António Fidalgo

Avaliar a avaliação da avaliação das Universidades


Há 15 dias Mariano Gago, Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, rompeu o grande silêncio para comunicar numa entrevista à Rádio Renascença e ao Jornal Público que o Governo decidiu solicitar à OCDE a avaliação do ensino superior português e que, para lá disso, havia pedido à Agência Europeia de Acreditação para fazer uma avaliação da prática seguida durante os últimos dez anos da avaliação dos cursos. Ou seja, pediu que se fizesse uma avaliação da avaliação realizada nos dois ciclos de avaliação até agora efectuados. Como se não bastasse, o Sr Ministro solicitou ainda à Associação Europeia das Universidades que se disponibilizasse a fazer avaliações institucionais a pedido das próprias instituições, oferecendo para tal financiamento do Estado. Resumindo, o Governo solicitou à OCDE, pediu a uma Agência Europeia e solicitou a outra Associação Europeia para avaliarem o ensino superior português e a avaliação que por cá se faz do mesmo. Tudo isto para quê? Para que o estudante saiba que o seu ensino superior é reconhecido internacionalmente.

Mariano Gago afirmou-se no Governo de Guterres como o introdutor das avaliações internacionais dos centros de investigação portugueses. O zelo foi tão grande que houve um painel de avaliação, o de ciências da comunicação, constituído exclusivamente por professores estrangeiros, sem que algum deles entendesse o português falado ou escrito, língua em que se encontra a quase totalidade da produção científica da área em apreço. Pelos vistos, a confiança do Ministro na avaliação por estrangeiros mantém-se e pretende, agora que ficou com o pelouro do ensino superior, alargá-lo também às instituições e aos cursos. Nós fazemos e estrangeiros avaliam, e se nós avaliamos os estrangeiros avaliam a nossa avaliação. Mas já que somos nós, os nacionais, a pagar essas avaliações, cabe-nos o dever de avaliá-las, por sua vez, no final. Ou será que pagamos para alijarmos de todo a responsabilidade da avaliação, tanto a inicial como a final? O modo de proceder do Ministro Mariano Gago parece indicar que o veredicto final cabe aos estrangeiros, e que é sem apelo e agravo.

Existe em Portugal um Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior (CNAVES), sob cuja tutela se levaram a cabo dois ciclos de avaliação dos cursos superiores. O esforço de elaboração dos relatórios de auto-avaliação dentro das instituições foi tremendo, houve um grande trabalho de avaliação externa, produziram-se relatórios de avaliação externa individuais e relatórios síntese, houve classificações, produziram-se contraditórios. Quem quiser pode consultar na Internet esses Relatórios de Avaliação Externa, os contraditórios dos cursos avaliados e fazer a sua avaliação de todo esse processo. Há algo mais claro do que isto? De que poder se revestem as avaliações internacionais para estarem acima do escrutínio e da avaliação dos nacionais? Só um sentimento de inferioridade pode tornar inquestionável uma avaliação internacional.

Há uma coisa que qualquer político, qualquer cientista e qualquer académico deve entender. A responsabilidade é inalienável e uma avaliação é acima de tudo um acto de responsabilidade. Não há dinheiro que possa comprar uma avaliação final, isso depende de uma decisão. De contrário, entra-se numa iteração ao infinito, a avaliação da avaliação da avaliação.