Por Esmeraldina Costa



"A Bênção das Pastas é uma festa que marca muito os finalistas"

Urbi@Orbi – No dia 20 de Maio realiza-se mais uma Bênção das Pastas, na UBI. Este é um evento de cariz religioso?
Luciano Costa –
A Bênção das Pastas é um evento religioso, mas também académico. É religioso porque tem uma celebração da Eucaristia, que é sempre presidida pelo bispo da Diocese da Guarda. Mas no meio desta celebração há também pessoas que não têm fé, cristãos menos empenhados. Aquilo que antes de mais queremos promover, é que esse encontro religioso esteja aberto a todos. A celebração tem um sentido de gratidão, pelo facto de ter terminado um curso, e mesmo que haja pessoas menos crentes, há sempre uma transcendência que nos supera. É uma festa religiosa que marca muito os finalistas, e muitas vezes as famílias; não sópela própria emoção que cria, mas também por toda a caminhada que se fez para se chegar até este dia. Por isso este é um encontro muito profundo e pessoal com Deus.

U@O – Sendo o Estado português um Estado laico, como é que se explica uma celebração religiosa numa instituição pública?
L. C. –
É verdade que estamos numa sociedade laica, mas uma sociedade laica onde há pessoas que são crentes e religiosas. E esses crentes também estão na universidade; gente que também vive o dinamismo da fé nas suas comunidades. É certo que existe a separação entre a instituição e a Igreja, e é salutar, porque nos ajuda a perceber o que é a verdadeira liberdade religiosa.
Mas também não podemos esquecer outra realidade, que são as raízes cristãs do nosso País, e as próprias universidades também nasceram de algum modo à sombra da Igreja. Não podemos esquecer que há um elemento importante nesta relação. A festa em si é da instituição, mas também é dos cristãos que nela participam. Em todas as universidades existe uma Bênção das Pastas, promovida por um Departamento Diocesano da Pastoral Universitária, que tem por missão congregar todos os finalistas de uma determinada universidade, e preparar uma festa, onde existe uma Eucaristia de acção de graças. Contudo, isso não vai implicar que pessoas que sejam menos crentes, não possam ir e não se sintam bem nesta celebração.

U@O – Porque é que a UBI tem um capelão?
L. C. –
A UBI tem realmente um capelão porque nos seus estatutos quiseram que existisse essa figura. A Universidade de Coimbra, que é a mais antiga do País, também tem no seu estatuto, desde a sua origem, um capelão. Mas há outras universidades que não têm, embora quase todas tenham um sacerdote, ou um outro profissional religioso, que de algum modo ajuda os jovens dentro da universidade. Em Portugal, tem-se desenvolvido nos últimos anos uma grande preocupação por parte da hierarquia da Igreja, para que em todas as universidades exista um serviço de apoio aos universitários, que como eu disse se chama por Pastoral Universitária.
Na UBI decidiu-se, através dos seus estatutos, que deveria existir um capelão, para celebrar os actos de culto próprios da fé, e para poder haver um espaço de acolhimento para as pessoas, para tirarem dúvidas, por exemplo, sobre a história da Igreja. O capelão tem de prestar estes serviços à comunidade universitária.




"A primeira Benção das Pastas foi realizada na Capela de São Martinho"


U@O – Há quanto tempo é que se realiza a cerimónia da Bênção das Pastas?
L. C. –
Podemos dizer que quando os primeiros licenciados do Instituto Politécnico acabaram as suas licenciaturas, houve logo uma preocupação com este assunto, talvez motivada por um certo saudosismo daquilo que se fazia antes da revolução de Abril, onde havia esta festa dos finalistas. Então começou-se desde muito cedo aqui a fazê-lo. Faz parte da história da capelania que a primeira Bênção das Pastas fosse realizada na Capela Românica de São Martinho. Normalmente realizava-se sempre no dia 30 de Abril, que é o aniversário da universidade. Depois, com o crescimento da instituição, pensou-se em alargar o espaço, para um local mais amplo, mais aberto, com contacto com a natureza, e há mais de dez anos, tem-se realizado no lugar do momento, na Nossa Senhora da Conceição, um lugar tão querido dos covilhanenses.

U@O – Desde quando é que organiza esta festa?
L. C. –
Organizo este evento desde 1995. Era eu então padre da Paróquia de São Martinho.

U@O – Como se processa a organização deste dia tão importante na vida de
um estudante?
L. C. –
Processa-se de forma muito simples mas organizada. Logo no final da cerimónia, falamos com o senhor bispo sobre a festa do próximo ano. A partir de Novembro, começamos a vislumbrar uma data, que às vezes se torna um pouco difícil, já que temos que ter em conta os serviços da reitoria, escolhendo um dia em que não haja outros eventos, e também a agenda da Associação Académica, e do senhor bispo. E a partir de Janeiro o projecto começa a ter vida e cor.
No final de Fevereiro fazemos a primeira reunião com os finalistas, na sede da Associação Académica, onde se dão algumas instruções. Sabemos que os universitários andam sempre cheios de trabalhos, e por isso, se queremos coisas bem feitas, temos que traçar objectivos. Nessa reunião distribuem-se trabalhos para delegados de curso, nomeadamente um discurso, e um símbolo.

