Estatuto Editorial | Editorial | Equipa | O Urbi Errou | Contacto | Arquivo | Edição nº. 420 de 2008-02-12 |
A política da geração “à rasca”
É o primeiro estudo académico sobre a relação dos jovens nascidos no pós 25 de Abril e o sistema político. Uma tese de doutoramento que vem deitar por terra a imagem da “geração rasca” e mostrar o papel que os jovens têm desempenhado na mudança da política.
> Eduardo AlvesUma década de docência na área das Ciências Políticas conferiu a Nuno Augusto, professor da UBI, a experiência necessária para levar por diante o primeiro estudo académico sobre a relação dos jovens com a política.
As principais conclusões de um vasto trabalho que decorreu ao longo de um par de anos estão agora reunidas em 750 páginas e dão corpo a uma tese de doutoramento intitulada “Novos Actores Sobre Velhos Palcos: juventude, política e ideologias no Portugal democrático”. Um estudo que procurou, no essencial, “verificar de que forma esta nova geração, e em particular, os jovens nascidos depois do 25 de Abril, se relacionam com a política e com o domínio político, entendendo aqui a política num âmbito mais alargado e não só na visão da política tradicional, partidária”, explica o autor. Daí que, “uma outra dimensão fundamental deste trabalho passasse também por tentar perceber de que modo os jovens, analisam, interpretam e se relacionam com a clivagem esquerda/direita. Até que ponto essa clivagem continua a fazer sentido e se fazendo sentido, quais são os elementos que os jovens utilizam para definir a esquerda e a direita”.
Depois de vários inquéritos, de questionários com questões desenhadas especificamente para este tipo de trabalho, o docente do Departamento de Sociologia da UBI acabou por concluir que “estas novas gerações estão a aproximar-se bastante daquelas que são as linhas de orientação europeias, daquilo que são as tendências em termos de comportamentos políticos e inclusive a anular uma certa anomalia apontada por muito académicos europeus em relação ao nosso País, neste domínio”. Uma das descobertas importantes que se verificou neste trabalho “tem a ver com um dos elementos que marcava, segundo alguns autores internacionais, a anomalia portuguesa, que era o facto de em Portugal se poder dizer que era um dos poucos países onde nem a religião, nem a classe social tinham qualquer relação com a clivagem esquerda/direita”.
Nuno Augusto vem contrariar essa vertente. O autor deste trabalho sublinha que “através de dados nacionais, foi a partir de 1999 que a religião se passou a tornar um critério fundamental para vincar esta clivagem esquerda/direita, que já não passa tanto por valores económicos, portanto, já não é o eixo socialismo/liberalismo nem o socialismo/capitalismo”. Augusto é prático na exemplificação das teorias e rápido no discurso, pelo que adianta que “esta divergência de ideais é claríssima “quando levantamos questões como o aborto ou a homossexualidade. Para os jovens, hoje a distinção esquerda/direita, prende-se muito mais com os chamados novos valores sociais e muito particularmente quando estão em causa liberdades individuais, aí a clivagem é muito relevante”.
“Aquilo que os dados nacionais nos comprovam é que os jovens têm um grau de interesse pela política muito semelhante àquele que têm as gerações anteriores”.
Mas contrariamente àquilo que é uma pressuposta imagem do senso comum, “de que os jovens de hoje têm menos interesse pela política, é perfeitamente errada”, garante o docente. “Nenhum estudo nos aponta nesse sentido, nenhum dado nacional nos aponta nesse sentido”, remata. As novas gerações “são efectivamente um elemento fundamental na mudança política nos últimos anos, não só na Europa, mas também já em Portugal e aquilo que o estudo prova, contrariamente ao que se verificava com alguns estudos nos anos 90 é que em Portugal isso já é visível. E esta é de facto a grande conclusão da tese”, sublinha Nuno Augusto.
Há toda uma parte da tese dedicada “à visão pejorativa, que sistematicamente se utiliza, dizendo que são jovens e não pensam e na verdade, na minha perspectiva, os jovens são um dos elementos fundamentais na mudança política”. A geração rasca é uma geração muito mais “à rasca”. É a primeira geração “de uma crescente precarização das relações e condições laborais, aquilo que se vem conhecendo como a geração “iô-iô”, que está constantemente a entrar no mercado de trabalho, mas também a sair dele”. O docente alerta para o facto de “hoje estarmos a verificar que a crise do modelo social tem as consequências que tem. Os jovens são os que mais vivem a precaridade laboral, são os que mais vivem a entrada e saída no mercado de trabalho, o sub-emprego, o trabalho a tempo parcial, mas isto em toda a Europa, não é apenas em Portugal”.
Nuno Augusto lembra também que a juntar a tudo isto “houve sempre a tentação e a tendência para classificar e catalogar negativamente a juventude. Houve quase sempre muito pouca tendência para olhar para ela como um potencial instrumento de transformação social e política como resultado da experiência que vivem nas suas situações”.
O júri das provas foi composto por, Luís Carrilho, professor associado do Departamento de Engenharia Electromecânica da UBI, Elísio Estanque, professor auxiliar da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Maria João Simões, professora auxiliar do Departamento de Sociologia da Universidade da Beira Interior, Manuel Villaverde Cabral, professor catedrático e presidente do Conselho Científico do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, José Carlos Venâncio, professor catedrático do Departamento de Sociologia da UBI, estes dois últimos como orientadores da tese e também André Freire, professor auxiliar do Instituto Superior de Ciências Sociais e do Trabalho e Pedro Moura Ferreira, investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, como arguentes.
> amacedo @ ubi . pt em 2008-02-15 21:51:52
Parabéns! Considero muito interessante esta visão positiva da nossa juventude. Vou utilizar estes argumentos para justificar a minha opinião sobre a juventude, frente àqueles que culpam os jovens de todos os males da sociedade...
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