António Fidalgo
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A inauguração da Faculdade
Há um significado político da inauguração da Faculdade de Ciências da Saúde pelo Primeiro-ministro José Sócrates a realçar. É certo que já anteriormente outros Primeiros-ministros, Cavaco Silva e António Guterres, inauguraram edifícios da UBI; mas esta inauguração foi especial. No discurso de improviso, por conhecimento da matéria e por intuito de sinceridade, José Sócrates referiu a decisão governamental de 1998 em criar aqui no Interior a nova Faculdade de Medicina e de como se tratou então de uma aposta arriscada. Salientou que havia bons argumentos dos opositores dessa decisão e que o debate chegou ao próprio Conselho de Ministros. Acrescentou que passados estes anos, se pode dizer hoje que a história da criação de um curso de medicina na UBI é um sucesso, e é-o não porque ele o diz como político, mas porque as comissões internacionais de acompanhamento assim o atestam.
Nenhum político português acompanhou de mais perto a criação da Faculdade de Ciências da Saúde da UBI que José Sócrates. Foi decisivo na deliberação de criação, tomada no primeiro governo de António Guterres, e coube-lhe agora, passados 8 anos, vir inaugurá-la. Trata-se de um gesto político, de longo historial e de longo alcance, com repercussões na política de saúde, na política académica e na política de desenvolvimento regional.
É um facto que Portugal precisa de novos médicos. A criação de novas faculdades foi uma forma firme de o governo central enfrentar o problema. Então ouviam-se os argumentos de que as 5 faculdades já existentes chegavam e sobravam para formar mais médicos. Só que o problema não estava apenas nos números totais, estava também na péssima distribuição dos médicos pelo território nacional, concentrados nos centros urbanos do litoral. A criação das Faculdades da UBI e da UMinho foi uma medida política, que ultrapassou em muito a resolução técnica do problema.
A criação de duas faculdades de medicina em duas jovens universidades fora dos grandes centros urbanos foi uma medida relevante na configuração do sistema de ensino português. Vale mais ter mais universidades com menos alunos, do que ter poucas universidades com muitos alunos. Os casos de universidades latino-americanas, nomeadamente no México, na Argentina e até em Espanha, onde algumas universidades ultrapassam as centenas de milhares de estudantes são exemplos a evitar. A racionalização, necessária, do ensino superior em Portugal não pode privilegiar o tamanho, dar-se mais a quem tem mais e retirar o pouco a quem tem pouco. A massificação é dos piores males que pode afligir uma universidade, cujas actividades, ensino, investigação, exigem uma enorme personalização. As universidades públicas portuguesas deveriam ficar-se pelos 12 a 15 mil estudantes e não mais.
O equilíbrio e a coesão do território nacional são dos maiores desafios que os governos portugueses têm pela frente. Não é politicamente aceitável que a população se concentre progressivamente no litoral, deixando o interior sem ninguém. Houve investimentos enormes ao longo das últimas décadas nas cidades, vilas e aldeias do interior, em estradas, distribuição de água e luz, saneamento básico, para agora ficarem sem utentes. Será duplicar custos ter de gastar agora muito mais para urbanizar os bairros satélites que se criam na periferia de Lisboa e do Porto. Manter as pessoas no interior do país, criar as condições para elas aí ficarem, é um dos melhores investimentos que o governo central pode fazer. Evita ter de gastar muito mais nas infra-estruturas que a deslocação populacional para o litoral obriga.
O significado político da inauguração da Faculdade de Ciências da Saúde da UBI é, assim, de sublinhar o mais possível. As medidas políticas envolvem riscos e não podem restringir-se a uma fundamentação técnica, como alguns economistas, certos fazedores de opinião, pretendem. Há desígnios nacionais a que se sujeitam as medidas a tomar e a levar a cabo. A coesão nacional, a defesa dos interesses dos portugueses, da sua identidade, cultura, o desenvolvimento equilibrado de todo o território nacional, a formação científica dos cidadãos, são desígnios condutores das políticas governamentais. José Sócrates foi político, no melhor sentido do termo, de servidor da coisa pública, por lutar por esses desígnios, corporizados no dia 30 de Abril de 2006 na inauguração do edifício da Faculdade de Ciências da Saúde.
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