U@O – Como é que surgiu a ideia de elaborar estes pequenos trabalhos?
L. C. –
Com o passar dos anos, achei que se deveria tornar mais visível aquilo que era a realidade académica de cada curso, na UBI. E então pensamos também que tínhamos de criar a diferença. Uma delas é a fita de três metros que é assinada por todos os alunos do curso, que posteriormente será colocada na capelania, um museu onde as pessoas podem recordar essas fitas passadas.
No dia da celebração essa fita é colocada no lugar onde é proclamada a palavra de Deus. E essa fita tem assim uma simbologia muito grande, porque está ali o esforço de muito trabalho. Os símbolos também ajudam a perceber a realidade de cada curso, porque cada curso identifica-se com algo de concreto. O discurso é uma pequena oração, um texto de gratidão que visualiza o que é o símbolo. Tudo isto é um ritual que toca muito no coração dos universitários.

U@O – Como é trabalhar com jovens que estão prestes a iniciar uma nova etapa nas suas vidas?
L. C. –
Trabalhar com jovens é sempre muito aliciante. Toda a minha vida trabalhei com jovens, mas nunca esperei vir a trabalhar com jovens universitários. É uma tarefa de que eu gosto, e é muito compensadora. Aqui está-se a formar a massa critica do País, e eu muitas vezes dirijo-me aos estudantes, e digo-lhes que eles podem vir a ser os futuros presidentes do nosso País. Muitas vezes pensa-se que os universitários são indiferentes à fé, e no entanto são pessoas muito empenhadas, com muitas capacidades, gente que a meu ver, são os grandes pilares da qualidade do Mundo de amanhã. Eu procuro sempre motivar os jovens, apontando-lhes esperança para o futuro, que o Mundo há-de mudar, e que eles são também os mentores dessa mudança.

"Aconselho os jovens a nunca terem medo do futuro"

"Temos diversas actividades para a universidade"

U@O – Que outras actividades desempenha para além de organizar a Benção das Pastas?
L. C. –
A capelania procura ter um conjunto de actividades que sejam propostas à universidade, para todos aqueles que queiram participar. Logo no início do ano, fazemos o acolhimento aos caloiros no acto da matrícula, onde se encontra uma banca identificada com o nome da capelania, para ver quais são os medos e esperanças que muita gente traz para a universidade.
Todos os sábados, desde que seja tempo lectivo, há sempre missa dominical vespertina na capela dos serviços sociais, na capela que fica junto às residências de Santo António. E muitas vezes promove-se outros tipos de Eucaristias, por exemplo, os delegados de curso querem uma eucaristia de acção de graças, para um colega que está doente, ou para um colega que infelizmente partiu prematuramente. No Natal fazemos sempre a campanha dos presépios, e organizamos o jantar de reis, com alunos mais carenciados. Participamos também em encontros internacionais, já tivemos, por exemplo, a presença da universidade em Roma, em 2000, no jubileu das universidades, depois também em 2002, em Santiago de Compostela. Todas as terças-feiras, encontro-me no meu gabinete, com alunos, para reuniões. E queria também chamar a atenção ao nosso papel, no incentivo por parte dos jovens para o serviço do voluntariado, como a campanha do Banco Alimentar Contra a Fome. Mas sem dúvida que o principal evento é a celebração da Bênção das Pastas.

U@O – Quais os conselhos que dá a um finalista?
L. C. –
A primeira palavra que gostaria de dizer a estes jovens é que se sintam bem como pessoas, isto é, que se sintam em paz com eles e com os outros. E com tudo aquilo que se passa à nossa volta, uma grande palavra de optimismo e esperança.
Outro conselho que eu lhes dou é de não terem medo do futuro, e de assumirem as suas convicções com seriedade. Ser lutador e empreendedor, mesmo que seja noutras áreas, e ser competitivo mas de forma honesta.





Perfil



António Luciano Santos Costa é natural de Seia, e nasceu no ano de 1952. Frequentou o ensino normal, e foi para Coimbra, onde se licenciou em Enfermagem, e trabalhou durante nove anos no Hospital da Universidade de Coimbra, no bloco operatório. Fez o seu serviço militar, como enfermeiro.
A vontade de ser padre surgiu desde criança, e com 26 anos entrou para o Seminário da Guarda, onde tirou o curso de Teologia. Esteve dois em Roma onde estudou Teologia Moral, e durante estes dois anos trabalhou também num seminário. Quando regressou para Portugal, frequentou a Faculdade de Lisboa, onde tirou uma pós-graduação em Bioética.
Colabora neste momento na Universidade da Beira Interior, leccionando aos alunos de Medicina as disciplinas de Ética e Bioética. Paralelamente, é capelão da UBI, director espiritual dos alunos, e padre. Nos tempos livres gosta de ler, de ver televisão, e mantém um gosto particular pelo contacto com a natureza, nomeadamente através da jardinagem. Afirma que o mar lhe transmite energias positivas, e explica que a sua maior missão como padre “é conseguir o bem”.