Estatuto Editorial | Editorial | Equipa | O Urbi Errou | Contacto | Arquivo | Edição nº. 374 de 2007-04-03 |
“Temos de olhar para Bolonha como um espaço de novas oportunidades”
São muitas as mudanças introduzidas no curso de Ciências do Desporto são explicadas por Pedro Guedes de Carvalho. O novo presidente do Departamento adianta alguns dos projectos que vão agora ser implementados e que passam por uma nova vertente de ensino e uma maior abertura ao exterior.
> Eduardo AlvesUrbi@Orbi – Como está actualmente o Departamento de Ciências do Desporto?
Pedro Guedes – Um departamento que é novo na idade e parco em número de doutorados da área e na categoria profissional, mas espera-se que até o segundo semestre do próximo ano lectivo triplique esse número de doutorados e entre naquilo que se pode chamar a sua velocidade cruzeiro.
Por outro lado tem uma vantagem de ter doutorados de outras áreas de conhecimento que são necessárias na formação instrumental de base e na operacionalização de tarefas de gestão e organização.
Um Departamento que faz uma mudança no sentido de adequar o seu curso aos princípios de Bolonha passa sempre por um período de transição algo “agitado” que tem as desvantagens e inconvenientes que teremos que saber gerir.
U@O – Que medidas foram tomadas desde que está na presidência do Departamento?
P.G – A preocupação central foi medir o estado psicológico de motivação e ambição dos seus elementos, desde o pessoal de manutenção e limpeza, passando pelo sector administrativo e técnico, até ao seu corpo docente.
Diagnosticada a contradição entre o estilo de trabalho de uma parte do seu corpo docente e a restante maioria que entendeu olhar Bolonha como um espaço para novas oportunidades, a primeira tarefa foi a de reorganizar alguns procedimentos que aumentassem o tempo útil para dedicar às tarefas importantes por parte de todos os colaboradores e encontrar uma linha de horizonte condizente com a Universidade e os recursos humanos disponíveis.
Do ponto de vista administrativo aumentou-se a responsabilidade e formação dos funcionários, descentralizaram-se tarefas e procurou-se que os docentes entendessem claramente a orientação do novo presidente do Conselho Científico, no sentido de aumentar a sua produção de conhecimento científico, publicando o que se vai investigando e fazendo.
Sendo difícil enveredar por esse caminho dada a história e formação do corpo docente, elaborou-se um plano individual de percurso para dois anos de cada doutorado; estamos agora a tentar ganhar o tempo perdido nessa componente da publicação, aproveitando sinergias com a actividade docente e de prestação de serviços à comunidade.
O processo de Bolonha foi um processo de mobilização dos saberes existentes e um processo rico na elevação da assertividade de cada um de nós: ficamos a perceber os nossos pontos fortes e fracos e, com humildade, criamos uma disponibilidade para ir procurar as áreas de conhecimento que não temos.
U@O – Como é que encara as mudanças introduzidas por Bolonha?
P.G – Os principais objectivos de Bolonha são fazer o mesmo em menos tempo, se possível com mais qualidade e garantindo que todos os primeiros ciclos do País e Europa sejam harmonizados, o que é diferente de uniformizados.
O essencial é que sejamos capazes de dar uma formação aos nossos alunos que os capacitem para prosseguir estudos aqui ou noutra Universidade nacional ou europeia. A mobilidade é um grande objectivo da nova política do ministério e a aprendizagem com diferentes escolas de pensamento alicerçadas em boas bases de conhecimento é sempre uma mais valia tendo em vista a futura empregabilidade dos licenciados.
U@O – Como foi todo esse trabalho de preparação?
P. G. – O que fizemos foi uma revisão vastíssimas das melhores escolas europeias e mundiais sobre o que se faz por esse mundo fora na área do ensino do Desporto, baseados nas metodologias Tunning e nos documentos da AHESIS e do Observatório Europeu de Emprego na área do desporto e verificamos que existem três correntes essenciais: a da ligação do desporto às áreas da saúde; as ligadas às modalidades desportivas mais convencionais e as ligadas à actividade humana em geral, ao lazer, turismo, qualidade de vida.
Olhando ao nosso capital humano e logístico, entendemos que a melhor estratégia seria escolher a primeira e a terceira das invocadas como principais orientações que nos dariam identidade e aproveitar a montanha para nos dar a diferenciação.
