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> <strong>Gisela Gonçalves</strong><br />

O novo Código de Conduta para os profissionais de relações públicas

> Gisela Gonçalves

A Associação Portuguesa de Comunicação de Empresa (APCE) apresentou, no passado dia 26 de Novembro, a sua proposta de Código de Conduta do Gestor de Comunicação Organizacional e Relações Públicas. Este Código, disponível no site apce.pt, está em discussão pública junto da comunidade profissional e académica até Março. O mérito desta proposta reside não só na necessidade de legitimar a profissão de relações públicas em Portugal mas, sobretudo, na coragem para apelar ao sentido ético de uma indústria da persuasão, com cada vez maior expressão na construção do debate público.
Desde os anos 80 que os estudos em relações públicas proliferam em Portugal no âmbito do ensino superior em Ciências da Comunicação. No entanto, se perguntarmos a qualquer pessoa o que são as relações públicas podemos obter duas respostas caricatas: ou não sabem do que se trata ou, se sabem, associam-nas a actividades tão díspares como porta-voz, assessor de imprensa, porteiro de discoteca, modelo ou mesmo cartomante.
Entre as variadas razões que explicam a fraca legitimação da profissão de relações públicas sobressaem as seguintes: primeiro, estamos longe de possuir uma definição consensual sobre o que são as relações públicas e o seu campo de estudo; segundo, existe uma ambiguidade crescente sobre qual o papel central das relações públicas nas organizações e na própria sociedade. Ou seja, a dificuldade em encontrar um estatuto epistemológico para as relações públicas, tantas vezes negado por outras áreas científicas, como as ciências da comunicação e empresariais, reflecte-se na falta de uma delimitação clara e real do seu papel. Além disso, sobretudo nos últimos anos, muitas vozes se têm dedicado a associar a profissão, especialmente as agências de comunicação, com estratégias de manipulação da opinião pública e com jogos de poder de spin doctors. Também a clássica relação contenciosa entre as relações públicas, enquanto fonte de informação institucionalizada, e o campo jornalístico, tem minado a afirmação de uma identidade profissional ética.
Consciente deste panorama, e preocupado em valorizar e harmonizar as práticas profissionais no sector das relações públicas, o Código de Conduta proposto pela APCE define uma actividade centrada na construção e defesa da identidade e reputação das organizações, e fundamentada nos seguintes valores:
1. «…adere ao exercício da actividade profissional apenas com verdade, em defesa dos interesses da entidade com quem colabora (…) e os seus diversos públicos, salvaguardando o interesse público.»
2. «…é leal à entidade que representa, salvaguardando sempre o interesse público».
3. «…protege a informação confidencial relativa à entidade para quem trabalha (…) não a utilizando, em qualquer caso, para seu próprio benefício, ou de terceiros».
4. «…acredita e defende o livre exercício dos direitos humanos, em especial a liberdade de expressão, liberdade de reunião e liberdade dos meios de comunicação social (…).».
Como se pode observar, os valores enfatizados procuram balizar o principal dilema ético com que qualquer profissional se pode deparar na sua prática quotidiana: o dever para com o cliente ou empregador e, ao mesmo tempo, o dever para com a própria sociedade, para com o interesse público. Qualquer relações públicas, no desenvolvimento dos seus processos de comunicação, procura, naturalmente, informar mas também influenciar os públicos (internos ou externos) relativamente às razões subjacentes às propostas da organização. Ora, se este é muitas vezes um processo de persuasão fundamental para a eficácia da estratégia organizacional, também provoca tensões no receptor. Mas, se o interesse público estiver subjacente ao processo persuasivo espera-se conseguir contribuir para estabelecer relações mais duradouras entre as diferentes partes, presididas por um clima de confiança, credibilidade e respeito mútuo. É este, no fundo, o objectivo último das relações públicas há muito teorizado, quer pela chamada Escola Europeia de relações públicas (L. Matrat), quer pela visão sistémica norte-americana (Grunig & Hunt).
Não posso ainda deixar de realçar os “Deveres Especiais” sublinhados neste Código. O profissional deve preocupar-se com a “sua formação contínua”, é responsável pela “promoção e divulgação da sua actividade profissional, quer junto dos seus pares, quer das empresas e outras entidades potenciais utilizadoras destes serviços, quer, ainda, da sociedade em geral» e também, “pela progressiva visibilidade e reputação da profissão”. Além disso, deve ser um “elemento activo na sensibilização da consciência social, na defesa do Planeta, da biodiversidade, na luta contra a fome, violência e injustiça e, apoiando políticas socialmente sustentáveis”.
Em suma, acredito que o estatuto profissional das relações públicas só poderá ser alcançado quando for ao encontro de critérios básicos comuns a todas as profissões, tais como, possuir um corpo teórico de conhecimentos e competências técnicas especializadas, oferecer um serviço único e de qualidade na sociedade, servir o interesse público, existirem organizações profissionais sólidas e manter um código ético. O código de conduta da APCE parece ser um passo correcto neste sentido.

Gisela Gonçalves - Docente do Departamento de Comunicação e Artes


Data de publicação: 2009-02-10 00:00:01
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