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"O espírito de camaradagem que se vive na Covilhã é difícil de encontrar numa grande cidade"
Rafael Mangana · quarta, 8 de mar?o de 2017 · @@y8Xxv Responsável por uma investigação que promete revolucionar a cirurgia em torno da disfunção da articulação temporomandibular, um problema que afeta cerca de 30 por cento dos portugueses, David Ângelo é da turma de 2004 de Medicina da UBI. Apesar de trabalhar noutra zona do país, privilegia os amigos de sempre e não esquece a cidade que há 13 anos o acolheu. |
David Ângelo |
22019 visitas Urbi et Orbi: Porquê Medicina e porquê na UBI? David Ângelo: A Medicina surgiu de uma maneira muito natural tendo em consideração que eu sempre fui uma pessoa altruísta e sempre gostei de poder ajudar os outros, de modo que considerando todas as profissões no geral achei que a Medicina seria realmente a área onde eu poderia pôr isso em prática de maneira mais fácil. Quanto à UBI, apesar de não ter sido a minha primeira opção, o método de ensino que na altura era muito inovador, era um curso muito virado para a componente prática, nós começámos a estagiar nos hospitais desde o primeiro ano e nessa altura esse modelo de ensino seduziu-me e foi isso que me levou a ir para a Covilhã.
U@O: Contas feitas, valeu a pena? DA: Valeu muito a pena e não me arrependo nada de ter ido para a Covilhã, onde temos uma vantagem muito grande: todos os meus colegas de curso estavam na mesma situação que eu, ou seja, estávamos todos fora da nossa cidade natal, de modo que éramos todos muito solidários uns com os outros e muito amigos uns dos outros e esse espírito de camaradagem é difícil de encontrar numa grande cidade. Esse será, para mim, o principal ponto forte da Covilhã. Depois, daí surgiram coisas que mantenho ainda hoje, a tuna - eu fui um dos fundadores da Tuna Medica da UBI e ainda hoje mantenho contacto com todos os meus colegas da tuna e continuo, com grande orgulho, a acompanhar a evolução da mesma -, continuo a manter o contacto com grandes amigos que ainda continuo a manter aí na Covilhã, não só na Medicina mas também fora da Medicina, com quem ainda hoje mantenho amizade. E depois a própria relação aluno/professor que era uma relação simples e que ainda hoje se mantém mesmo após terminar o curso, continuo a manter contacto com vários professores da faculdade, o que é uma mais valia.
U@O: Desde que terminou o curso, o que tem feito a nível profissional? DA: A nível clínico fiz o internato no Hospital de Santa Maria, em Estomatologia, acabei o internato com a melhor nota a nível nacional – 19,6 -, fui o melhor interno do meu ano a terminar o internato, o que é bastante favorável. Estive sete meses em Espanha num serviço dedicado à área das disfunções da articulação temporomandibular e cirurgia ortognática. Entretanto vim trabalhar para o Hospital de Setúbal, onde sou atualmente Assistente Hospitalar no Serviço de Estomatologia. Trabalho também em algumas clínicas privadas sempre na área do orofacial e disfunção da articulação temporomandibular. A nível científico, tenho publicado alguns artigos em diversas áreas, mas sem dúvida a área onde eu estou mais focado é na área de regeneração de tecidos e neste momento também sou Investigador Convidado do Instituto Politécnico de Leiria, na área de Bioengenharia de Materiais.
U@O: Paralelamente, tem um projeto com um outro ex-aluno de Medicina da UBI. Como é que está a correr? DA: Esse é outro lado, como um dos hobbies, que é a Blocomed. A Blocomed tem estado num crescimento considerável, consideramos bom, tem conseguido acompanhar todos os planos que tínhamos traçado, conseguimos cumprir isso tudo, neste momento estamos a fazer um grande esforço para tentar internacionalizar a Blocomed, já estamos a vender para a Espanha e para a Inglaterra e agora recentemente conseguimos colocar o produto também nos Estados Unidos e o feedback tem sido muito bom, de modo que o nosso objetivo final seria que todos os estudantes da área da saúde do mundo tivessem um kit de sutura da Blocomed para aprender e para treinar as suas suturas. Eu sinto que a área da simulação cirúrgica é uma área que ainda tem muito potencial. Agora, infelizmente, estou tão focado no meu projeto de Doutoramento que não conseguirei dar um contributo tão grande quanto gostaria à Blocomed.
