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AÇORES: tradição vezes nove
Catarina Furtado · quinta, 27 de dezembro de 2012 · Continuado Nos Açores há uma tradição para tudo, desde o bolo de Natal aos adornos que decoram as árvores, portas e janelas. |
Árvore e bolo de Natal. |
21981 visitas Constituído por nove ilhas, não admira que as tradições de Natal no arquipélago dos Açores variem de ilha para ilha, refletindo os costumes e as memórias de cada povo açoriano. Apesar disso há muitos aspetos em comum. Os preparativos para o Natal começam logo no início do mês de dezembro. Para os açorianos, a ceia de Natal e o presépio são das tradições mais importantes. Este último, para além de representar o nascimento de Jesus, também reproduz cenas do quotidiano das ilhas. Na sua construção utiliza-se musgo fresco para os montes e musgo seco para a cobertura dos telhados das casas, as ruas e pequenas estradas são feitas em bagaço ou bagacina e as figuras são de barro. Na ilha de Santa Maria costumam-se colocar pratinhos de trigo grelado, também conhecidos por relvões, à volta do Menino. Na Graciosa colocam-se, sobre uma mesa forrada de tecido branco, degraus e a imagem do Menino Jesus no cimo destes, decorando-os com flores naturais. Em São Jorge, o dia da Consoada era importante para as raparigas. Ao contrário dos restantes dias do ano, tinham liberdade para sair à noite, mas só até à hora da missa. Maria Duarte, professora de 57 anos, recorda a crença popular: “nessa noite nada de mau nos podia acontecer, enquanto que nos outros dias não podíamos sair de casa depois das Trindades, mais ou menos a partir das seis da tarde. Há um ditado que diz ‘Trindades batidas, meninas recolhidas’”. A árvore de Natal também se tornou um elemento natalício imprescindível. Costumava ser um pinheiro natural e apanhado de fresco, mas nos dias que correm aparecem cada vez mais as árvores artificiais. “As bolas coloridas e as luzes natalícias substituíram os adornos feitos de fios coloridos e papéis de rebuçados com os quais também enfeitávamos as portas e janelas”, disse a professora. As tradições começaram com a chamada Festa da Família e da Saudade, um costume que tinha início no dia 24 de dezembro e acabava no dia de Reis. Na noite de Natal, as famílias visitavam-se umas às outras e iam juntas à Missa do Galo. Era apresentado um galo na igreja para ser oferecido aos pobres para que assim pudessem ter um bom almoço de Natal. Depois da missa comiam o típico caldo de couves, peixe e pão com queijo. Para o dia seguinte à Consoada estava reservada uma refeição mais luxuosa. Na mesa estaria caldo de galinha com arroz e feijão, galinha cozida, figo, nozes e vinho a acompanhar. Manuel Alberto, de 73 anos, afirma que algumas destas tradições ainda se mantêm e cada família deixou a sua receita para confeção dos mais diversos licores, principalmente de anis, maracujá ou de leite, também conhecidos pelo nome de “mijinha do menino Jesus”. Era também nesta altura que se realizava matança do porco existindo, a partir desta prática, a tradição dos enchidos na mesa de Natal. Na ilha das Flores, para além da galinha assada e recheada com debulho, servem-se também inhames com linguiça, um prato que também é típico na ilha do Pico. Em São Jorge, o inhame acompanha os torresmos de molho de fígado, tradicionalmente servidos no dia de Natal. A molha de carne, que, segundo Aurora Santos de 45 anos, é um prato mais típico nas ilhas do Pico e Faial, é confecionado à base de carne de porco que, depois de devidamente temperada, é frita em banha num tacho que barro. Muitas das sobremesas, acrescentos à mesa de Natal dos açorianos, foram trazidas por emigrantes do Canadá ou Estados Unidos. Mas há também uma forte presença da doçaria portuguesa como os doces conventuais, o toucinho do céu, os queijinhos de amêndoa ou até mesmo o bolo de Natal. Se não falha a memória à cozinheira Maria Amélia, “o bolo de Natal deve ser confecionado oito dias antes de ser servido na noite da Consoada.” Na ilha das Flores fazem-se o arroz doce e o bolo de frutas, em Santa Maria a massa sovada e os biscoitos de orelha e de aguardente, enquanto que em São Jorge confecionam-se os suspiros, as rosquilhas e servem-se figos passados. |