Banco Alimentar Contra a Fome
Mãos que ajudam

Em comum têm o gosto em ajudar o seu semelhante e a preocupação pelo bem-estar de todas as pessoas. Mas o que move, afinal, e cada vez mais, todos estes voluntários nas diversas campanhas do Banco Alimentar Contra a Fome?


Por José Miguel Reis

Todo o trabalho de recolha e armazenagem dos alimentos é feito por voluntários

Foi pelo grupo católico “Génesis”, do qual fazia parte, que Ana Sofia Lunet tomou contacto com a causa do Banco Alimentar Contra a Fome. Já lá vai um ano. Esta é a terceira campanha consecutiva para a jovem universitária que, aos 23 anos e a frequentar o quarto ano do curso de Bioquímica na Universidade da Beira Interior (UBI), alia os estudos com várias tarefas solidárias. “Muito devo à professora Ana Gouveia, da UBI, que me apresentou esta iniciativa. Aderi porque gosto de ajudar, e se não formos nós, os jovens, a apoiar estas causas, não são os mais velhos que se disponibilizam”, ironiza, acrescentando que estes “têm mais em que pensar!”. O sorriso tímido não consegue esconder o enorme coração desta jovem de Viseu, para quem o mais importante é uma urgente mudança de mentalidades: “Os pais devem obrigar os filhos a sair de casa mais cedo, para ganharem mais responsabilidade. É isto que falta a muitos jovens, para além de uma maior força de vontade em ajudar o outro”, diz. E continua: “Ser solidário é isso mesmo, ajudar os outros sem qualquer contrapartida.” Pela frente estão ainda três horas de trabalho. Um “trabalho” que lhe dá muito prazer. “No final saio cansada, mais psicológica que fisicamente. Mas sinto-me realizada.” Despede-se com um sorriso. O mesmo com que aborda todos aqueles a quem estende, amavelmente, um saco alusivo à campanha.
Todos os anos, a plataforma solidária do Banco Alimentar Contra a Fome leva a cabo duas campanhas, uma no primeiro fim-de-semana de Maio e outra no primeiro fim-de-semana de Dezembro. Na região há mais de cinco anos, o Banco Alimentar Cova da Beira apoia mais de mil famílias com géneros alimentícios angariados nos diversos hiper e supermercados que aderem a esta causa. Arroz, massas, óleo, azeite, salsichas, atum… Produtos não perecíveis que permitem um regular abastecimento a estas famílias mais carenciadas da zona.
No passado fim-de-semana, 6 e 7 de Maio, foram muitos os que contribuíram para esta causa. O objectivo era claro: bater o recorde de mais de quarenta toneladas conseguido na campanha anterior, em Dezembro do ano passado. “E acredito que conseguiremos um novo recorde e ajudar ainda mais famílias.” Isabel Pinto é das mais antigas voluntárias do Banco Alimentar na região. Neste projecto desde o primeiro minuto, assegura que é um trabalho cansativo, mas há algo que compensa tudo isso: “Saber que daqui a dois ou três dias vai haver comida nas mesas de muitas famílias. E que alguém vai ser mais feliz. É triste não ter o que comer”, salienta, com a voz visivelmente embargada. O escutismo foi, sem dúvida, uma mais valia na opção pelo voluntariado. “Custa-me ver as pessoas passarem ao lado destas causas. Infelizmente, vivemos numa sociedade cada vez mais individualista e egoísta”, refere a voluntária. E confirma a existência de verdadeiras dificuldades na região, mesmo entre a comunidade estudantil: “Trabalho nos serviços sociais da Universidade e, acredite, existem muitos alunos que passam por verdadeiras dores de cabeça financeiras. E, mesmo assim, são esses os que mais contribuem”, conclui.



Objectivo: ajudar o próximo

Não são universitários, mas para lá caminham. Daniela e Ana têm 17 anos, João tem 19 anos e é a sexta campanha que faz. Estudam na Escola Frei Heitor Pinto, na Covilhã, e frequentam o 12º ano. Todos aderiram por influência do grupo de amigos, também eles voluntários do banco Alimentar Contra a Fome. “Aderi porque o grupo era divertido e porque gosto de ajudar o próximo. Quero tentar desfazer a ideia que os jovens só se preocupam com coisas banais”, destaca Ana, logo interrompida pela amiga Daniela: “Os jovens de hoje são muito materialistas, mas existem alguns que gostam de ajudar”. E são maioritariamente os jovens até aos trinta anos os que mais facilmente aderem a esta iniciativa. Disponibilizam quatro horas do seu fim-de-semana para apoiar uma causa nobre. “Gostaria que todas as pessoas sentissem, uma vez na vida, as dificuldades por que passam muitas famílias. Pode ser que, assim, contribuam mais para esta verdadeira causa solidária”, assevera João. Pretendem continuar nos próximos anos, apesar de se mostrarem desiludidos na actual situação moral da população. “Solidariedade?... Mas ainda existe essa palavra?”, dispara Ana, em final de conversa.
Mais de 580 estabelecimentos comerciais de todo o país participaram nesta acção. Ao todo, são mais de mil as instituições apoiadas por esta iniciativa, que ajudam mais de mil de 15 mil pessoas em todo o país. O Banco Alimentar Contra a Fome é, sem dúvida, o anjo da guarda de muitas famílias portuguesas, uma acção que já lhe valeu muitos prémios e menções honrosas no campo do trabalho social. E o objectivo traçado foi alcançado: mais de mil toneladas foram recolhidas em todo o país (não foi possível apurar dados específicos da região até ao fecho desta edição), o que contribuiu para um aumento significativo das ajudas em comparação com a campanha passada.
Finda esta primeira “luta”, é tempo de canalizar todos estes produtos para as instituições visadas. O trabalho ainda mal começou. Há muito para arrumar, muito para contar, muito ainda para ajudar. Tudo para o bem-estar de todos. “Quem me diz se não serei eu, um dia, a precisar, desta preciosa ajuda?”, reitera Rui Rodrigues, 26 anos, enquanto despe a camisola identificativa do Banco Alimentar. A “missão”, como a de todos os voluntários, está cumprida.