Voltar à Página da edicao n. 444 de 2008-07-29
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> <strong>José Geraldes</strong><br />

Tempo livre e alegria

> José Geraldes

Nas sociedades modernas, o tempo livre ocupa um lugar privilegiado. O fenómeno da urbanização alterou as formas de vida. E a antiga divisão do trabalho foi substituída por horários diversificados. A tal ponto que a todas as horas do dia há gente a usufruir de tempo de repouso. O ritmo agrícola de sol a sol da sociedade rural desapareceu.
Os tempos livres ganharam também mais espaço com o modelo do Estado-Providência. Os aposentados cresceram a um ritmo galopante muitos dos quais dotados de um poder de compra generoso. O aumento da média da esperança de vida alargou âmbito dos que podem ter mais tempo livre. E depois há esse imenso mercado para os idosos ocuparem o seu tempo.
Desde 2004, o Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura, desenvolveu uma reflexão sobre a problemática dos tempos livres. Reflexão em que participaram artistas, intelectuais de vários quadrantes crentes e não crentes, pessoas do terreno, actores de teatro e cinema e gente de outras proveniências. O resultado da reflexão foi agora publicada num opúsculo sob o título sugestivo Do tempo livre à libertação do tempo.
Para além do elogio do tempo livre, podemos ler no opúsculo ideias sobre a sua valorização. “Mesmo o descanso autêntico pede para ser enquadrado nesta dinâmica maior da responsabilidade pela realização pessoal e social.” E em concreto: “O tempo livre é tempo de integração. De enriquecimento cultural, pessoal, afectivo. De exercitação do músculo da imaginação e da criatividade. De explicitação da vida interior.” Ora depende de cada um de nós dar-lhe esta dimensão. E saber orientá-lo para um novo estilo de vida em que sejam ganhadores o psíquico e o espiritual.
Mas será fácil gerir o tempo livre? À primeira vista, parece que sim. Mas na prática surgem dificuldades. Porquê? “Formar para o tempo livre é educar para a liberdade. Dar os instrumentos para que cada uma construa a sua própria casa e não espere uma vida pré-fabricada. Que cada um conheça as suas verdadeiras necessidades, emoções, desejos mais íntimos para poder escolher quer o seu tempo, quer a sua vida. Isso é verdadeira autonomia. E para isso é tantas vezes preciso “perder” muito tempo livre.” Esta “perda” de tempo acaba por ser compensada pela qualidade do tempo de que vamos usufruir. E, hoje, interessa mais a qualidade do que a quantidade.
O tempo livre aparece como um tempo de alegria, por excelência. E não um tempo de tristeza à espera que os dias passem. O escritor inglês G.K. Chesterton escreve: “O comum dos homens viu-se forçado a ser alegre no que dizia respeito às pequenas coisas, mas triste no que se refere às grandes. No entanto, não é próprio da condição humana ser assim. O homem é mais ele próprio, o homem é mais semelhante ao homem, quando a alegria é a coisa principal que se encontra nele e a tristeza é uma coisa acidental.” E prossegue: “A melancolia devia ser um inocente entreacto, uma terna e fugitiva moldura do espírito, ao passo que a alegria deve ser a constante pulsação da sua alma...A alegria é o gigantesco segredo do cristão.”
Só com alegria, o tempo livre tem todo o seu sentido. Não a alegria efémera e superficial que vem do entretenimento mas que brota do nosso interior. E nos dá uma forma de “bem-ser”. E, claro, nos torna felizes.


Data de publicação: 2008-07-29 00:00:00
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