Urbi et Orbi - O que considera essencial que os alunos levem das suas aulas?
Considero essencial que levem funcionalidade e pensamento críticos, não acho relevante que aprendam a reproduzir os conteúdos que eu tento transmitir. Quero que os meus alunos aprendam a pensar por si próprios, sem constrangimentos ou preconceitos, pensamentos à esquerda ou à direita. Que pensem no que de facto se está a viver, no caldo político-social em que estamos.
Urbi et Orbi - Sente que os seus alunos têm capacidade crítica para pensar a política?
Claro que não. Os alunos chegam às universidades sem a mínima capacidade crítica, o problema já vem detrás. Os alunos estão habituados a um sistema educativo em que são premiados conforme conseguem reproduzir com maior ou menor fidelidade aquilo que o professor tentou transmitir. Este paradigma não obriga a que os alunos se auto-organizem criticamente e consigam formar opiniões esclarecidas, límpidas.
Urbi et Orbi - Acha que deveria haver uma cadeira de Teoria Política em todos os cursos?
Acho que a educação política devia começar muito antes da universidade, devia ser abrangente a todos os alunos, de todos os cursos. Eles deveriam ter conhecimento dos factos políticos, do que está a acontecer e do que aconteceu, e não das ideologias. E penso o mesmo da religião, sob o ponto de vista laico e científico daquilo que sabemos hoje.
Urbi et Orbi - Fala-se na crise. Como diz o povo, a culpa é dos políticos?
Claro que é, não há dúvidas sobre isso. A culpa é dos políticos porque não souberam jogar com aquilo que têm, não souberam orientar um país que só criticamente consegue resistir aos problemas que o acercam hoje em dia. Investiu-se mal numa série de coisas, na educação, na investigação, nos transportes...e os primeiros culpados disso são os políticos. O que suaviza a culpa deles é o facto de serem filhos deste sistema que apenas lhes ensinou a repetir coisas. É normal que eles andem a repetir erros, sem novas ideias, sem novas soluções, sem nada de novo para dizer.
Urbi et Orbi – Será portanto uma crise de valores?
É mais do que isso. Acho que temos de entrar num novo paradigma de economia. A economia é uma ciência muito alargada que tem que ter em conta factores sociais, psicológicos, entre outros que entram neste jogo da política. Não é só uma crise de valores, é também uma crise de ideias. E não é só em Portugal. O problema das crises económico-financeiras estende-se a nível mundial, veja-se o caso dos Estados Unidos e da Europa. Em 2008 toda a gente disse que o que se estava a passar e a crise que viria eram um problema que resultava do modelo económico segundo o qual ainda vivemos, um modelo assente na ideia de que o crescimento financeiro tem que ser infinito. Isto é uma irrealidade porque os recursos são finitos. Todos disseram que este modelo estava errado mas ele perdura, continuamos a pensar que todas as economias têm que crescer eternamente.
Urbi et Orbi - O que faz falta à classe política portuguesa?
Falta a educação séria e uma coisa que me parece evidente nas democracias contemporâneas, não só a portuguesa, que é o problema da desresponsabilização. Não é chegar à esfera pública e dar uma espécie de solução à Futre e dizer que daqui a dois anos haverá empregos para todos. Os políticos têm que ser punidos pelas contradições entre palavras e actos, tem que haver transparência. É preciso saberem-se os números exactos, os dados económicos e financeiros do país. O paradigma da esperança não serve, há que haver responsabilidade.
Urbi et Orbi - Acha que se houvessem mais mulheres a ocupar lugares de chefia nos governos as coisas seriam diferentes?
Penso que não se trata de uma questão de género, é a tal questão da educação, responsabilidade e transparência. O governo de Berlusconi é constituído por muitas mulheres, todas elas escolhidas a dedo. O homem e a mulher são radicalmente iguais, com diferenças pontuais, e o que interessa à política é o carácter. Os cargos na política deveriam ser desejados por dever e não por benefícios honorários.
Urbi et Orbi - Cavaco Silva descobriu o Facebook e tem utilizado esse meio para fazer algumas declarações. É esse o caminho para chegar à chamada “Geração à rasca”?
Acho que não. O facto de ele ter descoberto o Facebook, assim como a JS, ajuda a que eles prossigam na sua caminhada de evangelização política. Penso que chegam de forma demasiado ténue a essa geração. Porque ela é apática, não entende a realidade política e apenas quer ver os seus problemas resolvidos que é ter um emprego e dinheiro para ir ao Bairro Alto à noite. A geração à rasca tem um problema sério de comunicação e não há propostas sólidas de mudança. Para construir alternativas políticas é preciso organização, teses, dizer que os políticos devem ser criminalizados se faltarem à responsabilidade e levar uma proposta como esta à Assembleia da República. Coisas como esta alterariam todo o panorama político.
Urbi et Orbi - Se tivesse que fazer uma campanha pelo PDJDP (Partido Despertador de Jovens Desinteressados por Política), que diria para ganhar votos?
Não posso negar que tenho ambições políticas, que não são ideológicas nem partidárias ou de poder. Não tenho ambições de poder político. Ambiciono participar activamente na política, acho que é preciso que participemos e nos organizemos para mudar o horizonte negro que temos. Se eu quisesse ganhar votos proporia a responsabilização dos políticos, não pode ser possível que a nossa democracia esteja assente numa espécie de verdade publicitária, sem que se questione o que é verdade.
Urbi et Orbi - Há políticas verdadeiras?
É claro que há. Há políticas boas e más, mas não temos o ambiente mental para criar boas ideias. Os nossos políticos não apresentam os números, não dizem com exactidão o que vão fazer, onde vão diminuir e onde ou o que vão aumentar. A política é ao estilo de Marcelo Rebelo de Sousa, uma política de coscuvilhices, uma política de meninos birrentos que vive de discussões muito superficiais, não vive à conta da discussão de factos. Os factos deviam ser a base das discussões, porque eles existem.