Entrevista
a Luís Carrilho Gonçalves, vice-reitor
da UBI
“Existe um comodismo
no que diz respeito à movimentação
de estudantes”
No seu terceiro
mandato como vice-reitor, Luís Carrilho Gonçalves,
analisa algumas transformações verificadas
na UBI. Ligado ao Ensino Superior na região,
desde sempre, este homem das engenharias começa
por dizer que a UBI é uma universidade modelo,
“uma aposta que vingou”. Luís Carrilho
salienta o facto de todas as licenciaturas da UBI terem
sido avaliadas por comissões externas e também
internamente. O vice-reitor justifica esta opção
com a prática de uma “cultura de qualidade”.
Actualmente trabalha na uniformização
dos calendários escolares e está também
ligado à aplicação do Processo
de Bolonha, à renovação das competências
dos Serviços Académicos e aos programas
de intercâmbio que têm cada vez mais interessados.
No futuro vê a UBI como uma escola exigente e
por isso “muito concorrida”.
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Por Catarina
Rodrigues e Eduardo Alves
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Segundo Luís Carrilho "temos de maximizar
o período lectivo"
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Urbi et Orbi
- Quais as principais funções que desempenha
no cargo de vice-reitor?
Luís Carrilho - Desde o primeiro mandato
como vice-reitor, este é já o terceiro,
a área que me está mais afecta é
a dos programas internacionais, quer o Sócrates,
quer o Erasmus. Neste último mandato tenho estado
também a tratar da questão dos Serviços
Académicos, que julgamos ainda não estarem
conveniente e academicamente organizados para os serviços
a que estão destinados. Estou também ligado
à questão da avaliação dos
cursos. Todas as licenciaturas foram avaliadas por organismos
exteriores, o que levou a que também nós,
internamente, promovêssemos a nossa avaliação.
U@O - Que resultados têm sido obtidos nesse
âmbito?
L. C. - O balanço é muito positivo.
Temos vindo a privilegiar uma avaliação
sistemática de tudo o que se faz na instituição
para depois, os resultados e as conclusões dessas
mesmas análises passarem para a prática.
Esta é uma opção tomada no sentido
de se praticar aqui uma cultura de qualidade, e para isso
é preciso termos indicadores. É preciso
que os alunos avaliem os professores e o seu próprio
curso. A UBI neste ponto também já deu mais
um passo em frente no sentido de introduzir os questionários
on-line, que desde o passado ano, têm de ser preenchidos
pelo aluno para que este tenha acesso à sua ficha
de identificação e ao seu perfil. Nesta
altura, o índice de preenchimento é muito
bom, chegando aos 3 mil alunos. Com este preenchimento
on-line, os docentes têm um acesso imediato à
sua avaliação e podem analisar e corrigir
o seu desempenho. Com estes inquéritos e avaliações
temos verificado que os alunos são muito conscientes.
Se algo está mal é apontado pela maioria
e de facto há algo ali a corrigir.
U @ O - A UBI tem vindo a apostar cada vez mais
nos programas de intercâmbio de alunos. Que vantagens
encontra a instituição nestas acções?
L. C. - Fomos das primeiras Universidades a entrar
no Programa Sócrates que era feito através
de Projectos Integrados de Colaboração.
A princípio isso era algo que se passava mais ao
nível dos docentes. Depois a iniciativa foi alargada
aos alunos. Com o aparecimento do Erasmus e do Sócrates,
surgem também programas de intercâmbio que
contemplam bolsas de apoio e protocolos entre as instituições.
Ainda assim, de início, os estudantes estavam muito
receosos em arriscar nestas iniciativas. Uns por causa
da língua, outros porque eventualmente, perderiam
algum tempo na finalização da sua licenciatura,
enfim, era muito complicado encontrar alunos dispostos
a ir passar algum tempo a universidades estrangeiras.
