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Idosos sozinhos contam dias de solidão
Alcina Gomes · quarta, 13 de mar?o de 2013 · Há décadas que o interior do país, envelhecido, sofre acentuadas perdas de população. Muitos idosos que vivem isolados em zonas rurais são alvos fáceis para criminosos, mas contam sobretudo dias de solidão. |
Durante muitos dias a lareira é a única companhia da dona Lurdes |
21987 visitas "Há semanas que não me cruzo com ninguém". O desabafo é Lurdes Lourenço, 65 anos. Esta idosa natural do concelho da Guarda viveu sempre na quinta que, na família, foi passando de geração em geração. Há cerca de vinte anos ficou viúva, viu a filha sair de casa e assistiu ao abandono da terra. Não tem vizinhos. Ficou sozinha e isolada num monte com parcos acessos. Um retrato que vai sendo comum em muitas zonas do interior do país, marcado pelo despovoamento e envelhecimento populacional. Cecília de Fátima, 29 anos, fotógrafa natural do Porto, trabalha em Barcelona e está a desenvolver o projeto 'Sós e Isolados' que retrata a realidade de pessoas com mais de 65 anos que vivem naquelas condições, em zonas do interior. O ponto de partida foi o distrito da Guarda, mas quer estender a ação ao resto do país e, sobretudo, a distritos como o de Castelo Branco, Portalegre e Viseu. Na primeira fase do projeto, desenvolvido entre outubro e novembro do ano passado, fotografou oito pessoas: três mulheres que vivem sozinhas, um casal e uma viúva que habitam numa aldeia e um casal que mora isolado. "Vivem em casas sem eletricidade e sem água canalizada e sobretudo vivem na solidão", constata. Com fortes preocupações sociais, aquela profissional quer desta forma "sensibilizar a população sobre a realidade do quotidiano de pessoas idosas que vivem sós ou isoladas em zonas desertificadas de Portugal". Resultado da primeira etapa do trabalho que idealizou, a fotógrafa tornou pública uma exposição patente até ao dia 24 deste mês, no Teatro Municipal da Guarda. Ali retrata um casal com idade média de 75 anos que vive numa casa sem luz elétrica, sem água canalizada e sem casa de banho. Vive numa quinta próxima de uma aldeia do concelho de Seia, acessível apenas a pé após cinco quilómetros pelo interior de um bosque. As pessoas retratadas na exposição são apenas identificadas pela letra inicial do nome. Cecília de Fátima quer assegurar a proteção de dados que as possam identificar e localizar. Voltemos à dona Lurdes, cujo nome da quinta onde mora também não fornecemos pelo mesmo motivo. Habituada ao silêncio dos dias, mata o tempo entre a lareira e a horta. Os cães e as galinhas são a sua principal companhia. Diz não ter receio de morar sozinha: "Desde que me lembro que aqui moro e nunca tive medo". Mas a verdade é que só no último ano apanhou dois valentes sustos que a deixaram de pernas a tremer. Por duas vezes tentaram assalta-la. "No Verão apareceram aqui três gandulos, um com a cara tapada. Queriam roubar as ferramentas que ainda aqui tenho. Gritei-lhes, devem-se ter assustado e foram-se embora. Há dias apareceu cá outro a bater-me às portas, ameaçava que partia os vidros todos se não o deixasse entrar. Não me mexi, fingi que não estava em casa. Se ele entrasse tenho a certeza que me matava, mas acabou por se ir embora“. A dona Lurdes encontra-se sinalizada pela GNR que mantém no terreno equipas de contacto com idosos que vivem sozinhos em lugares isolados. Ao mesmo tempo que se esvaziam aldeias e lugares, há muitos idosos que ficam sós. Para a dona Lurdes também os dias são vazios de conversa. A solidão só é interrompida quando a filha e o neto a visitam. |
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