Urbi@Orbi - Quando nasceu a sua paixão pela escrita?
Manuel Jorge Marmelo - Algures durante a adolescência. Provavelmente até enquanto lia livros do Tio Patinhas e coisas assim do género. Não sei situar exactamente, sei que a determinada altura, a leitura primeiro e a escrita depois passaram a ocupar uma parte importante da minha vida.
U@O - Onde se inspirou para escrever o seu primeiro livro?
MJM- O meu primeiro livro é uma coisa que se chama “O Homem que Julgou Morrer de Amor” e é uma história ficcionada a partir de personagens históricos, Sócrates, Platão, Trasímaco. E por isso sei exactamente em que é que me inspirei. Na altura estava no curso de Filosofia, já era jornalista do Público e resolvi ir fazer o curso de Filosofia em regime nocturno. Estava a estudar Filosofia Clássica e pareceu-me que na biografia daquelas pessoas havia espaço suficiente para meter lá ficção no meio e, de algum modo coser os espaços em branco que havia na biografia oficial desses filósofos.
U@O - O seu segundo livro: Portugués, guapo y matador foi adaptado ao teatro. Alguma vez teve intenção de ser dramaturgo?
MJM- Não, nunca tive. Nem ser dramaturgo nem escrever livros infantis, que foi uma coisa que acabou por me acontecer também. Em relação ao teatro foi uma coisa que aconteceu, porque na altura estava casado com uma pessoa ligada ao teatro, as pessoas que trabalhavam com ela acharam que aquele livro tinha potencial para ser passado ao teatro e foi uma coisa que me agradou fazer, apesar do aspeto mais duro daquilo que é retirar ao livro tudo aquilo que não é essencial na trama principal. Como fui eu que fiz a adaptação, em algum momento acabou por ser doloroso estar a atirar fora partes do livro. Curiosamente, há pouco tempo atrás, a mesmo companhia de teatro convidou-me para fazer uma peça só para teatro e foi uma coisa que me deu algum gozo fazer.
U@O - Está a preparar um novo livro?
MJM- Neste momento sim, mas já estou há muito a dar voltas àquilo e não é uma coisa que tenha um rumo ainda muito definido. Mas sim, estou a trabalhar num romance novo, que é uma espécie de visão romanceada da história do meu trisavô, que tinha fama de ser muito mulherengo.
U@O - Que autores mais o influenciaram?
MJM- Não consigo situar influência assim com tanta precisão. Posso dizer quais são os autores que eu gosto muito de ler, mas não consigo dizer em que medida é que eles me influenciaram. Gosto muito de Saramago, do Gabriel García Marquez, Rubem Fonseca, Montalbán, Artur Perez Reverte, Julio Cortázar, e podia continuar a dizer nomes e ia estar sempre a esquecer-me de algum. São autores que eu gosto muito de ler e são autores muito diferentes entre eles. O Saramago ou García Marquez não têm nada a ver com o Cortázar. São visões da literatura completamente diferentes. Em que medida é que eles me influenciaram? Não sei. Sei que o facto de os ter lido me abriu provavelmente perspetivas para aquilo que eu quero fazer atualmente.
U@O - De todos os livros que já escreveu, qual foi o que mais o marcou e porquê?
MJM- Isso é muito difícil de responder. O primeiro pelos motivos óbvios, é quase como um primeiro filho. O último porque é o que está mais próximo e é como o filho mais novo, aquele a quem queremos dar mais atenção. Não consigo destacar um que me tenha marcado mais.
U@O - Para além da escrita, tem outras paixões?
MJM- Sim, algumas. Gosto muito de fotografar, de passar tempo com os meus filhos, gosto de cozinhar, de passear a pé, por aí. Coisas assim simples.
U@O - O que mais o fascina na literatura?
MJM- A possibilidade de criar mundos alternativos. Ser uma espécie de pequeno deus, que com meia dúzia de letras consegue criar um mundo novo, alternativo, diferente daquele em que vivemos. Eu creio que nos meus primeiros livros, escrevi mesmo para poder viver, através dos livros, uma vida que eu não poderia viver na realidade. Pude ser um filósofo grego no primeiro livro, um assassino a soldo no segundo, pude ser um dançarino de tango no terceiro. A literatura tem essa vantagem, de não só como escritor mas também como leitor, de nos transportar para realidades e para sítios onde normalmente não podemos ir.
U@O - Considera-se uma pessoa romântica?
MJM- Sim. Um parvo continuamente apaixonado, para citar o título de um dos meus livros.
U@O - Prefere escrever livros ou escrever notícias?
MJM- Livros. Se a pergunta fosse livros ou crónicas, podia até hesitar. Mas entre livros e notícias, prefiro livros.
U@O - Como define a sua carreira até ao momento?
MJM- A carreira que me paga as despesas e que me permite viver pagando as minhas contas é o jornalismo. Embora no jornalismo a minha carreira esteja mais ou menos estagnada. É uma coisa que neste momento já não é um grande desafio. Como estagnou, aquilo que eu faço todos os dias é quase uma repetição do dia anterior, portanto é pouco interessante. Como escritor, ainda consigo encontrar essa componente de desafio em cada texto novo que começo a escrever. E aí, espero que cada livro novo seja ainda melhor que o anterior. Com as notícias, isso começa a ser um bocadinho difícil ao fim de 22 anos.