Urbi@Orbi – O período de acesso à universidade, para novos alunos, irá arrancar em breve. Como está a ser preparado todo esse processo?
Paulo Serra – Nestes períodos tentamos dar resposta às questões que nos chegam pelos candidatos, que passam pela apresentação das instalações que penso estarem adequadas e em termos de corpo docente, que está perfeitamente preparado.
A principal novidade para este ano passa pela realização de uma abertura solene do ano letivo que vai decorrer na própria faculdade e para a qual vamos mobilizar os alunos e os professores apresentando aos alunos do primeiro ano, os docentes, os diretores, os colegas de curso, ajudando assim à sua integração na faculdade.
U@O – Existem novas regras na distribuição de vagas e em algumas provas de ingresso. Na oferta formativa desta faculdade, quais as principais mudanças que se podem vir a sentir?
P.S. – Seguindo as regras definidas pela universidade, as vagas nos diferentes cursos vão ficar as mesmas. A grande alteração foi ao nível da exigência da taxa de empregabilidade que se aplica nos casos em que se queiram aumentar as vagas ou criar novos cursos, o que não se verificou na faculdade. As regras este ano são as mesmas que nos anos anteriores. Este ano, os alunos podem aceder aos cursos da faculdade, com a prova de filosofia, algo que não se verificava há vários anos e é mais uma forma de acesso aos nossos cursos.
U@O – Uma das áreas que mais importância tem assumido no seio da academia é a da investigação. Que principais iniciativas destaca na sua faculdade?
P.S. – Neste momento, em termos de investigação a nível nacional estamos num ponto de transição. Há muita incerteza sobre o futuro das unidades de investigação, isso está em discussão na comunidade académica, uma discussão que foi lançada pelo próprio presidente da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), professor Miguel Seabra.
Em termos concretos, no caso da faculdade, com o Laboratório de Comunicação e Conteúdos On-Line (LabCom) e o Instituto de Filosofia Prática (IFP), temos vários projetos em andamento. No caso do LabCom temos cerca de meio milhão de euros aplicados em projetos que decorrem em várias áreas. Candidatámo-nos a mais meia dúzia de iniciativas que esperamos ver aprovadas. Por parte do IFP existem também algumas candidaturas a novos projetos. Diria que o esforço que está a ser feito por estas duas unidades, que têm classificação de muito bom, tenderia, se as condições das unidades de investigação se mantivessem, a levá-las a uma avaliação de excelente. Como as condições estão em mudança, é provável que já nem exista a avaliação dos centros, como propõe a FCT.
U@O – Mas a Faculdade de Artes e Letras está entre as melhores no País, na sua área.
P.S. – Em termos de classificação, quer a faculdade, quer os centros de investigação, estão entre os melhores. A expectativa era atingir o excelente.
U@O – Isto é uma forma de mostrar a qualidade da formação aqui ministrada?
P.S. – Sim, sobretudo no que diz respeito às pós graduações, a nível do doutoramento é muito importante a investigação. Temos procurado ao longo destes anos orientar os nossos doutoramentos para as linhas de investigação desenvolvidas no LabCom e no IFP. Temos recebido muitos alunos deste nível devido ao nosso trabalho científico.
U@O – Passado algum tempo após as alterações introduzidas nos cursos pelo Processo de Bolonha, qual a sua opinião sobre este tema, e mais especificamente, sobre os cursos da sua faculdade?
P.S. – Acontecimentos da realidade portuguesa imediata levam-nos, hoje em dia, a olhar para o Processo de Bolonha de uma forma mais crítica do que aquela que se olhou na altura. Mas recordo que aquando da implementação destas medidas a Universidade portuguesa foi bastante crítica em relação ao Processo de Bolonha, nomeadamente devido ao facto de vir aligeirar os cursos superiores e facilitar, através de regras que hoje vemos que são demasiado permeáveis, o acesso ao ensino superior.
Sou partidário que o acesso ao superior seja democrático, isto é, todos os cidadãos portugueses, independentemente da raça, da região, do rendimento económico, devem ter possibilidade de frequentar o ensino superior, mas tal deveria ser uma tarefa exigente para preparar devidamente os alunos. O problema é que em Portugal trabalhamos muitas vezes para as estatísticas e para apresentar bons resultados a nível da Europa. Não nos adianta muito dizer que temos 20 jovens licenciados quando, de facto, as licenciaturas não têm o rigor e a exigência que deviam.
U@O – Trabalhar mais para a quantidade do que para a qualidade...
P.S. – Isso teve a ver logo com a diminuição do número de anos de uma licenciatura, uma acreditação de competências que não têm diretamente a ver com conhecimentos especializados e portanto houve um aligeiramento. O que se observa, na realidade, é que ao criar uma licenciatura de três anos e um mestrado de dois, este último acaba por ser uma qualificação da licenciatura, com a agravante de ao permitir que os alunos que saiam com a licenciatura estejam menos preparados do que anteriormente.
