António Fidalgo
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Dura Ciência
Neste número do Urbi
dá-se relevo à física, com a entrevista
ao Prof. João da Providência, Presidente
do Departamento de Física, e com o artigo de opinião
do Prof. António Tomé sobre as alterações
climáticas. A celebração dos 100
anos da teoria da relatividade, elaborada por Einstein
em 1905, justificaria só por si esse relevo, mas
o furacão Katrina, que há uma semana levou
a destruição e a miséria aos estados
norte-americanos do Golfo do México, e a prolongada
e extrema seca em Portugal tornam mais pertinente realçar
a importância da investigação e do
ensino da física numa universidade.
Hoje as chamadas ciências exactas ou duras atraem
pouco os estudantes, não só os portugueses,
mas os estudantes em geral pela Europa fora. Os piores
resultados que se verificam nos exames nacionais no fim
do ensino secundário são os de matemática
e de física. As razões para a alergia da
maioria dos jovens, que não todos, são de
ordem vária, desde o facilitismo próprio
de uma sociedade de consumo ao experimentalismo pedagógico
que imperou nas últimas décadas. No entanto,
será bom ter presente que sobretudo desde Newton
a física foi vista como a ciência modelo
de todas as ciências e que o século XX foi
em grande medida marcado pelos avanços da investigação
na física e pelos correspondentes sucessos tecnológicos,
teoria da relatividade, física quântica,
cisão do átomo, energia nuclear, conquista
do espaço, tecnologias da informação
e telecomunicações, para enumerar apenas
os mais conhecidos.
Desde o início que a UBI quis ser uma universidade
por inteiro, com fundamentos sólidos, apostando
forte nas ciências de base, as ciências duras,
matemática, física e química. Ora
se o financiamento das universidades é feito em
Portugal com base na captação dos alunos,
e portanto sujeito às modas de cursos, a verdade
é que há saberes universitários que
não podem ser encarados e financiados ao sabor
do mercado, mas apoiados pelo valor intrínseco
que constituem e representam para a universidade e para
o país.
Sem dúvida que o problema verdadeiramente grave
de Portugal é a baixa formação profissional,
escolar e científica da população.
Isso foi entendido pelas autoridades nacionais e pelas
das Comunidades Europeias, agora União Europeia.
Uma parte significativa dos fundos que Portugal recebeu
nos últimos 20 anos foi destinada à formação.
Sindicatos, autarquias, associações de todo
o tipo candidataram-se e receberam milhões de contos
para a formação. Os resultados não
foram famosos, porque se quis fazer omeletes sem ovos:
dar formação profissional sem uma base escolar
e científica. A qualificação profissional
da população portuguesa passa forçosamente,
quer se queira quer não, por uma formação
escolar séria e por uma formação
científica sólida.
Neste momento temos a iniciativa do Governo de José
Sócrates de avançar com um Plano Tecnológico
para incrementar a produtividade nacional, para retirar
de vez Portugal da cauda da Europa em termos de qualificação
profissional da sua população. Voltamos
ao mesmo. Ou se pretende de facto melhorar essa qualificação
através de medidas a valer: melhor formação
escolar e científica, ou se faz simplesmente para
“inglês ver”: dando mais dinheiro a
cursos profissionais de esquina, investindo em computadores
que servem para jogar, conectando-os em rede para ir buscar
os últimos DVDs e para fazer chat com amigos e
conhecidos durante as horas de trabalho.
Por mais importante que seja para a população
portuguesa ter acesso às novas tecnologias, nem
que seja para seguir as catástrofes naturais, de
outras partes do globo e as próprias, como a seca
e os incêndios, muito mais importante é aprender
o “b a bá” das leis da física
que explicam os fenómenos naturais, ajudam a prever
os fenómenos extraordinários e a precaver-se
das catástrofes.
Dura ciência a física é verdade. É
altura de acabar com as ciências divertidas, como
se se aprendesse a matemática e a física
a brincar, ao jeito da “Rua Sésamo”.
Mas também aqui a física é modelo
das outras ciências. O conhecimento científico
é exigente, obriga a estudo, a concentração.
Saber do mundo, mudar o mundo, conquistar o mundo, tem
como condição saber as leis que regem o
mundo. A física é esse conhecimento aprofundado
do mundo, da natureza e do cosmos.
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