Voltar à Página da edicao n. 370 de 2007-03-06
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“A formação de professores vai ter um novo impacto”

Numa época em que tanto se fala sobre o desemprego entre os jovens licenciados que optaram pela via do ensino, o presidente do Departamento de Letras da UBI desdramatiza a situação e aponta casos de sucesso, como o curso de Espanhol. António dos Santos Pereira fala ao Urbi dos novos projectos.

> Eduardo Alves

Urbi@Orbi – A língua portuguesa é uma das mais importantes do planeta, a quarta mais falada à escala global. Contudo, desde a cultura à política, vários sectores têm apontado o dedo à forma como se trata e preserva este idioma. Que diagnóstico é que faz à nossa língua?
António dos Santos Pereira –
É um diagnóstico extraordinariamente positivo. Nunca como agora tivemos tantos e tão bem formados professores. Não há universidade nenhuma no País, que não tenha um curso de português. Nós temos aqui um curso de Língua e Cultura Portuguesas que faz este ano dez anos. Estamos na década das letras e cumprimos agora uma data marcante na área das letras e da cultura portuguesa. Temos formado excelentes professores, com óptimas colaborações, com doutorados que vieram de outras universidades, mas também já com doutores que aqui foram formados. Lembro que já formamos aqui cinco doutores na área das letras, dois na área da linguística, uma na área mais das didácticas e dois na área das literaturas o que quer dizer que temos coberto todos os principais âmbitos da língua e da cultura. Temos também formado mestres em língua e cultura portuguesas e didáctica, seguramente mais de três dezenas de mestres formados e mais de uma centena de licenciados em LCP, Português-Espanhol e Português-Inglês. O Português está sempre como charneira, como eixo do Departamento. Aqui temos mais de cem créditos, contabilizados no modelo de Bolonha, em Português.O que aconteceu connosco aconteceu obviamente com outras universidades. E já com mais de 30 anos de Ensino direi que nunca como hoje houve tantos e tão bons professores e preparados especificamente para a actividade de docente.
É evidente e tendo em conta a massificação que houve do ensino e que a sociedade portuguesa ainda é pobre, ainda está em processo de enriquecimento, só quando cumprida uma geração podemos dizer que está cumprida a missão efectiva da melhoria do português, da maior capacidade de leitura de autores portugueses. Quem não chega à universidade lê relativamente pouco e frequentemente lê aquilo que lhe é imposto pelos meios de comunicação social, leitura estrangeirada, ainda que nós tenhamos actualmente dos grandes escritores universais e a Beira tem meia dúzia de autores que poderiam ter sido, seguramente, prémios Nobel. Beira até Trás-os-Montes, desde o Vergílio Ferreira ao Aquilino, passando por Miguel Torga, qualquer um deles poderiam ter sido distinguidos com esse prémio. Temos na Covilhã o Alçada Batista, o Manuel Ramos, enfim, um conjunto de autores de gabarito internacional com nível elevado em termos de prática literária, que não perdem no planeta, ainda que mantenham as suas identidades, as raízes.
A língua portuguesa é falada por 220 milhões de seres humanos. As línguas mais faladas provêm de países que tiveram colónias na América. No Norte, com o inglês, embora a Inglaterra não tenha sido a primeira nação a chegar àquele continente, mas depois apoderou-se de quase toda a América do Norte, o Espanhol, também e naturalmente o Português que tem o Brasil que é praticamente um continente e que hoje é a nação que fala Português.

Urbi@Orbi – Tem vindo a publicar estudos sobre o português de outros tempos. Como está a historiografia contemporânea portuguesa?
A.S.P. –
Se há artes, saberes ou ciências desenvolvidas em Portugal, a ciência histórica é uma dela. A História teve uma explosão espectacular a seguir à Revolução de Abril, e na minha opinião, da área das humanidades, foi um dos saberes que explodiu nessa altura. Já havia grandes mestres, mas a História conseguiu massificar em Portugal nesse período pós revolução, desde 1975/76, até finais da década de 80. Foi daqueles saberes que mais beneficiou com a revolução do 25 de Abril. Os cursos de História encheram em todas as universidades, embora hoje estejam em crise, mas por outras razões. Desenvolveram-se mestre de ofício e com o aparecimento dos centros de investigação, de estudo, a História Portuguesa ombreia hoje com qualquer história planetária nas terminologias, nos temas, na qualidade, inclusive, das edições. É um outro saber que não sofre de nenhuma crise e é um saber desinibido. Deixou de estar condicionada nos temas, aqui a abolição da censura também ajudou e por outro lado houve a necessidade da afirmação, da procura da identidade nacional. No momento em que Portugal é integrado numa comunidade, a única afirmação da portugalidade é através de toda a identidade, da sua afirmação histórica. Também ganhou muito com os movimentos comemorativos, designadamente com o dos Descobrimentos. Tem sido ao longo dos tempos, fundamentalmente depois dos finais do século XIX, tem sido o motivo ou o elemento catalisador das comemorações camoneanas, pombalinas e dos descobrimentos, têm sido motivos para empenhar o próprio Estado. A história em Portugal não tem qualquer crise, nem sequer editorial porque têm sido publicadas várias edições e versões da história de Portugal e todas têm conhecido um sucesso absoluto, onde se destaca a figura de José Mattoso como patriarca dos mais recentes historiadores.

Urbi@Orbi – E a história da Língua Portuguesa, em concreto?
A.S.P. –
Não sou especialista nessa área. Aqui na casa, o professor Paulo Osório assume essas funções. E a história da língua não é fácil, uma vez que devia ser mais envolvente, na minha maneira de ver, de historiadores propriamente ditos. A história da língua não devia estar só entregue a linguistas. Há palavras cujo significado, origem, nós só lá chegamos porque os historiadores as colocam nos seus contextos antigos. Alguns literados, pela sua formação extraordinária, conseguem lá chegar. Estive a reler “O Trigo e o Joio” do Fernando Namora e sendo ele médico achei extraordinária a forma como utiliza uma palavra que eu tinha encontrado em documentos do século XV e XVI e já tinha chegado a algumas ilações. Ele utiliza a palavra “chouso” que tem a ver com terreno cercado e que também deu origem a coiso ou couço e aí vê-se a diferença entre estes autores literados dos restantes.
Aquilino Ribeiro também fez muitas pesquisas ao nível da língua, sobretudo para criar as suas tramas e as suas personagens, estudou a história portuguesa em profundidade.

Os instrumentos civilizacionais têm sido descobertos quando se desenvolvem as humanidades

O crescimento do Espanhol no secundário é de 100 por cento ao ano

O Departamento de Letras tem de acompanhar os tempos

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"A história em Portugal não tem qualquer crise"


Data de publicação: 2007-03-06 00:00:00
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