Mas depois surgem os mais aventureiros e esses quando
voltam e começam a relatar as suas experiências
e aventuras promovem um “contágio”
a todos os outros. Hoje em dia, temos de fazer uma selecção
dos alunos que vão integrar os programas de intercâmbio,
pois há muita procura. Este ano introduzimos uma
prova de inglês ou francês para servir de
selecção.
"Podemos considerar
a UBI uma Universidade modelo"
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"Fomos das primeiras Universidades a entrar
no Programa Sócrates"
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U@O - O Processo de Bolonha prevê mudanças
estruturais no Ensino Superior. Como está a UBI
a adaptar-se a essa transição?
L. C. - Neste momento temos também a Comissão
do Processo de Bolonha que tem vindo a reunir e a tentar
uniformizar o conhecimento sobre todo este processo. Eu
estou a analisar e a redigir documentos com base em agências
de acreditação de cursos a nível
europeu, desde projectos conjuntos que têm dado
algumas orientações sobre o que será
Bolonha. Sobre esta matéria decorreram já
três reuniões de alto nível entre
os vários ministros europeus com o intuito de saber
como estavam a ser implementadas as medidas previstas
no processo. Na última reunião, que ocorreu
em Maio, verificou-se que Portugal está muito atrasado
na passagem das medidas previstas nos documentos. Neste
momento já devíamos estar já a implementar
calendários escolares, sistemas de aprendizagem
centrados no aluno, etc.
U@O - É defensor de um calendário
escolar sequencial. Porquê?
L. C. - O período de interrupção
entre o ensino e a avaliação deve ser reduzido
ao mínimo. Se espaçarmos muito a aprendizagem
e a avaliação, o desempenho não vai
ser o mesmo, isto é algo que está provado.
A nível europeu estão estipuladas 1600 horas
de trabalho durante um ano lectivo, entre aulas, provas,
exames e outras actividades. Sou apologista de que devemos
maximizar o período lectivo. Se temos 16 ou 17
semanas de aulas e nesse período vamos ter de integrar
todos os processos relativos às licenciaturas,
então faz todo o sentido o calendário sequencial.
Este sistema dá mais eficácia ao Ensino
e ao aluno. Isto vem um pouco contra o que é praticado
no regime clássico e que foi algo “abandalhado”.
Veja-se que com o actual regime de avaliação
e calendarização de exames, o aluno pode
fazer exames a disciplinas que já não têm
grandes ligações sequenciais com o esquema
próprio do curso.
U@O - No próximo ano podem-se já
esperar mudanças na calendarização
das actividades lectivas?
L. C. - Sim, mas de forma gradual. Bolonha prevê
essas mudanças, no sentido de se aplicar uma avaliação
sequencial, mas as mudanças operadas neste domínio,
como muitas outras, terão de ser feitas com calma.
Neste momento temos três meses de exames, se no
próximo ano conseguirmos encurtar esse tempo para
dois meses e meio já é uma modificação,
ainda que os alunos não a sintam de forma grave.
É esse tipo de alterações que devemos
promover. No próximo ano, todas as áreas,
inclusivamente a das Artes vão ter o mesmo calendário
de exames. Essa é uma mudança, a uniformização
dos calendários. Posteriormente, vamos tentar encurtar
mais o período dos exames e outras actividades.
"Devemos maximizar o período lectivo" |
"No próximo ano, todas as áreas
vão ter o mesmo calendário de exames" |
U@O - As engenharias foram um pilar fundamental
na UBI desde a sua criação. Como vê
o estado desta área na actualidade? A nível
de equipamentos, corpo docente, saídas profissionais,
número de alunos….
L. C. - Esta Universidade é, por características
próprias, muito sensível, mas também
muito forte. Tem um corpo docente bem qualificado, um
campus que oferece condições muito boas
aos seus alunos, bons equipamentos informáticos
e outros pontos de relevo. Julgo que neste aspecto poderemos
mesmo considerar a UBI como uma Universidade modelo.
