para
os países do Norte de África. Transferência
de produção que se nota, desde há alguns
anos noutros países da UE, e que recentemente se intensificou
em Portugal. A médio-prazo prevê-se que ela possa
ditar o desemprego para milhares de trabalhadores têxteis
da região.
Governo alvo de críticas
José Robalo e Luís
Garra concluem, assim, que na prática Portugal já
está aberto à importação têxtil.
Por isso, em todo este processo, a actuação que
o Governo liderado por António Guterres tem vindo a adoptar
também é alvo de muitas críticas. O agente
sindical garante que a defesa do Governo dos interesses portugueses
é branda: "Não tem vontade política,
nem força para defender as nossas aspirações".
Não é justo, afirmam, falar em crise do sector
dos lanifícios na Covilhã. No entanto, é
indesmentível que se multiplicam os "problemas pontuais"
em algumas firmas do concelho. É o caso da Moura e Matos
e do CIL-Complexo Industrial de Lanifícios.
Apesar do clima de instabilidade vivido naquelas firmas, José
Robalo e Luís Garra afirmam que se existir vontade política
e forem tomadas medidas de antecipação, a sua situação
pode ser solucionada e as "perspectivas mais sombrias atenuadas".
Propostas credíveis
para Moura e Matos
Sobre o impasse que se vive na
empresa Moura e Matos, que emprega 130 trabalhadores, e cujo
futuro vai ser decidido em Assembleia de Credores a realizar
a 26 de Junho, o vice-presidente da ANIL defende que a viabilização
da empresa apenas pode avançar se, entretanto, surgirem
propostas credíveis. Se tal não ocorrer, então
"não há outra hipótese e tem de ir
para a falência".
A necessidade, com carácter de urgência, de serem
apresentadas propostas "bem sustentadas" também
é apoiada por Luís Garra. O líder da União
dos Sindicatos concorda que qualquer proposta de recuperação
tem de ser suportada por projectos concretos de investimento
tecnológico e planificação de carteira de
encomendas. Uma proposta que a qualquer momento pode ser oficializada
pelo empresário Paulo de Oliveira, que já demonstrou
interesse na aquisição da Moura e Matos.
Falando desta situação específica no sector,
José Robalo considera que "o processo está
a demorar demasiado tempo". Avanços e recuos que,
na sua opinião, abalaram o principal capital da empresa:
a sua posição no mercado.
Em relação ao CIL, o vice-presidente defende que
devem ser perdoadas as dívidas e lhe sejam dados meios
para sobreviver. No entanto, continua, a partir daí deve
ser obrigada a cumprir os seus compromissos fiscais e sociais.
Políticas que apenas podem ser impostas pela administração
central com o objectivo de pôr fim a "empresas que
não têm qualquer razão de existir".
"Isto serve para Portugal apresentar uns quadros de emprego
muito bonitos" e alimentar "distorções
no mercado", finaliza.
*NC / Urbi et Orbi |