Um outro ponto que nos dará alguma diferenciação, é a de incorporar no core do curso a área de economia e gestão no desporto, pois permite intervenções muito mais interessantes que as mais convencionais de Professores de escolas ou treinadores de clubes. Orientação esta que, aliás, estava já na origem de criação deste Departamento.
De facto o leque de organizações onde o licenciado do desporto pode intervir aumentou muitíssimo nos anos recentes. Trata-se de treinar o Homem para as situações mais imprevisíveis com que se defronta hoje: empresa-trabalho; gestão de cidade; prevenção e saúde; treino de equipas dirigentes das mais diversas corporações militares ou de intervenção na segurança (polícia, exército, força aérea, bombeiros, forças da ONU, etc.).
Mas para tal o fazer é necessário muito trabalho de terreno para a compreensão da diversidade e da complexidade destes contextos. E essa é uma componente metodológica que estamos a tentar reforçar.
U@O – Como está a ligação aos restantes Departamentos?
P. G. – O trabalho de alargamento e abertura da nossa rede relacional já se iniciou e está a dar os primeiros frutos. Na UBI o relacionamento com Medicina está a ser acentuado e tem como objectivo resolver uma velha questão entre diagnóstico e prescrição de treino. Houve sempre uma atitude mais corporativa por parte dos médicos que acabam por prescrever treino sem enquadramento adequado. Ora nós defendemos que o diagnóstico médico é essencial para estabelecer os limites e os constrangimentos do exercício, mas cabe ao profissional do desporto prescrever e monitorar a evolução do Homem, melhorando a sua performance global, que não apenas física.
Isso está a ser feito e no passado dia 31 de Março uma equipa de alunos da Medicina com alunos do Desporto,estiveram integrados numa campanha de prevenção e rastreio de AVC com a Cruz Vermelha e as Juntas de Freguesia de Paul e Unhais.
No próximo dia 11 de Abril uma outra equipa de alunos vai estar com alunos de Medicina numa campanha de rastreio cardio-vascular num ginásio da cidade, na aplicação de diversos testes de medição de parâmetros essenciais ao diagnóstico.
U@O – São passos para mudar a filosofia do Departamento?
P. G – Queremos mudar também algumas das atitudes e valores dos jovens estudantes. Por exemplo, quando se recrutavam voluntários para estas actividades, houve alunos que não quiseram participar por considerarem “menores” estas actividades e acharem que um futuro licenciado de desporto deve almejar muito mais.
Ora, querendo nós que os nossos alunos sejam ambiciosos, não deixamos de querer também que eles entendam que a humildade e experiência de terreno, no contacto com as pessoas e seus problemas lhes dará uma “tarimba” diferente na vida futura e uma percepção da diversidade social que outros não terão.
Daí que estamos a apostar fortemente na formação no terreno, desde a observação ao diagnóstico e até à competência da prescrição fundamentada e controlada do treino e da organização.
U@O – E o relacionamento com a comunidade, que medidas vão ser tomadas nessa área?
P. G – Não vamos estabelecer protocolos escritos para que nada se faça. A nossa metodologia vai ser a de pequenos passos, dados com segurança, escolhendo os parceiros certos e fazendo pequenos projectos que possam ter grande impacto por que se vão consolidando paulatinamente. Essa a imagem que queremos criar do nosso Departamento. Sabemos para onde queremos ir, as condições que ainda nos faltam e as adversidades e resistências à mudança. Mas vamos fazê-lo, com mais e elevados padrões de exigência e critérios cientificamente rigorosos. É uma empreitada difícil, mas não impossível.
Nesse sentido, temos já estabelecido contactos com as outras faculdades de Desporto do País e os projectos de pesquisa e colaboração docente conjuntos estão em marcha. Sabemos que não poderemos ter cursos de terceiro ciclo em poucos anos sem ter um centro de pesquisa de excelência, e por isso estamos a trabalhar com outros no desenvolvimento de projectos conjuntos que nos permitam aumentar o nosso nível de conhecimentos e competências.
Temos já dois professores que estão convidados para irem leccionar alguns módulos num curso de doutoramento no Porto a partir do próximo ano, assim como temos professores de outras universidades que virão leccionar e acompanhar alunos do nosso futuro mestrado. Esta dinâmica gerará os seus frutos em alguns anos.
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