Precisamos de encontrar algumas soluções
e ajustes para a parte mais sensível que aqui compreende
a localização geográfica, que nos
afasta um pouco das regiões onde há mais
população. Outro aspecto importante prende-se
com a captação de alunos. Em Portugal existe
um comodismo no que diz respeito à movimentação
de estudantes e de pessoas. É muito mais difícil
resolver os problemas da falta de alunos nestas regiões
do que junto às grandes cidades. Contudo, estes
são pontos sensíveis, não fracos,
daí que tenham resolução.
U@O - Como se pode justificar o decréscimo
de alunos que tem ingressado em cursos de engenharias?
L. C. - Há pouco tempo li um artigo de
opinião onde se defendia que no Ensino Secundário
se deveriam ajudar mais os alunos a obterem boas notas.
Não digo o contrário. O problema do facilitismo
é que depois se regista o ingresso no Ensino Superior
de estudantes mal preparados e as Universidades também
não estão preparadas para este tipo de situações.
Daí que os ministérios em causa, as próprias
Universidades tenham de ponderar estes acontecimentos
e mudar algo. A fuga de alunos a que hoje se assiste na
área das engenharias é um “imitar
do mal”. Isto porque as pessoas sabem bem que a
estrutura social e a necessária alteração
desta apenas surge com pessoas ligadas a estas áreas.
U@O - E em particular, o exemplo de EPGI ou Engenharia
Têxtil?
L. C. - Estes cursos não estão
encerrados. Os alunos que estão a frequentá-los
vão terminar normalmente a sua licenciatura. Ainda
assim, ao estarmos a alimentar essas licenciaturas podem
surgir, de novo, falhas graves. Mas veja aqui o exemplo
do Politécnico de Castelo Branco que vai encerrar
uma licenciatura em Engenharia Florestal cujos licenciados
têm emprego certo. Num País como Portugal,
com necessidade de recursos humanos qualificados nesta
área, verifica-se assim mais um retrocesso.
U@O - Quais as medidas que a UBI pensa implementar
para atrair mais alunos?
L. C. - Apostamos em vários domínios,
mas para além da Internet e dos meios de divulgação
tradicionais, a UBI tem de apostar numa marca exterior
forte e muito própria. Uma imagem positiva e exigente
que já tem e que se deve manter. Cada vez mais,
as escolas são escolhidas de acordo com o seu grau
de exigência. Uma escola onde se trabalhe e onde
os alunos se sintam motivados, como na UBI, apresenta
muitas mais potencialidades. Deve apostar-se também
na diferença. O que é que um aluno que vem
estudar para a Covilhã pode ter a mais do que um
que estude em Lisboa? Boas condições de
vida, boas estruturas de apoio ao Ensino, equipamentos,
laboratórios bem apetrechados, uma cidade amena,
bons acessos e toda uma centralidade. Hoje, com a auto-estrada
a Covilhã fica a duas horas de Lisboa, a outras
tantas do Porto e de Coimbra, e muito próxima de
Salamanca, na vizinha Espanha.
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Luís Carlos
Carrilho Gonçalves nasceu no Soito, concelho
do Sabugal a 16 de Julho de 1951. Casado e pai
de dois filhos, reside agora na Covilhã,
localidade a que está ligado desde cedo,
sobretudo por laços profissionais.
O início nos estudos foi feito na aldeia
do concelho raiano onde o pai exercia medicina.
Com dez anos muda-se então de armas e bagagens
para o Liceu Nacional da Guarda. Este liceu, “na
época, um dos mais reputados do País”,
vai ser uma das principais marcas da sua vida
académica. Carrilho Gonçalves recorda
perfeitamente, a cidade da Guarda daquele tempo,
“das poucas no interior do País onde
existiam edifícios com mais de um andar”.
Os métodos de ensino e as pedagogias aplicadas
então “eram bem diferentes das actuais”.
Os professores “muito mais exigentes, mas
também conscientes de que os alunos tinham
de aprender verdadeiramente”. Aluno destacado,
começa por dispensar os exames, “pois
as notas conseguidas durante o ano davam para
esse privilégio”, e termina com 16
valores o Curso Geral dos Liceus. Opta então
pela carreira na área tecnológica.
