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Continência Verbal

> António Fidalgo

Os programas radiofónicos, tipo Fórum TSF e Antena Aberta, em que os ouvintes participam activamente no programa, dando a sua opinião sobre os mais variados temas da vida e do mundo, revelam uma característica portuguesa, talvez mediterrânica: qualquer pessoa tem a sua opinião sobre todo e qualquer assunto. Pode-se perceber pouco, ou mesmo nada, sobre o assunto em debate, mas as pessoas acham que têm de ter uma opinião, que podem e até devem pronunciar-se e dizer o que pensam. Obviamente que o resultado é em geral catastrófico. Dizem-se os maiores dislates, as mais tremendas barbaridades, com a naturalidade de quem bebe um copo de água. Confunde-se liberdade de expressão e direito de opinião com a expressão de ignorância crassa ou de cretina parvoíce. O que devia ser objecto de vergonha, de falar do que não se sabe, é tido como uma afirmação pessoal.
Quem assim procede, falar em público, para todo o país, sem saber do que está a falar, deveria sentir vergonha, perceber o ridículo em que incorre. Pelo contrário, há uma incontinência verbal que alastra como uma doença e leva pessoas, que no seu dia a dia guardam recato em palavras e acções, a resvalar para a exposição da sua ignorância ou da sua falta de discernimento.
Claro que se trata de uma atitude cultural e social. Nos países do Norte da Europa as pessoas são mais reservadas nas suas opiniões e nas suas palavras. Expõem-se menos em público. Há uma continência verbal e de juízo que os leva a reservar a sua opinião para si. Para quem tenha formação filosófica na área da fenomenologia sabe que essa reserva mental e verbal tem o nome de “epoché”, que até alcançar um conhecimento satisfatório sobre determinado assunto se deve proceder a uma reserva de juízo, nem afirmar isto ou negar aquilo, mas continuar a estudar e a analisar o assunto. Só essa atitude nos livrará do vexame de “fala-baratos” e da acusação de “incontinência verbal”.


Data de publicação: 2006-07-11 15:31:17
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