Voltar à Página da edicao n. 379 de 2007-05-08
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> <strong>José Geraldes</strong><br />

A solidariedade de que precisamos

> José Geraldes

Foi há 40 anos. O movimento da descolonização era imparável. A economia baseava-se em leis que permitiam aos mais ricos aumentar a sua riqueza. Os pobres vegetavam em condições infra-humanas.
O Concílio Vaticano II tinha acabado três anos antes com a publicação de um documento em que a Igreja assumia “as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens do nosso tempo”. A linguagem tinha ares de novidade.
Em 1967, a encíclica Populorum Progressio (Progresso dos Povos) aparece como um alerta dramático para as situações das desigualdades sociais. Paulo VI, o seu autor, põe o dedo na ferida ao denunciar, sem sofismas, a situação da época.
Com realismo e intuição profética, o papa apresenta os dados do problema: “Ser libertos da miséria, encontrar com mais segurança a subsistência, a saúde, um emprego estável, ter maior participação nas responsabilidades, excluindo qualquer opressão e situações que ofendam a sua dignidade de homens, ter maior instrução, numa palavra realizar, conhecer e possuir mais, para ser mais: tal é a aspiração dos homens de hoje quando um grande número de entre eles estão condenados a viver em condições que tornam ilusório este legítimo desejo”. O diagnóstico do papa não podia ser mais certeiro.
Mas impunha-se encontrar remédios para uma situação que não podia continuar. Para além do crescimento económico, a chave- sublinha Paulo VI- está “no desenvolvimento integral do homem todo e de todos os homens.” Mas este desenvolvimento só pode conseguir-se mediante a prática do “dever da solidariedade”.
Os povos só por si não conseguem o desenvolvimento desejado. A interdependência a que estão sujeitos e, tendo em conta as disparidades económicas fautoras de tensões a pôr em perigo a paz, exige um desenvolvimento solidário. Daí: “ O desenvolvimento é o novo nome da paz.”
A solidariedade não se compadece com qualquer tipo de egoísmo. Por isso, Paulo VI sugeria “um grande Fundo Mundial” para “vir em auxílio dos mais deserdados”.
João Paulo II, 20 anos depois, ao fazer o balanço da aplicação as propostas de Paulo VI na sua encíclica Solicitude Social da Igreja considerou os resultados positivos. E considerou não justificáveis o pessimismo, a passividade e o desespero perante situações graves. Mas denuncia, por seu turno, os atropelos à dignidade da pessoa humana. E observa: “O panorama actual não parece que corresponda a essa dignidade”. Panorama que, nos tempos modernos se mantém olhando para a situação internacional.
A Conferência Episcopal Portuguesa publicou uma nota sobre estes 40 anos. E num olhar para o País sublinha que o retrato da Populorum Progressio se pode aplicar ao Portugal de hoje. Os dois milhões de pobres, o desemprego, a desertificação do Interior, a solidão dos idosos, o envelhecimento da população e as deficiências no sistema de saúde são pormenores deste retrato.
A sociedade portuguesa está cada vez mais desigual. O fosso de separação dentre ricos e pobres alarga-se. E quem detém os recursos constitui uma minoria. O egoísmo e o consumismo campeiam.
A solidariedade é bem de que a sociedade precisa como do pão para a boca. Como há 40 anos.


Data de publicação: 2007-05-08 00:00:00
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