U@O – Alteraram-se as licenciaturas e alargou-se o número de cursos de pós-graduação. A oferta formativa está agora mais ajustada às necessidades do País, ou pensa que deveria sofrer algumas melhorias?
P.S. – Aquilo que aconteceu é que a certa altura, pese embora o respeito que tenho por estas entidades, qualquer presidente de câmara, quiçá qualquer presidente de junta de freguesia gostaria que na sua cidade ou na sua aldeia existisse uma instituição de ensino superior.
Neste momento há uma desproporção muito acentuada daquilo que é a oferta de cursos e o que é a procura. O que acontece é que nos últimos anos a oferta de cursos subiu substancialmente e a procura, ou estabilizou ou começou a diminuir. Há um ajustamento que tem de ser feito e tem-se discutido nos últimos anos qual é esse tipo de ajustamento que pode passar pela junção entre as universidades, ou universidades e politécnicos que partilhem o mesmo espaço tentando eliminar aquilo que se pode chamar de redundâncias. Não faz sentido que haja em duas instituições separadas por 30 ou 40 quilómetros dois cursos exatamente iguais a concorrer para um universo cada vez mais reduzido.
U@O – Com o desemprego jovem a aumentar a atenção colocada nas taxas de empregabilidade das universidades tem sido cada vez maior. O que têm feito para dar a conhecer a faculdade neste domínio?
P.S. – Normalmente os fenómenos sociais têm múltiplas e complexas razões. Suponho que em Portugal é a estrutura económica e empresarial, constituída por pequenas e médias empresas, e em que não se aposta em, mão de obra qualificada, que tem contribuído para este cenário. Parece que o modelo que seguimos não é o dos países superdesenvolvidos como os Estados Unidos da América ou a Alemanha, em que se procura produzir de forma altamente qualificada e com mão de obra especializada, o nosso modelo parece ser mais o modelo da Malásia, da Índia, ou da China em que se aposta em produção com mão-de-obra barata e pouco qualificada. Enquanto não houver essa alteração é muito difícil eliminarmos esse desemprego qualificado. Uma das vias que temos implementado e tem vindo a crescer é a do empreendedorismo.
U@O – Ainda assim, a faculdade tem visto os seus alunos a encontrarem emprego?
P.S. – Ao contrário de outras faculdades onde se trabalha com uma banda muito estreita, isto é, produzem-se estudantes muito especializados, as áreas de formação aqui da faculdade são de âmbito mais genérico. Por exemplo, o curso de Ciências da Comunicação tem um leque de saídas mais abrangente relativamente a outros cursos. Isso permite que, apesar de também existir um excesso de oferta, em termos nacionais, os nossos alunos conseguem uma boa taxa de empregabilidade.
Há a realçar o aparecimento de casos de empreendedorismo que saíram da nossa faculdade. Exemplo de três casos conhecidos como são: “Ovelha Elétrica”, na área da produção de conteúdos; “Gula”, no design e relações públicas, e o jornal “Forúm Covilhã”, criado por dois alunos de mestrado. São alguns aspetos que mostram a mudança de mentalidade de quem acaba por criar o seu próprio emprego.
U@O – As ligações ao exterior, nomeadamente a empresas e entidades empregadoras é outro dos vetores chave apontados pelos académicos para o sucesso das universidades. De que forma tem desenvolvido esse tipo de relação?
P.S. – Há uma relação muito diversa com várias entidades. A faculdade e a UBI têm promovido também essa política de relacionamento com o meio envolvente. Uma outra via de relacionamento é a existência de estágios dos nossos alunos em empresas onde alguns acabam por ficar. E uma outra via que começa a surgir é a existência de doutoramentos entre empresas e a faculdade. Os protocolos que existem entre a faculdade e diversas instituições contribuem para mais uma forma de relação. No ano passado, neste âmbito, fizemos vários trabalhos em parcerias com a RTP e outras empresas mais regionais.
U@O – Os cortes em verbas que suportam o funcionamento das universidades são transversais. Salários, investigação, ação social, são apenas alguns exemplos desse decréscimo. Como tem isso afectado o normal funcionamento da faculdade?
P.S. – A universidade portuguesa tem vindo a atravessar várias dificuldades. Com o número de bolsas a diminuir há um maior abandono das academias. Se pensarmos numa família que apresenta dificuldades em pagar as contas dos bens essenciais como água, luz e eletricidade, muito mais dificuldade vai ter em pagar os estudos dos seus membros, e acabam por desistir.
No que se refere especificamente à nossa faculdade, não notamos nenhum sinal de abandono ou desistência. Aquilo que acontece é uma redução no orçamento da faculdade, nos últimos dois anos este decresceu cerca de 50 por cento. Verbas que poderiam ser aplicadas na aquisição de equipamento, na renovação de instrumentos de trabalho e outros, não estão disponíveis. Teremos que rentabilizar melhor o que já existe e alocar verbas ao normal funcionamento. Há um menor gasto de verbas em investimento e um reforço de verbas através de protocolos com entidades externas.