Voltar à Página da edicao n. 373 de 2007-03-27
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> <strong>José Geraldes</strong><br />

Depois do Carnaval

> José Geraldes

Nos tempos que correm a palavra Quaresma nada diz a muita gente e muito menos às gerações mais jovens. O fenómeno da secularização foi apagando o seu significado. Já o Carnaval enche as páginas dos jornais e as televisões esmeram-se em “directos” prolongados dos vários pontos do País e do mundo onde a data é assinalada com grandes festejos.
Nas aldeias, há quem se vista de Entrudo. As escolas promovem festas de Carnaval para as crianças se divertirem. Promovem-se grandes desfiles de promoção turística com figuras alegóricas que são pretexto para críticas aos poderes instituídos sobretudo na esfera política.
Também entraram na moda os bailes de máscaras com destaque para cidades importantes da Europa e da América de que cineastas se serviram para ilustrarem cenas marcantes dos seus filmes.
O Carnaval anda associado a uma certa magia de prazeres gastronómicos e de divertimento em que a máscara desempenha um papel importante. Mas a importância do Carnaval diverge de país para país .
Na Europa, não existe um dia feriado como em Portugal. Feriado, aliás, considerado um luxo. Mas a tradição impõe hábitos que não muda as mentalidades. Na América Latina e sobretudo no Brasil, o Carnaval adquire estatuto de identidade nacional. Com cortejos alegóricos preparados a nível industrial que paralisam cidades de milhões de habitantes. E onde todos os anos se contam mortos, roubos e exagero de cenas ousadas no domínio da sexualidade.
Os “Entrudos” usam a máscara para se mostrarem como uma outra personagem que não a verdadeira. Andar mascarado liberta a pessoa dos seus constrangimentos habituais e dá a ilusão de viver um momento diferente, para eliminar recalcamentos sociais.
A origem da palavra Carnaval tem uma ligação a comesainas opulentas. Daí o Carnaval significar “adeus à carne”. Pela simples razão de que historicamente a Quaresma impunha abstinência de carnes gordas. O chamar-se Domingo Gordo ao domingo anterior ao Carnaval denota isso mesmo.
A Quaresma que começa na Quarta-Feira de cinzas, a quarta-feira a seguir ao Carnaval, tem a marca da prática do jejum. Jejum que não traz na sua origem as carnes gordas do Carnaval. Este jejum era o sinal de luto pela morte de Cristo.
Os primeiros cristãos para celebrar a Páscoa, festa da Ressurreição, concluíram pela necessidade da sua preparação a sério. Primeiro foram dois dias. Depois no séc. III, a preparação passou para uma semana. Na séc. IV, fixou-se nos actuais quarenta dias.
A ideia da Quaresma foi sempre um tempo privilegiado de renovação da vida. E três práticas assinalam este tempo : a oração, a luta contra o mal e o jejum. A oração para redescobrir os verdadeiros valores, a luta contra o mal para combater o egoísmo, o ciúme, as invejas, o rancor e o domínio dos outros, o jejum para sairmos da mediocridade e nos levar ao controlo pessoal e ultrapassar a tendência da fuga ao sacrifício.
Um livro do séc. II o Pastor de Hermas explica que o jejum está relacionado com a ajuda aos outros : “Oferecerás esse dinheiro (da privação de alimento) a uma viúva, a um órfão ou a um pobre. Assim privar-te-ás de alguma coisa para que o teu sacrifício sirva a alguém para se saciar”.
No mesmo tom, Bento XVI escreve na sua mensagem que a Quaresma é o tempo para “reconhecer as feridas provocadas à dignidade do ser humano e combater qualquer forma de desprezo da vida e exploração da pessoa e aliviar os dramas da solidão e abandono de tanta gente.”
Para todos os homens de boa vontade, a Quaresma apresenta-se como uma oportunidade para melhorar o mundo e retomar em compromisso os valores perenes que estão a perder-se numa sociedade marcada pelo imediato e pelo gozar somente a vida.


Data de publicação: 2007-03-27 00:00:00
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