Jornal Online da UBI, da Região e do RestoDirectora: Anabela Gradim |
Um Douro com histórias
Cristina Souto · quarta, 1 de setembro de 2010 · Nacional Entre os vales serpenteantes do Douro, as vinhas, os olivais e os pomares, encontramos o concelho de Armamar, um lugar de contrastes, repleto de cor, aromas e vivências. Apesar dos avanços tecnológicos, aqui a vida ainda é muito dedicada à agricultura, as pessoas retiram da terra aquele que é o seu sustento e vivem como podem. |
As magnificas paisagens do Douro |
21962 visitas Com o rosto queimado do sol e as mãos calejadas do trabalho duro na vinha, Ducelina Dias, como tantas outras senhoras do concelho de Armamar, subsiste à custa da agricultura. Aos 73 anos e com uma vida repleta de sacrifício, a agricultora continua a cultivar as suas propriedades mantendo-se ocupada a fazer o que gosta.Ainda é noite quando Ducelina se levanta para ir para os seus terrenos. Os dias de um agricultor começam bem cedo. As mãos trabalham a terra todos os dias de sol a sol. Ducelina enfrenta o calor ou o frio e nada a faz ficar na cama nem mais um bocadinho. Adora ver o dia clarear!Quase todos os dias vai até aquela que é a sua propriedade preferida, a Oleira. Pode até não haver lá nada para fazer mas Ducelina sente um enorme prazer em visitar o terreno que a faz “sobreviver”, como faz questão de o referir. É de lá que retira os maiores lucros, nele passou muitos anos a trabalhar juntamente com o seu marido, que “infelizmente já partiu” refere Ducelina.A vida é complicada para quem o único sustento provém da terra. Quando as colheitas não dão lucro, são tempos complicados, tão complicados que é necessário poupar ainda mais que o habitual. Mas poupar também já é um costume na vida de Ducelina, para a agricultora “grão a grão enche a galinha o papo”, por isso não pode haver descuidos. Como não gosta de desperdícios aproveita tudo o que pode, como por exemplo os restos de comida são para o seu fiel companheiro, o Bobi.Normalmente o seu dia começa com uma caminhada. Apesar dos seus 73 anos, Ducelina não dispensa uma “voltinha” todas as manhãs, admitindo que se não o fizer, não se sente bem durante todo o dia. Na sua caminhada aproveita sempre para passar nas suas propriedades, para ver se “está tudo bem”. No Verão a caminhada serve para regar alguns legumes como as alfaces os tomates, mas também para colher alguma fruta. Ducelina afirma que “a fruta e os legumes, no Verão devem ser colhidos bem cedinho, quando ainda estão frescos”.Foram vários os anos dedicados ao trabalho na agricultura. Ducelina não consegue imaginar o seu dia-a-dia afastada das suas propriedades e afazeres. Durante anos trabalhou com o marido nas várias quintas do Douro. “Eram tempos de muito sacrifício e trabalho, o que se ganhava era para comer. Hoje não é assim, há muita fartura, nada que se compare com o que se vivia”, refere Ducelina.Depois da caminhada é hora de ir até ao quintal e ter a rotina diária. “Há sempre alguma coisa para fazer, umas ervas para arrancar, uma terra para sachar, umas hortaliças ou frutas para colher” esclarece a agricultora. Outra das tarefas a cumprir ainda da parte da manhã é a alimentação dos animais. As galinhas, os pintainhos, os patos, as pombas, os coelhos e os periquitos chamam por Ducelina. É preciso dar ração e água aos vários animais que tem no seu quintal. Quando tem pão seco ou hortaliças já “velhas” aproveita para dar às galinhas, sempre serve para poupar na ração.O ditado diz que quando a lua está na fase de quarto minguante é a melhor fase para semear as batatas. Ducelina cumpre o sugerido e hoje planta no seu quintal cerca de 25kg de batatas de semente. O cheiro fresco a terra mexida pelo arado já se faz sentir no terreno. Para a ajudar a semear as batatas chamou um dos filhos e um senhor amigo que trouxe o seu cavalo para lavrar a terra (vídeo). Depois da terra estar preparada são abertos os regos e Ducelina espalha o adubo e as batatas (vídeo). Todos os anos consegue uma boa produção.Chegada a hora do almoço, Ducelina faz uma pequena pausa para se alimentar e também para descansar um bocadinho. Na sopa não faltam as hortaliças do seu quintal, e para a sobremesa, uma fruta da época. É na velhinha cadeira de baloiço que Ducelina descansa “passando pelas brasas”, como costuma dizer.Como ainda sobraram alguns quilos de batatas para semear, Ducelina põe mãos ao trabalho e continua o que não terminou. Embora o cavalo já esteja cansado, a terra precisa de ser lavrada para acabar de semear as batatas.O dia de trabalho chegou ao fim. Resta-lhe agora esperar cerca de quatro meses para ver o resultado do seu trabalho. Amanhã será um novo dia, mais um dia de trabalho e de alegria a fazer o que tanto gosta. Apesar de se sentir cansada, “porque a idade já não ajuda”, como o costuma dizer, Ducelina sente-se feliz por poder desfrutar do crescimento de tudo quanto planta. Para a agricultora, não há nada melhor que viver rodeada de “paisagens lindas e respirar o ar puro da natureza”.No final do dia ouviu-se o barulho das carrinhas com os trabalhadores das quintas. Para os homens ainda houve tempo para uma passagem pelo café mas, depois das conversas e gargalhadas, regressaram a casa. O sol escondeu-se entre os vales do Douro, as luzes das ruas foram-se acendendo, e as pessoas recolheram-se nas suas casas. O silêncio invadiu o concelho de Armamar mas, amanhã bem cedo as hortas, as quintas e todos os terrenos esperam pelos seus agricultores, Ducelina como é óbvio, não faltará a mais um longo dia de trabalho. |