Urbi@Orbi –
Como vice-reitor quais as principais funções
que desempenha?
Mário Raposo – Trabalho na área
das relações entre a Universidade e o exterior,
mas também na preparação de candidaturas
a projectos, na representação da UBI em
tudo o que são órgãos nacionais e
regionais. Outra das áreas onde estou também
envolvido, através deste cargo, é na avaliação
de vários cursos, feita a nível nacional.
Ainda como vice-reitor tenho também representação
no Senado. Gosto de referir o facto que me liga a este
órgão. Desde a criação do
Senado que faço parte deste. Primeiro como representante
dos professores assistentes, depois dos associados e,
por inerência, agora como vice-reitor.
U@O – A UBI tem vindo, nos últimos
tempos, a apostar no campo do empreendedorismo. Como explica
esta escolha?
M. R. – Uma área nova na qual temos
vindo a apostar é na do empreendedorismo. É
uma área que faz falta no País e nas próprias
Universidades. Em consonância com outros colegas,
temos vindo a introduzir cadeiras dessa área nos
vários cursos. Isto porque, consideramos que a
Universidade deve criar nos seus alunos um espírito
empreendedor. O empreendedorismo é uma temática
que extravasa os limites da Universidade. Mas é
aqui que se deve começar a desenvolver o empreendedorismo
de base tecnológica, ou seja, estimular nos alunos
e investigadores, com base nos trabalhos e conhecimentos
que estes adquirirem, que formem empresas. Empresas essas
que se baseiam na competitividade e na liderança
de mercado. Veja-se o caso do Parkurbis, que vai ser inaugurado
em Julho, onde se encontra já um conjunto de empresas
que são resultado de apostas por parte de alunos
e investigadores da Universidade.
U@O – Os jovens licenciados mostram-se pessoas
com espírito criativo e activo?
M. R. – As Universidades desenvolvem nos
seus alunos, não só um conjunto de competências
científicas e profissionais que lhes permitem encarar
de outra forma o mercado de trabalho, mas também,
um conjunto de conhecimentos que desenvolvem nesses mesmos
alunos um espírito crítico para que tomem
iniciativas. Há que aproveitar todos esses factores
e levar a que se dêem passos que de outra forma
jamais seriam dados. Há que espicaçar as
mentes. No caso do empreendedorismo, não significa
que todos os alunos tenham de criar uma empresa, mas podem
e devem tornar-se pessoas mais empreendedoras. As Universidades,
hoje em dia, para além do papel fundamental de
ensinar e investigar têm também o papel de
serem empreendedoras e passar esse espírito aos
seus alunos.
"A ligação
Universidade/empresa é cada vez mais importante"
|
"A UBI soube dar às empresas muito daquilo
que elas precisavam"
|
U@O – E estes estão a adaptar-se
bem?
M. R. – É um processo algo difícil.
Este tipo de pensamento deve ser induzido mais cedo, nos
graus de ensino precedentes do Superior. Mas, ainda assim,
continua a caber à Universidade estimular nos alunos
um espírito empreendedor. No que respeita às
cadeiras criadas em alguns cursos neste âmbito,
tem havido uma boa abertura por parte dos estudantes.
Estes gostam das matérias e respondem ao estudo
de melhor forma. Têm também participado em
alguns concursos, como o Concurso Nacional de Empreendedorismo,
em que 19 por cento dos projectos pertencia a alunos da
UBI. Das 20 melhores ideias seleccionadas no final, há
elementos da UBI em quatro.
U@O – A UBI é parceira no projecto
do Parkurbis. Qual o papel que espera ver desempenhado
por esta estrutura?
