Foram poucas as bandeiras portuguesas visíveis na cerimónia de beatificação de João Paulo II no passado domingo. Era fácil perder de vista a bandeira das quinas numa multidão com perto de um milhão de pessoas que estava presente na praça de São Pedro no Vaticano, números apontados pelas autoridades italianas. As centenas de bandeiras trazidas um pouco de todo o mundo pelos peregrinos, especialmente os da Polónia, país natal de João Paulo II, deixavam pouco espaço para que os outros estandartes se afirmassem. Mas nas ruas de acesso à praça de São Pedro era mais simples reparar na nacionalidade dos imensos apoiantes de Karol Wojtyla que ainda corriam à procura de um lugar, pelo menos perto de um ecrã gigante.
A família Ribeiro exibia com orgulho a bandeira portuguesa que trouxe de Lisboa. Desde quinta-feira que mostrava pelas ruas de Roma o vermelho e verde debaixo da esfera armilar. Amarrada à mochila do membro mais velho do grupo, o pai Henrique contou que “a bandeira representa mais do que o símbolo de Portugal, é também um pouco da sua família e amigos que não puderam vir”, mas todos “pediram para que levasse fotos e vídeos deste momento tão especial”. A procura de um lugar na praça de São Pedro não preocupava os Ribeiro que já sabiam que ia ser impossível arranjar um lugar depois do que tinham visto na noite passada na vigília em honra de João Paulo II nque decorreu Circo Massimo. “Se eu achei a cerimónia de ontem arrepiante pela quantidade de pessoas e pela emoção que se sentia no ar, hoje estou com pele de galinha ao ver isto” desabafa Maria Lurdes, a mãe do clã Ribeiro. “Hoje já nos contentamos com um lugar perto de um ecrã gigante” conclui com um ar de satisfação. Todo o percurso de peregrinação feito desde que chegaram a Roma deixou a família lisboeta cansada, especialmente os mais pequenos. Renato e Bruno Ribeiro são os mais novos do grupo. Os sete anos de Renato ainda não o deixam perceber muito bem o que se está a passar, mas já consegue perceber que está a viver um grande momento. Bruno também está bastante contente por poder participar “num acontecimento que nos próximos anos dificilmente vou ver outra vez, e num dos lugares mais importantes do mundo”.
A passagem pela capital de Itália trouxe-lhes mais que uma forte experiência de devoção: “É impressionante ver tantos monumentos juntos em tão pouco espaço” diz Henrique, que se confessa “surpreendido e maravilhado”, pois apesar de ser um viajante regular, sentiu uma atracção especial pelo ambiente romano. Nos quatro dias que já estiveram em Roma cruzaram-se com outros portugueses: “hoje ainda só vimos duas famílias além da nossa” refere Bruno.
Os minutos foram passando e é tempo de chegarem perto de um dos muitos ecrãs espalhados nas imediações do Vaticano. Afinal, não vão querer perder pitada da cerimónia. Os milhares de peregrinos mantinham-se firmes na praça de São Pedro que acolheu com um forte aplauso o actual papa Bento XVI. O Santo Padre dava entrada no Vaticano rumo ao altar, onde ia proclamar as palavras que todos esperavam ouvir.
Na primeira meia hora de cerimónia de beatificação lembrou-se quem foi João Paulo II e a importância que teve, não só na Igreja como em todo o mundo. Afinal, já há seis anos que o Vaticano não recebia tanta gente – a última vez que tal moldura humana se montou em frente à Basílica de São Pedro foi também em nome de João Paulo II, no seu funeral.
A multidão rebentou em alegria quando, num tom notoriamente tomado pela emoção, Bento XVI anunciou “Giovanni Paolus II è beato”. Alguns aplaudiam, outros usavam as mãos para limpar as lágrimas dos olhos, afinal para muitos, Karol Wojtyla ainda é o Papa do povo.
Se até aqui dificilmente se avistavam bandeiras portuguesas no ar, nos momentos a seguir ao anúncio oficial da beatificação o vermelho e branco polaco dominnou todo o cenário visível.
A presença portuguesa só foi sentida por todos quando o papa Bento XVI saudou na língua de Camões todos os lusófonos presentes na Beatificação. No final de contas, o antigo Papa e agora Beato João Paulo II tinha uma forte ligação com Fátima e com Portugal – sítio de onde se fez no sábado à noite uma transmissão em directo para Roma.
Terminada a cerimónia, era ainda possível fazer uma última despedida a João Paulo II, cujos restos mortais estavam presentes na Basilica de São Pedro.
Agora resta esperar que o Vaticano reconheça um outro milagre a Karol Wojtyla para que este seja canonizada e declarado santo. Até lá, “Não tenhais medo da vida”.*
*citação do Papa João Paulo II no discurso inaugural do seu pontificado