Jornal Online da UBI, da Região e do RestoDirectora: Anabela Gradim |
Insólito, espanta e não se explica
Oana Gabriela Pauca · quarta, 2 de mar?o de 2016 · @@y8Xxv "O Insólito: Novas Perspetivas e Figurações" é o nome do evento que decorreu ontem, terça- feira 1 de março, na Faculdade de Artes e Letras da UBI. Na concretização deste evento participou um perito na relação do insólito com o ficcional, o professor Flavio García, vindo da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). |
Eduardo Camilo, Cristina Vieira e Flavio García durante o workshop |
21991 visitas O workshop decorreu no Auditório da Biblioteca Central da UBI e teve início às 10h da manhã de ontem. Este evento foi organizado por Cristina Vieira, professora do Departamento de Letras da UBI e contou com a participação do professor Flavio García, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, e do professor Eduardo Camilo, da UBI, sendo que a abertura ficou a cargo do presidente da Faculdade de Artes e Letras, Paulo Serra. Especialista no estudo do insólito na literatura, o professor e co-diretor do Laboratório Multidisciplinar de Semiótica (LABSEM) da UERJ, Flavio García veio prestar à UBI os seus conhecimentos na área, começando por relacionar o insólito à incoerência e à incongruência. No âmbito da narrativa ficcional, "o insólito pertence ao fantástico, é uma categoria deste último" e realça que "o fantástico, para existir, tem de fazer parte da narrativa e não ter explicação: se tiver explicação, passa a pertencer ao estranho" explica o docente brasileiro. Sobre a sua perspetiva literária do insólito, Flavio García salienta que o termo em questão serve como referência a "acontecimentos que provocam espanto e que têm demasiadas explicações, tantas que é impossível o leitor escolher uma só sem ficar na dúvida se outra qualquer não seria mais adequada". No fundo, o insólito diz respeito ao mágico, ao sobrenatural, ao inexplicável, e "existe em qualquer narrativa que não seja real, produzindo outra realidade, sendo essa a ficção". No entanto, há que frisar que, na perspetiva do professor Flavio García, o insólito "depende de um processo histórico que tem mudanças determinadas por tempo e espaço" e tem por base o adicionar, na narrativa, de "pelo menos um elemento incoerente com as expetativas do padrão do sistema semi-narrativo realista". O interesse pelo insólito no mundo da literatura surgiu das obras de um grande escritor galego, Xosé Luis Mendez Ferrín, conta o professor. As obras do autor galego suscitaram-lhe uma paixão pelo mágico, pelo fantástico, pelo misterioso. Continuou a investigar a ficção literária, utilizando nos seus estudos trabalhos do escritor português, Mário de Carvalho, "cujas obras se parecem muito com as de Xosé Ferrín", afirma Flavio García. Uma perspetiva completamente diferente do insólito foi apresentada pelo docente da casa, o professor Eduardo Camilo, que dedicou o seu estudo ao pasmo como processo de afirmação do sujeito perante o insólito. Na sua abordagem, Eduardo Camilo estuda o objeto estranho em três dimensões: a do objeto insólito, a do objeto artístico e a do objeto do conhecimento ou do pensamento científico-filosófico, relacionando-os com a experiência subjetiva do pasmo enquanto afirmação do sujeito. Na dimensão insólita do objeto, o docente da UBI explica que "o pasmo do sujeito depende da sua subjetividade e da forma como este se relaciona com o objeto insólito no processo cognitivo". Neste parâmetro, "o objeto não se dá a conhecer e o que está em jogo não é o seu ser, mas sim o seu parecer", esclarece Eduardo Camilo, dando conta de que nos media, o insólito é trabalhado como fait-divers. Sumariamente, para o docente ubiano, o insólito diz respeito "àquilo que espanta e não tem explicação, ao acontecimento que não ganha sentido" e a perplexidade do sujeito depende da forma como o "objeto insólito se manifesta ao sujeito". A estranheza na dimensão artística surge, segundo a perspectiva de Eduardo Camilo, como "algo que se encontra adjacente à experiência estética" e neste âmbito, aquando do processo cognitivo, "o objeto artístico admite um sujeito competente, um sujeito que intervenha no próprio objeto, um sujeito performativo", ao contrário do que acontece no processo cognitivo no âmbito do objeto insólito, onde o sujeito é incompetente. Já no âmbito do objeto do conhecimento, Eduardo Camilo explica que "o próprio sujeito procura o estranho através da dúvida", sendo que este processo se revela essencial no âmbito das ciências. "Nesta dimensão, o objeto deixa de ser estranho e passa a ser estranhado, provocando espanto", elucida o docente, dando também conta de que no respeitante ao objeto do conhecimento, o processo cognitivo depende da forma como o sujeito vê o objeto. Os dois professores, Flavio García e Eduardo Camilo, têm uma visão comum sobre o insólito enquanto termo geral – ambos vêem o insólito como algo que não pode ser explicado – mas estudam-no em terrenos diferentes. "Este evento resulta da relação de afinidade que existe entre o LABCOM e o LABSEM, que celebraram protocolos neste âmbito, e desta vez aproveitámos o facto de o professor Flavio se encontrar em Portugal", conta Cristina Vieira, organizadora do workshop, tendo este acontecimento o intuito de"“beneficiar os alunos de várias áreas, uma vez que é um assunto bastante abrangente, dando-lhes oportunidade de aprender algo novo". A organizadora também explica que o espaço de debate foi bastante intenso, considerando isso um elemento importante, justificando que "isto é que é um workshop, não sendo só uma palestra onde no final fica aquele silêncio constrangedor". No final da sessão de esclarecimento de dúvidas, o professor Flavio García ofereceu alguns livros às pessoas da plateia, alguns exemplares de obras de Mia Couto, escritor moçambicano, e outros exemplares da sua própria obra, "Vertentes teóricas e ficcionais do Insólito". |
Palavras-chave/Tags:
Artigos relacionados:
GeoURBI:
|