M. R. – A função deste espaço
é fazer a ponte entre o mundo académico
e o mundo empresarial. Em grande parte dos casos, empresas
e Universidade andam de costas voltadas. Isto porque a
Universidade tem uma determinada característica,
que é a valorização do conhecimento
científico, do conhecimento académico. Por
outro lado, as empresas são muito pragmáticas,
querem as coisas resolvidas muito rapidamente e não
podem estar assentes em idealismos e teorias. Há
portanto a necessidade de ligar estes dois mundos, até
porque a ligação Universidade/empresa é
cada vez mais importante. No caso do Parkurbis pensou-se
numa estrutura que viesse desenvolver a relação
entre o saber universitário e o mundo empresarial,
conferindo-lhe uma nova perspectiva. Interessava à
região diversificar o tecido empresarial, mas contar
também com entidades mais inovadores, mais dinâmicas
e competitivas. Daí que o Parque de Ciência
e Tecnologia tenha essa função. Aproveitar
as ideias inovadoras que surgem de centros tecnológicos
para revitalizar o tecido empresarial que existe na nossa
região.
U@O – Como tem sido a relação
entre a UBI e o meio empresarial?
M. R. – Tem vindo a melhorar cada vez mais.
A UBI soube dar às empresas muito daquilo que elas
precisavam. E as empresas viram na Universidade um parceiro
para o desenvolvimento tecnológico e para o “upgrading”
de ideias e recursos humanos. Na região existe
um grande número de pequenas e médias empresas,
daí que a UBI tenha feito um grande esforço
de procurar chegar até essas mesmas entidades.
A cooperação tem assim existido em vários
domínios, o mais visível talvez, seja o
dos estágios profissionais. Isto porque, quando
um aluno da UBI vai efectuar um estágio numa empresa
é uma forma dessa entidade ficar a conhecer novos
métodos que chegam da Universidade e verificar
também se esse mesmo profissional confere algum
valor acrescentado à empresa, de forma a poder
contratá-lo.
"Todos os cursos têm ofertas de estágios" |
"Estamos numa época em que importantes
desafios se colocam às Universidades" |
U@O – A criação de um Centro
de Estágios ajudou a criar um maior entrosamento
entre a Universidade e as empresas?
M. R. – Em 1996, alguns alunos do curso
de Gestão desafiaram-me a encontra-lhes alguns
estágios, de forma a poder ajudá-los a inserirem-se
no mercado de trabalho. Nesse primeiro ano telefonei para
algumas empresas e promovi alguns contactos e consegui
encontrar vários estágios. Com o apoio da
reitoria da UBI transformámos essa ideia num gabinete
de estágios, de tal modo que hoje, passados estes
anos, todos os cursos têm ofertas de estágios.
Em muitas áreas, as ofertas chegam a ser maior
que a procura. Isto não acontece em todas as áreas,
mas existem casos com muito bom resultado.
Por outro lado, as empresas têm encarado tudo isto
de maneira bastante positiva. Hoje em dia já são
as empresas que nos procuram. Daí que estejamos
a pensar em internamente tornar todo este processo mais
fácil e aproximá-lo do aluno. Estamos a
candidatar o Gabinete de Estágios a um projecto
que nos permita criar uma linha informática com
vários terminais espalhados pela UBI, onde o aluno
possa consultar todas as ofertas de emprego, de estágios,
todas as necessidades das empresas e nesses mesmos terminais,
inserir os seus dados, os seus currículos e responder
a esses anúncios.
U@O – Trinta anos de Ensino Superior na
região e 19 anos de Universidade. Que análise
faz da UBI no contexto regional?
M. R. – A UBI teve um impacto muito positivo
na região, a vários níveis. A Universidade
conseguiu trazer para a região o Ensino Superior
e tudo o que isso significa. Como alguns recursos humanos
não existiam, formámo-los. Fomos contratar
pessoas estrangeiras, algo em que fomos bastante criticados
na altura, contudo, essa estratégia foi bem sucedida.
A região ganhou também um conjunto diversificado
de áreas científicas, a última das
quais, a medicina. Por outro lado, esta instituição
trouxe sobretudo para a Covilhã, gente jovem. A
cidade passou por um processo de reestruturação
industrial bastante complexo, o qual causou graves problemas
sociais. A Universidade funcionou como um amortecedor
social e económico dessa transformação.
