Urbi @ Orbi: Está há pouco mais de um mês na Covilhã. Qual a sua opinião sobre a cidade e o clube, e o que tem a dizer sobre a forma como encontrou a equipa?
Manuel Tulipa: A cidade é agradável e acolhedora, e vive também, no fundo, um bocadinho em função do futebol e do clube que mais a representa, o que é importante. No que diz respeito ao clube, penso que tem boas condições, com boas infra-estruturas para trabalhar e com margem para evoluir. Depois, quanto ao momento da equipa, não era o melhor, visto que se encontrava, e ainda se encontra, numa posição delicada. Mas conhecendo o plantel, entendi aceitar este desafio porque acho que o grupo tem qualidade, apesar de ter alguma juventude.
Importa depois também trabalhar o momento, ou seja, percebermos aquilo que pretendemos, conhecer a capacidade individual de cada jogador e, em função das ideias de jogo, começar a vocacionar a equipa e arranjar fórmulas para que os jogadores rapidamente entendam e assimilem aquilo que se pretende, transmitindo-lhes também algum ânimo e segurança para que encarem os desafios com maior motivação e confiança.
Urbi @ Orbi: O que o levou a aceitar o desafio de orientar o Sporting da Covilhã?
Manuel Tulipa: Quando falamos do Sporting da Covilhã, falamos de um dos clubes históricos do futebol português. E é um clube que, para além de ter história oferece boas condições de trabalho, e tem margem para crescer. Gostei do projecto que me foi proposto, o plantel também me inspirou confiança, e nesse sentido entendi aceitar este desafio.
Urbi @ Orbi: Faltam cinco jornadas para o final do campeonato. Está confiante quanto ao objectivo da manutenção?
Manuel Tulipa: Sim. Nos primeiros jogos que fiz enquanto treinador do Sporting da Covilhã, defrontámos equipas que ocupavam uma posição mais confortável na tabela classificativa, não geriam tanto os factores emocionais como nós geríamos, e daí os resultados menos positivos. Mas os últimos três jogos são bons indicadores daquilo que nós somos capazes de fazer, e agora vamos encontrar equipas que estão próximas de nós na classificação e lutam também pelo nosso objectivo, que é a manutenção. Penso que quem dominar melhor esse conforto, essa estabilidade emocional conseguirá com certeza melhores resultados, e aí só posso estar optimista quanto às hipóteses da minha equipa.
Urbi @ Orbi: Qual a importância, para o Interior, de manter o Sporting da Covilhã nas ligas profissionais?
Manuel Tulipa: Julgo que é muito importante o Interior ter um ou dois clubes de referência nas ligas profissionais, até para descentralizar esses campeonatos das zonas litorais. Neste momento, essa referência acaba por ser apenas o Sporting da Covilhã, e é importante a sua manutenção, não só em termos desportivos mas também para o desenvolvimento da economia e da imagem da própria cidade. E, como referi anteriormente, o clube tem margem de crescimento, e nesse sentido tem de procurar materializar esse potencial para procurar chegar rapidamente à Primeira Divisão, o que permitiria um impacto ainda maior.
Urbi @ Orbi: Tem-se verificado, nas últimas jornadas, um crescente apoio dos adeptos do Sporting da Covilhã à sua equipa. Até que ponto é importante sentir esse apoio?
Manuel Tulipa: Penso que é muito importante, em todas as equipas e em todos os momentos que estas atravessam. Costumo dizer que não são os adeptos que têm de puxar pela equipa, mas sim a equipa que tem de puxar pelos adeptos, e acho que no último fim-de-semana, no jogo com o Belenenses, já se viu mais envolvência por parte do público. Isto porque nós também, nas duas últimas jornadas, fomos capazes de fazer exibições que nos permitem exigir isso da parte dos adeptos.
Urbi @ Orbi: Nos jogos que restam até ao final da época, o Sporting da Covilhã vai receber os dois rivais directos na luta pela manutenção, Varzim e Fátima. Considera que é um factor importante poder defrontar essas equipas em casa?
Manuel Tulipa: Sim, poderá revelar-se importante. Quando cheguei, o factor casa não se revelou como uma mais-valia para a equipa. Mas entendo que nós, treinando e adaptando-nos às condições de espaço do nosso campo, temos de saber gerir isso a nosso favor.
E há, além disso, um outro aspecto importante, que é a massa adepta. Pode ser um factor importante para nós do ponto de vista emocional, e também no que respeita à desestabilização do nosso adversário. Esse contributo dos adeptos pode-nos ajudar a chegar à vitória nesses jogos e a conseguirmos, consequentemente, um conforto em termos de pontos que nos permita encarar as duas últimas jornadas mais à vontade.
Urbi @ Orbi: A Liga Orangina mostra-se mais uma vez, e à semelhança de anos anteriores, bastante competitiva. Na sua opinião, quais são as razões para essa competitividade?