Em 1969 ingressa no Instituto Superior Técnico
(IST), em Lisboa, no curso de Engenharia Mecânica,
onde depois segue o ramo de Termodinâmica
Aplicada. Quando fala na sua passagem pelo Ensino
Superior recorda “a época de efervescência
e convulsão” que se viveram naqueles
anos. Em 1969 “já o regime estava
em decadência e era através das Universidades
e dos seus alunos que se travavam grandes lutas
contra o fascismo”. Toda esta loucura que
mediou a Revolução dos Cravos fez
com que perdesse um semestre lectivo, não
por faltas, “antes pelo contrário”,
porque o IST, “como uma das escolas mais
reivindicativas, foi encerrado pelo polícia
durante esse tempo”.
Nos últimos anos da licenciatura desempenha
funções de monitor ajudando os professores
da instituição nas aulas dos alunos
dos primeiros anos. Esta função
vai depois conduzi-lo ao lugar de “assistente
eventual”, assim que Abril liberta o País
do regime. É já com este cargo e
ainda no IST que ganha o seu primeiro salário,
“3 mil e 500 escudos, o ordenado mínimo
da época”. Com esta quantia “comprei
uma aparelhagem, era algo de que gostava muito
na altura”, recorda entre risos.
O projecto de integrar o Instituto Politécnico
da Covilhã (IPC) surge através do
convite do então reitor Passos Morgado
e também do actual reitor, Santos Silva,
que já tinha sido colega de liceu. Um certo
desejo de “regresso às origens”
e a vontade de abraçar um projecto que
estava então a dar os primeiros passos
fazem com que Luís Carrilho aceite e convite
e entra no grupo de docentes do IPC.
Aqui colocava em prática todos os conhecimentos
que tinha então adquirido. Com a falta
de professores que se verifica então, um
pouco por todo o País e mais nesta região,
“leccionávamos cadeiras de diversas
áreas que não só as nossas.
Tudo aquilo que tínhamos aprendido durante
a licenciatura era aqui aplicado”. Mas o
primeiro grande desafio que lhe é proposto
na UBI vai no sentido de instalar e equipar os
laboratórios de Física. A esse ponto
acrescia o facto de estes espaços não
serem somente dedicados à Física,
pois tinham de servir também para as áreas
das engenharias. Depois de “um trabalho
muito árduo, quer ao nível do contacto
dos representantes dos equipamentos, quer a nível
orçamental, conseguimos montar laboratórios
que estavam a um nível superior aos do
Técnico de Lisboa e mesmo da Universidade
Nova”.
Ainda assim, por essa altura, meados dos anos
80, as directivas do Estado, para esta escola
eram muito restritas. Nunca se pensou que a UBI
chegasse ao que está hoje. Em 1981 concorreu
a uma bolsa da OTAN/NATO, para estudar fora do
País. Consegue também uma bolsa
da Junta Nacional de Investigação
Científica e Tecnológica (J NICT)
no Cranfield Institute of Technology, no Reino
Unido, onde obtêm os graus de “Master
of Science” e “Doctor of Philosophy”.
Torna-se assistente no Departamento de Física
do Instituto Universitário da Beira Interior,
em Outubro de 1984, passa a professor auxiliar
deste organismo e em Julho de 1995 chega a professor
associado já da Universidade da Beira Interior
(UBI). Pelo caminho, ainda tem tempo para assumir
a presidência da Comissão Instaladora
da Escola Superior de Tecnologia e Gestão
do Instituto Politécnico da Guarda, em
acumulação de funções
com a actividade de docente e presidente do Conselho
Científico da mesma instituição.
Prestou provas de agregação à
UBI a 3 de Junho de 2003. Passou, entre outros,
pelos cargos de presidente do Departamento de
Electromecânica e do Conselho Pedagógico.
Foi pró-reitor e é actualmente vice-reitor
da instituição.
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