António Fidalgo falou sobre a "falácia da visibilidade"
VII Lusocom
Comunicação na lusofonia

Mais de trezentos investigadores oriundos de Espanha, Portugal, Brasil, Angola, Moçambique e Timor-Leste reuniram-se em Santiago de Compostela para a realização do VII Lusocom. A UBI fez-se representar por vários docentes do Departamento de Comunicação e Artes. Dois dias de trabalhos onde foram apresentadas as mais recentes investigações na área.


Por Eduardo Alves


“Hoje as pessoas são o que são pela criação de uma imagem através da visibilidade mediática”. A questão foi levantada por António Fidalgo , docente do Departamento de Comunicação e Artes (DCA) da UBI, que participou no painel que antecedeu a sessão de encerramento do Lusocom – VII Congresso Internacional da Comunicación Lusófona. A iniciativa teve lugar nos dias 21 e 22 de Abril, em Santiago de Compostela. Tendo como pano de fundo o tema “Visibilidade, estratégias identitárias e democracia”, Fidalgo dissertou sobre a falácia da visibilidade que contrapôs à obscuridade. “A visibilidade mediática é uma representação da democracia, mas hoje há representação a mais”, sublinhou o professor catedrático. A proposta de António Fidalgo vai no sentido da reserva à visibilidade pública, “procurar a obscuridade do ponto de vista estratégico, até porque hoje, a obscuridade aguça o apetite dos media”.
Ao longo de dois dias, mais de trezentos investigadores de Espanha, Portugal, Brasil, Angola, Moçambique e Timor-leste, analisaram as tendências da comunicação. A UBI fez-se representar por vários docentes do DCA. Para além de António Fidalgo , marcaram presença, nas várias sessões temáticas, Anabela Gradim , Eduardo Camilo , Gisela Gonçalves, Ivone Ferreira , João Canavilhas , João Carlos Correia , Paulo Serra , e os bolseiros Catarina Rodrigues e José Ricardo Carvalheiro.




Tendências do webjornalismo

O webjornalismo foi a temática abordada por João Canavilhas

O jornalismo on-line foi um dos temas em destaque. “A web veio revolucionar a forma como os indivíduos comunicam, acedem à informação e se tornam eles próprios produtores de informação”, lembra Anabela Gradim. A propósito das mutações introduzidas no jornalismo pelas novas tecnologias, a docente falou sobre a profissão de jornalista e alguns equívocos sobre a dissolução do quarto poder. “Sabemos que o panorama da comunicação está a mudar, mas não sabemos ainda nem exactamente como, nem para onde se dirige”, sublinha.
O webjornalismo foi também o tema abordado por João Canavilhas. O docente debruçou o seu estudo sobre a “pirâmide invertida”, uma técnica utilizada para a redacção de notícias que consiste em colocar a informação mais importante no início e a menos importante do final. Segundo o docente, “alguns dos pressupostos que levaram os jornalistas a adoptar esta técnica de redacção no jornalismo impresso deixam de fazer sentido devido às características da web ”, onde não existem limites de espaço. Canavilhas propõe assim a “pirâmide deitada, uma técnica libertadora para utilizadores, mas também para os jornalistas”. Para o docente, “se o utilizador tem a possibilidade de navegar dentro da notícia, fazendo uma leitura pessoal, o jornalista tem ao seu dispor um conjunto de recursos estilísticos que, em conjunto com novos conteúdos multimédia, permitem reinventar o webjornalismo em cada nova notícia”.


Olhares sobre a blogosfera

O fenómeno dos blogues foi também o objecto de análise escolhido por vários investigadores que participaram no congresso. “Num momento em que, graças a tecnologias como os blogues, cada um pode ser, simultaneamente, um “autor” e o seu próprio “editor”, em que os tradicionais mecanismos de selecção e filtragem do discurso deixaram de existir, em que bases assenta a credibilidade ou autoridade?” Esta foi a questão lançada por Paulo Serra. Para conseguir uma resposta, o docente partiu da análise quer de alguns blogues portugueses, quer de alguns inquéritos de opinião já realizados sobre o tema. Serra lembrou as características da retórica aristotélica e a importância atribuída à credibilidade do orador, tentando depois adaptar algumas dessas ideias às novas formas de comunicar.
A blogosfera foi também o tema abordado por Catarina Rodrigues. A bolseira de investigação acredita que com estas ferramentas estamos perante “novas formas de apresentar a identidade e a subjectividade do autor e somos confrontados com novas forma de mediação entre o público e o privado”. Através destas ferramentas contam-se “estórias” e assiste-se ao regresso não apenas da opinião, mas também da sátira e de uma certa imaginação literária que fazia parte do jornalismo antes da industrialização. Dizendo que muitos blogues constituem novas aparições do eu no espaço público, Catarina Rodrigues sublinha ainda que “há muito narcisismo na blogosfera, mas há também muitos espaços criativos que de outra forma não seriam conhecidos”.