U@O: Também está a tirar o Doutoramento neste momento? DA: Exatamente. Estou a fazer o Doutoramento na Faculdade de Medicina de Lisboa, estou a acabar, estou no terceiro ano. Este projeto das ovelhas e da regeneração do disco é o meu projeto de Doutoramento. Foi em 2012 que me comecei a interessar pelos doentes com disfunção da articulação temporomandibular e percebi que nos casos graves não existem soluções adequadas para restabelecer a função da articulação. Essa lacuna na área do tratamento motivou-me a tentar descobrir algo de novo na área da ciência e da investigação / saúde. Foi aí que coloquei a hipótese de recuperar o disco da articulação temporomandibular. O primeiro paciente tinha 15 anos e apenas conseguia abrir a boca cerca de dois milímetros, mas passados quatro ou cinco meses da cirurgia voltou à estaca zero e foi aí que fiquei mesmo com a consciência que era necessário fazer algo de novo nesta área. Foi a partir daqui que começou a base para este projeto de investigação (TEMPOJIMS). Depois de operarmos nove ovelhas no final do passado mês de janeiro, esperamos que daqui a cerca de cinco meses, quando abrirmos a articulação, já não haja material nenhum. Vai haver então um disco que, esperamos, seja com o mesmo tipo de células do disco nativo. Em 2018 espero conseguir operar doentes humanos.
U@O: Se pudesse dirigir-se diretamente a um aluno de Medicina da UBI para vingar na área, o que lhe diria? DA: Sobretudo, para vingar, devemos ser humildes. Temos que ser humildes e temos de ser muito persistentes. Ou seja, eu dou como exemplo um dos artigos que eu publiquei que foi rejeitado em nove revistas. E eu nunca desisti. Se calhar a maioria das pessoas à nona tentativa desistia e eu nunca desisti e acabei por publicar numa revista melhor do que aquelas nove onde tinha tentado previamente. Ou seja, humildade e persistência são duas características que nos podem levar realmente a alcançar depois grandes coisas no futuro. Por outro lado, hoje em dia há estudos científicos que mostram que quem faz investigação é melhor clínico. Nesse sentido, o segundo conselho que eu daria – isto mais para as pessoas que estão na área da saúde – é que tentem sempre fazer investigação associada à clínica e isto vai fazer de vocês melhores profissionais de saúde, sempre, isto é essencial. Por último, tentar sempre, como dizia a minha avó, "não deixar crescer erva à porta de casa dos amigos". Ou seja, às vezes focamo-nos muito no trabalho, abdicamos de relações pessoais, amigos, esquecemos um bocado esse aspeto, mas é muito importante manter as amizades com os nosso amigos, fazer esse esforço às vezes de ligar àqueles amigos que já não ligamos há seis meses ou há um ano, tentar ter sempre essa consideração e nunca nos esquecermos dos nossos amigos. Cultivarmos as nossas amizades faz-nos bem e é essencial para estarmos bem emocionalmente e para conseguirmos depois alcançar o sucesso.
Perfil: Nome: David Ângelo Naturalidade: Nasceu na Suíça, tendo-se mudado aos seis anos para Porto de Mós Curso: Medicina Ano de entrada na UBI: 2004 Filme preferido: “Game of Thrones” Livro Preferido: “Egas Moniz, uma biografia”, de João Lobo Antunes Hobbies: Tauromaquia; Escultura; Surfar; Gastronomia |
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