Manuel Tulipa: Julgo que há alguns elementos que são preponderantes para isso. Um deles é o facto de todos os clubes que competem nesta divisão partirem mais ou menos em igualdade em termos orçamentais. Para além disso, o nivelamento é muito grande também por não haver uma transcendência em termos daquele jogador que faz a diferença em relação aos outros. As equipas são muito iguais, o detalhe e a situação de bola parada é determinante, porque se trata de um jogo muito mais físico e intenso do que táctico e preparado em termos de organização, e é também daí que advém a competitividade desta liga e a sua diferença comparativamente ao escalão mais acima.
Tem a ver, de uma certa maneira, com as individualidades; aqui os jogos acabam quase sempre por ser decididos em função de pontualidades como um lance de bola parada, ou um eventual erro. Por isso é que, mesmo que haja uma grande diferença pontual do primeiro para o último classificado, facilmente em jogos entre essas duas equipas se vê que o último pode ganhar ao primeiro, porque há uma tipologia de jogo que assim o permite a essas equipas menos elaboradas e com menos condições no seu plantel resolverem, através do factor físico e da atitude, os seus condicionalismos.
Urbi @ Orbi: Qual a sua reacção perante o caso do jogador Diego Navarro, inactivo há dois anos e que foi recentemente alvo de nova suspensão por controlo anti-doping positivo?
Manuel Tulipa: Reajo com preocupação. Primeiro, porque estamos a falar de um ser humano que está privado de exercer o seu trabalho, de fazer aquilo que mais gosta que é jogar futebol. E depois, preocupação também pelo facto de as pessoas que o julgaram e que lhe impuseram este castigo não perceberem de onde vem esta situação. É um atleta em quem confio muito, e penso que se devia promover a realização de um estudo ao jogador, para se perceber que a substância proibida que ele acusa é produzida pelo seu próprio corpo. E para além de tudo isso, fico triste, porque o jogador tem uma capacidade muitíssimo grande e podia ser uma mais-valia para o nosso clube.
Urbi @ Orbi: Terminou cedo a sua carreira como jogador, para iniciar na época imediatamente a seguir a carreira de treinador. Que motivações o conduziram a essa decisão e transição tão rápida dos relvados para os bancos?
Manuel Tulipa: Houve uma razão muito simples para deixar de ser jogador aos 32 anos: a condição de oferta dos clubes, ou seja, os clubes começaram a debater-se com dificuldades, e a terem também muito incumprimento para com os jogadores. E depois, também, a maior razão de todas, que foi eu conseguir processar a informação no meu sistema nervoso central, mas o corpo já não reagir da mesma forma que fazia anteriormente. E apesar de ser sempre uma situação difícil para o atleta saber quando deve terminar a sua carreira, eu achei que foi o timing acertado para mim. Depois, como tenho um amor muito grande ao futebol, procurei continuar ligado à área. Preparei-me durante algum tempo, fiz os cursos que tinha de fazer, fiz também observação para alguns clubes, o que considero importante para aprender a leitura do que é o jogo, e assimilar as mudanças e dinâmicas estruturais das equipas. E depois apareceu-me a oportunidade de começar a trabalhar, primeiro como treinador adjunto, e depois como treinador principal. E perante essa oportunidade, achei que era a altura certa para iniciar a minha carreira de treinador.
Urbi @ Orbi: Um dos momentos altos da sua carreira de jogador foi a conquista do campeonato mundial de sub 20 em Lisboa, no ano de 1991. Que recordações guarda desse feito?
Manuel Tulipa: As recordações são as melhores. Nós fizemos uma grande equipa porque tínhamos um conjunto de jogadores que se dava muito bem e que se envolvia, não só no trabalho mas também em aspectos extra-trabalho, algo que em muito nos ajudou a conseguir esse objectivo. E além disso tive a oportunidade de trabalhar com uma pessoa que agora acaba por ser algo marginalizada por aquilo que aconteceu no último Campeonato do Mundo. Refiro-me ao professor Carlos Queiroz, que foi uma pessoa que me marcou, porque pensava muitíssimo bem naquilo que tínhamos de fazer, naquilo que queríamos para o jogo, e que sabia pôr o grupo a trabalhar em função disso.
Urbi @ Orbi: Gostaria de continuar como treinador do Sporting da Covilhã para além do final da época?
Manuel Tulipa: Acho que o clube tem margem para crescer, e que a equipa, trabalhada de uma outra forma, poderia não estar a passar por esta situação. O clube dá condições muito boas aos seus profissionais, que poucos clubes nesta divisão dão, e nesse sentido, como gosto daquilo que faço, respondo com um sim à sua pergunta.
Há uma credibilidade muito grande em relação àquilo que é o desenvolvimento do clube, e as pessoas procuram sempre trabalhar em clubes que estejam estáveis e que têm margem para crescer.