Anabela Gradim

Crise da água


Todos os dias morrem cerca de 6 mil pessoas, maioritariamente crianças com menos de 5 anos, devido a doenças relacionadas com o consumo de água imprópria; ou seja, 250 por hora, quatro por minuto. Segundo um relatório da UNESCO estima-se que mais de dois biliões de pessoas são afectadas por escassez de água em mais de 40 países; 1,1 biliões não dispõem de água suficiente para beber, e 2,4 biliões para manter condições sanitárias adequadas.

A manter-se este ritmo, a UNESCO prevê que em 2050 uma em cada quatro pessoas viva em países afectados por falta de água potável. A situação dos países em desenvolvimento é preocupante. Muitos não têm capacidade de fornecer o mínimo de água potável per capita aos seus habitantes, e presentemente metade da população desses países sofrem com falta de água de qualidade.

Igualmente preocupante é o facto de muitos recursos hídricos serem partilhados por duas ou mais nações. Existem presentemente 263 rios partilhados por dois ou mais países, que albergam cerca de 40% da população do globo.

A contaminação dos recursos existentes, por outro lado, parece imparável. «Mesmo quando existe água suficiente para as necessidades presentes, muitos rios, lagos e lençóis de água estão cada vez mais poluídos. As fontes mais frequentes de poluição são os desperdícios humanos (dois milhões de toneladas/dia depositados em cursos de água), poluição industrial e química; e poluição agrícola, pesticidas e fertilizantes. Estima-se que metade da população dos países em vias de desenvolvimento está exposta a fontes de água poluídas que aumentam a incidência de doenças. Essas formas de poluição incluem coliformes fecais, substâncias industriais orgânicas, substâncias ácidas, metais pesados da indústria, amónia, nitratos e fosfatos da agricultura, resíduos de pesticidas (…)». O aumento dos níveis de poluição dos recursos hídricos e o seu reflexo nas condições de vida das populações é particularmente preocupante na Ásia e na Índia.

É evidente que neste quadro mundial, a situação de Portugal é muito razoável, e se neste Verão se fala tanto de água, isso deve-se à seca e aos incêndios (o desaparecimento de floresta tem sérios reflexos no ciclo da água), não a uma preocupação permanente e de longo prazo com os recursos hídricos. Talvez fosse tempo, aproveitando esta infeliz oportunidade trazida pela falta de chuva, de tentar alterar permanentemente alguns hábitos perdulários – não só enquanto vigoram as campanhas publicitárias.

A água é indispensável à viabilidade de todos os ecossistemas. Dela dependem não só a agricultura, ou o bem estar e a saúde das populações, mas, literalmente, a totalidade da vida na terra. Sem água, nem as baratas escapariam; e quando estiver terminada a leitura destas linhas, mais quatro pessoas terão perecido. Tem a certeza que poupou hoje tudo quanto podia?