Estatuto Editorial | Editorial | Equipa | O Urbi Errou | Contacto | Arquivo | Edição nº. 333 de 2006-06-20 |
O Governo lançou um Plano Nacional de Leitura que pode conter virtualidades de grande alcance. O Plano prevê que obrigatoriamente as crianças da pré-primária e do 1º ciclo leiam livros todos os dias durante uma hora na sala de aula. Os alunos do 2º ciclo terão também um período de carácter obrigatório para a leitura, mas só uma vez por semana durante 45 minutos.
José Saramago, Prémio Nobel da Literatura, que integra a comissão de honra, não acredita nas intenções do Plano pois a “leitura sempre foi e será coisa de uma minoria”. Neste caso sublinha que “o voluntarismo é inútil”. O historiador e comentador Vasco Pulido Valente discorda também da iniciativa recusando o convite para dar a sua colaboração, argumentando que não é assim que se estimula o hábito da leitura.
No lado oposto, o poeta e escritor Vasco Graça Moura encontra méritos no Plano. Igualmente Marçal Grilo, ex-ministro da Educação e responsável pelo Programa da Língua Portuguesa da Fundação Gulbenkian, com a experiência adquirida neste organismo considera “muito positiva” a acção das bibliotecas escolares. Mas ressalva que os resultados dos estudos revelam que os estudantes até ao início da adolescência mantêm níveis de leitura razoáveis em consonância com a média europeia. A partir daqui os leitores perdem-se.
A prática da leitura em público não é nova. Alberto Manguel, na sua magnífica obra Uma História da Leitura, mostra que esta prática existia na Grécia, antes de Roma.
O mesmo se passava com Charles de Orleães no séc. XV, Ariosto e o nosso Camões (séc.XVI). Mas foi no séc. XIX que a prática da leitura em público atingiu o apogeu. O escritor Charles Dickens, na Inglaterra, treinava no mínimo dois meses a voz e os gestos. Depois, quando lia em público, arrancava lágrimas ao seu auditório.
Marcel Proust apresenta um testemunho curioso: “Talvez não haja na nossa infância dias que tenhamos vivido tão plenamente como aqueles que pensamos ter deixado passar sem vivê-los, aqueles que passamos na companhia de um livro preferido”. Os resultados da maioria das sondagens sobre os hábitos de leitura em Portugal não são muito animadores. Daí que este Plano tenha a sua razão de ser. E certamente a seu tempo dará frutos. E, como reza o provérbio, “em pequenino se torce o pepino”.
Por isso, tudo o que se faça a favor do aumento dos hábitos de leitura, merece aplauso e incentivos.
Um livro pode mudar a vida de uma pessoa. Multiplica o saber, abre novos horizontes à mente humana, introduz-nos nos caminhos da ciência. Na expressão do padre António Vieira, “o livro é o mestre mudo”. E Romano Guardini sublinha : “Os livros são fonte imprescindível de conhecimento” e causa de prazer e distracção”.
Ler os livros na pré-primária e no 1º ciclo vai criar hábitos que em estado adulto não se esquecerão. Assim funciona a natureza humana. E, com toda a certeza, nascerá a paixão da leitura.
Multimédia