António Fidalgo

Pensar as autárquicas


As autarquias vivem da personalidade dos autarcas. Não falemos dos casos badalados nas televisões, sobretudo dos autarcas com processos pendentes na justiça. Falemos dos autarcas daqui, da região que é a nossa, a da Beira Interior.

Joaquim Morão em Castelo Branco, Manuel Frexes no Fundão e Carlos Pinto na Covilhã, recandidatam-se e têm – fora surpresas, que de tão surpreendentes ninguém equaciona – a vitória nas mãos. Depois do longo domínio e da queda abrupta de Abílio Curto, a Guarda procura o seu autarca. Mas o incontestável é que os concelhos, o seu desenvolvimento e até a sua presença política e mediática no todo nacional, dependem da actuação dos seus autarcas.

Não se deve esquecer que muito do desenvolvimento de Castelo Branco na década de oitenta e no início de noventa se deve à acção de César Vila Franca que apostou na zona industrial, vendendo o metro quadrado a um preço simbólico, alguns anos antes de outras autarquias por esse país fora seguirem o exemplo. Joaquim Morão que era em Idanha-a-Nova o autarca modelo do PS, e que curiosamente se afirmou como tal durante as maiorias governamentais de Cavaco Silva, mudou-se em 1997 para Castelo Branco e aí deu novo alento à política de Vila Franca.

Manuel Frexes apanhou o Fundão há quatro anos mesmo no fundo e deu-lhe uma dinâmica impressionante ao longo do mandato. O marasmo que foi o Fundão durante mais de uma década, vendo os comboios passar de Castelo Branco para a Covilhã e vice-versa, desapareceu e hoje o Fundão ombreia em obra, no âmbito das infra-estruturas, e nas iniciativas políticas e culturais com os concelhos que o delimitam a sul e a norte.

Carlos Pinto é simplesmente o autarca do renascimento da Covilhã pós crise dos anos oitenta. Falar-se-á da Covilhã do antes e do depois de Carlos Pinto. Que tem esta Covilhã a ver com a cidade dos finais dos anos oitenta? Então tudo encerrava, agora inauguram-se parques de ciência e tecnologia, centros comerciais, uma faculdade de medicina.

Mais uma vez, os nossos concelhos vivem da dedicação, do empenhamento e da paixão dos seus autarcas, em particular dos presidentes de câmara. Basta recordar o Fundão de toda a década de noventa, a Covilhã de 93 a 97, para perceber como a ausência de um presidente de câmara dinâmico pode significar a paragem do desenvolvimento. Certamente que não bastam os presidentes de câmara. Não houvesse o investimento do governo central nas rodovias, nomeadamente na A23, no gás natural, nos novos hospitais, no ensino superior, e os melhores esforços não chegariam. Mas se a acção dos autarcas não é condição suficiente, ela é extremamente necessária.

Levanta-se todavia um problema político grave na presença dominante dos presidentes de câmara referidos. Essa presença tende a tornar-se dominadora e a afogar a oposição. As candidaturas das oposições são fracas, muito fracas mesmo. Como que se cria um deserto político à volta desses presidentes de câmara. Se é verdade que é de reconhecer e de louvar a acção feita, a forma como o regime autárquico funciona é altamente desmotivante para a oposição. Veja-se aliás o que acontece com as juntas de freguesia. Estas tendem a alinhar com o poder instalado na câmara. Escusado será dizer que não é saudável. O debate próprio dos regimes democráticos, a luta política, a cultura de discussão, são factores cruciais e constituintes de uma vivência cívica plena e de um desenvolvimento equilibrado. Não são simples meios, não se pretende o desenvolvimento pelo desenvolvimento, mas são fins em si mesmos, objectivos a atingir pelo seu mérito intrínseco.

Porque temos de levantar a questão sobre a ausência de opositores políticos à altura dos actuais autarcas. As oposições lançam figuras de segunda linha dentro dos partidos contra os autarcas que se recandidatam, e os de primeira linha resguardam-se para o dia do abandono destes, por quaisquer motivos que sejam.

Pelo que fica dito é de saudar o limite de mandatos dos autarcas, que a nova lei impõe. A política vive da participação do maior número, e aí os partidos terão de investir no rejuvenescimento e na formação de quadros, e não ficar fiados e reféns dos autarcas actuais. Pena é que essa limitação de mandatos só entre em vigor no próximo ano e não tenha efeito para estas eleições.