Voltar à Página da edicao n. 433 de 2008-05-13
Jornal Online da UBI, da Covilhã, da Região e do Resto
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> <strong>Nuno Augusto</strong><br />

As novas gerações e a “política” – tão diferentes e tão iguais

> Nuno Augusto

O discurso do Presidente da República nas comemorações do 25 de Abril contemplou uma temática que há muito vem preocupando não só Portugal, mas toda a Europa – o (des)interesse dos jovens pelos processos democráticos. O “livro branco para a juventude” da Comissão Europeia reflecte essa preocupação, ao concluir que «os jovens investem menos do que no passado nas estruturas tradicionais de acção política». A conclusão do estudo realizado por Chrisholm e Kovatcheva para o Conselho da Europa é em tudo semelhante – «os jovens demonstram uma distância e desilusão relativamente aos processos da democracia moderna».
Este afastamento dos jovens dos mecanismos tradicionais de participação e de envolvimento político tem sido, na minha perspectiva erradamente, assumido como um sinónimo de desinteresse pela política ou pela democracia. Raramente é visto como sintoma de uma entropia criada na relação entre jovens e “máquina política”, e mesmo quando assim é, a balança de responsabilidades acaba por tender quase sempre para o lado dos jovens, assumidos como hedonistas, auto-centrados ou irresponsáveis. Nem sempre as instituições políticas ou o funcionamento da “máquina democrática” são objecto da mesma avaliação.
Muito do discurso jornalístico ficaria marcado por estereótipos associados à condição juvenil, que em nada contribuem para esta discussão, bem pelo contrário. No texto de Constança Cunha e Sá do Público do dia 8, por exemplo, destaca-se a seguinte frase – «os “jovens” são limitados pelo seu umbigo e pelo imediatismo dos seus interesses». Na verdade são limitados por muitas outras coisas – a precariedade, o desemprego, a frustração de quem é licenciado e não pode fazer o que aprendeu, o risco que envolve o casamento, os fracos níveis salariais, a total instabilidade. Isto sim, sabem-no os cientistas sociais, influencia negativamente a relação com a política, ampliando o desencantamento, a desconfiança e a apatia política.
O estudo da Católica, no qual se baseou o discurso do PR conclui o que, no fundo, já sabíamos (pelo menos na Beira Interior) – que «as diferenças entre os jovens adultos e o resto da população activa não é significativa». Então, porquê tanto alarido? Na verdade, ele justifica-se de algum modo.
Segundo os dados nacionais do ESS de 2005, e contrariamente ao que deixa entender o estudo da Católica, os jovens revelam um maior grau de competência política que os mais velhos. Basta verificarmos que apenas 15% dos jovens portugueses (entre os 18 e os 29 anos) refere que a política é frequentemente difícil de compreender, uma percentagem que aumenta “a pique” à medida que avançamos na idade (atingindo os 41% junto dos mais velhos). Em certa medida, podemos dizer que, ainda que mais inteligível, a política continua a ser, tal como para os seus pais e avós, muito pouco atractiva, o que não deixa de ser estranho, tendo em conta o ambiente político em que foram socializadas ambas as gerações.
O aumento das competências sociais e políticas dos jovens, assim como a sua socialização política contribuíram, quanto muito, para uma manutenção intergeracional do desinteresse e da desconfiança. Na verdade, o ambiente social e político vivido pelas gerações actuais seria, para as gerações anteriores, uma autêntica miragem. Mas é também um contexto muito mais marcado pela incerteza, pela instabilidade e por uma profunda burocratização, partidarização e eleitoralização do processo político democrático.
Aquilo que nos devemos questionar é porque é que, mesmo depois de tudo o que se projectou para estas gerações e da sua socialização para a democracia, elas continuam a revelar uma fraca relação com a “máquina política”. Importa, igualmente, ter em conta que o processo de representação é composto por dois lados – representantes e representados – e que ambos têm responsabilidades neste processo. Assumir um princípio de mútua responsabilização é condição fundamental para a compreensão deste problema. Até que ponto a própria “política” não se estará a afastar dos jovens? Em que medida responde às suas expectativas? Até que ponto a integração política dos jovens é acompanhada por uma igual integração social? São estas algumas das perguntas a que procurei dar resposta na investigação que conduzi na UBI e que, infelizmente, não estão contempladas no estudo encomendado à Universidade Católica. Mais do que saber os números, importa-nos saber as causas, admitindo, como o fazem os teóricos das gerações, que os jovens (sobretudo os portugueses) podem constituir um importante sintoma da saúde da democracia e não necessariamente uma doença. Para Muxel, uma das maiores especialistas europeias nesta área, a atitude dos jovens pode revelar uma necessidade de moralização da política. Cabe agora aos políticos perceber porquê.


Data de publicação: 2008-05-13 00:04:00
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