Relações Públicas e Publicidade

Anabela Gradim (à esquerda) e Ivone Ferreira (à direita), ambas docentes da UBI, participaram no congresso

A investigação de Ivone Ferreira procurou entender a forma como o discurso publicitário, enquanto discurso persuasivo, opera através da imagem televisiva. Esta comunicação resultou de um trabalho de investigação desenvolvido ao longo de um semestre na cadeira de Retórica por alunos do 2º ano de Filosofia da UBI. A docente contou com a colaboração dos alunos Ângelo Milhano, Susana Assunção, Márcio Meruje, Susana Araújo, Andreia Cairrão e Fabiana Aires. “Se é verdade que a sociedade ocidental se apresenta como descendente das sociedades grega e judaica, também é verdade que o mundo em que vivemos operou uma ruptura com o seu passado ao introduzir media visuais, que comunicam por imagens e transformam tudo em imagens”, explica a docente, acrescentando que “os meios de comunicação visuais facilitaram o trabalho ao orador, ao proporcionar que seja possível apresentar, ao vivo e a cores, o objecto que em épocas anteriores, só podia ser imaginado”. Depois de realizarem inquéritos à população estudantil da UBI, os autores deste trabalho reconheceram “alguma fadiga, provocada por tantos estímulos visuais quando estes têm intuitos comerciais, sendo que permanece na mente a imagem, o slogan, mas poucas vezes o nome do produto”. Ainda assim, a televisão continua a ser o meio de comunicação informativo de eleição para os estudantes universitários da Covilhã.
A ética das Relações Públicas foi o tema abordado por Gisela Gonçalves. A docente falou da dicotomia velha/nova ou má/boa persuasão e lembrou que um número significativo de críticos tem argumentado que as relações públicas fazem propaganda ao promoverem interesses corporativos e comerciais baseados em valores sociais. Gisela Gonçalves lançou por isso a questão: “será que a ética subjacente ao modelo simétrico consegue salvar as relações públicas de toda a conotação pejorativa?”
Sistematizar as práticas de comunicação corporativa que são desenvolvidas por algumas instituições da administração pública, concretamente os municípios, foi o objectivo de Eduardo Camilo. O docente referiu a necessidade de se conceberem modelos de comunicação e a importância de discriminar categorias de actividade comunicacional que estão subjacentes a qualquer organismo da administração pública local e que são resultantes da interacção de um conjunto específico de parâmetros.


Imprensa escrita

“A imprensa regional e comunicação política” foi o tema da comunicação apresentada por João Carlos Correia que se debruçou no caso concreto das eleições autárquicas de 2005. O docente analisou a imprensa semanal dos distritos da Guarda e de Castelo Branco, durante as duas semanas que coincidiram com a campanha eleitoral para as últimas eleições autárquicas. “O subsistema dos mass media destas regiões apresenta uma escassa autonomia capaz de originar critérios específicos de observação que possibilitem a detecção e tematização de problemas a serem abordados no espaço público e no sistema político”, explica.
José Ricardo Carvalheiro analisou a presença dos imigrantes portugueses na imprensa francesa. Para a realização deste estudo José Ricardo baseou-se em análises de conteúdo e de discurso a dois jornais diários, o Le Monde e o Le Parisien . “Os resultados apontam para um processo de desetnicização de baixo status , cujo impacto se faz sentir nas estratégias simbólicas dos descendentes. Tal cenário, junto com a escassez de fluxos da cultura mediática portuguesa em França, torna difícil conciliar o processo de desetnicização com a existência de uma identidade cultural que constitua um recurso afirmativo para os jovens de origem portuguesa”, refere.



Timor-Leste pela primeira vez no Lusocom

O congresso contou com a presença de mais de 300 investigadores

Pela primeira vez, um representante de Timor-Leste marcou presença no Lusocom. António Ramos, jornalista timorense, formado na Universidade de Coimbra, realçou alguns pontos referentes à lusofonia. Ramos destacou o papel da imprensa na construção do estado timorense, salientando a dificuldade em analisar se, neste país, a imprensa é aliada do poder ou um contra-poder.
Luis Enrique Zaqueu traçou o cenário jornalístico actual em Moçambique. “Em 14 anos apareceram mais de 170 órgãos de comunicação social neste país, o que não significa qualidade”. Para Luis Zaqueu é necessário “criar uma democracia útil e isso só se consegue através de órgãos de comunicação social que eduquem os cidadãos”.
Margarida Ledo, da organização do Lusocom, traçou uma conclusão muito positiva do encontro que “serviu para dar a conhecer a todos a dimensão da lusofonia e também o trabalho desenvolvido em termos de investigação e de projectos em curso”.
A Faculdade de Ciências da Informação da capital galega, obra do arquitecto Álvaro Siza Vieira, merecedora do prémio Secil Arquitectura 2000, acolheu assim a iniciativa que reuniu investigadores do espaço lusófono. A par deste evento decorreu a Feira de Produtos Audiovisuais “Viaxes na Lusofonia”.