Houve jovens a vir para Covilhã e para toda esta
zona, trazendo tudo o que de positivo lhes está
associado. A Universidade trouxe também uma mudança
ao nível cultural e ao nível científico.
Muito do que se faz na Covilhã, em termos culturais,
deve-se aos alunos da UBI. Recordo a Associação
Académica, os núcleos, as tunas e o teatro,
entre outros. Da parte científica, os congressos
e as reuniões que se fazem.
Veja-se um outro facto curioso. As cidades do interior
que têm Ensino Superior, como é a Guarda,
a Covilhã e Castelo Branco, são aquelas
que desde a década de 90 do século passado
não perderam população. O que nos
leva a dizer que a qualidade de vida nesta região
melhorou significativamente.
U@O – Como director do Centro de Estudos
de Desenvolvimento Regional quais os cenários futuros
e os projectos que lhe ocorrem?
M. R – Estamos numa época em que
importantes desafios se colocam às Universidades.
Como há menos alunos, as instituições
vão impor-se pela qualidade e pela excelência
no ensino. A UBI está também empenhada em
implementar o Processo de Bolonha, um novo método
de ensino, não centrado no professor, mas sim no
aluno. Existe outro importante desafio que é o
de continuar a ligação às empresas,
na medida em que as empresas já exigem que a Universidade
se ligue a elas pelas investigações que
esta faz e aí terá de se apostar na pós-graduação.
"Muito do que se faz
na Covilhã, em termos culturais, deve-se
aos alunos da UBI"
|
"O País já não precisa
de mais instituições de Ensino Superior"
|
U@O – Assiste-se hoje a um decréscimo
de alunos a concorrer à Universidade, mas a uma
multiplicação de instituições
ou licenciaturas. Como olha para esta dualidade?
M. R. – O País já não
precisa de mais instituições de Ensino Superior.
Deve-se é exigir às instituições
que existem um ensino de maior qualidade e uma actualização
dos currículos das licenciaturas à realidade
e à exigência que hoje em dia a sociedade
e o mercado de trabalho colocam ao Ensino Superior.
Uma instituição de Ensino Superior não
é um conjunto de carteiras e de cadeiras, é
uma instituição com um conjunto de quadros
técnicos e humanos altamente qualificados. Não
basta criar uma instituição e dizer que
vamos criar ali um curso superior. Para tal é necessário
criar-se um corpo docente de qualidade e depois oferecer
um ensino no mesmo patamar.
U@O – Para além da Universidade
existem também os politécnicos de Castelo
Branco e da Guarda. Existe uma boa relação
com estas instituições?
M. R. – Estas instituições
desempenham papéis diferentes. Todas representam
uma necessidade própria, daí que as relações
entre Universidade e politécnicos sejam bastante
boas. Para além das ligações formais,
existem projectos e investigações, assim
como parcerias entre docentes que decorrem entre as instituições.
"As Universidades, num futuro próximo,
terão de competir de igual para igual" |
"A UBI tem ganhado prestígio nalgumas
áreas específicas" |
U@O – A UBI, como Universidade localizada
no interior do País acaba por sofrer, em certa
medida, com esse facto. Contudo, tem encontrado em Espanha,
nomeadamente nas Universidades de Salamanca e da Extremadura,
fortes aliados. Em que patamar estão essas parcerias?
M. R. – A nossa proximidade com Espanha
permite termos relações privilegiadas com
Universidades daquele país vizinho, em alguns casos,
relações mais facilitadas do que com Universidades
portuguesas localizadas no litoral, até porque
estas olham para as Universidades localizadas no interior
com um certo distanciamento, dado o cosmopolitismo que
caracteriza, geralmente, as pessoas dessas Universidades.
Ao contrário, Espanha é um país marcado
pelas regiões e pelo facto da capital não
estar perto do mar, mas sim no interior, o que leva a
pensar a interioridade de uma outra forma diferente daquela
que se pensa em Portugal.
Temos conseguido chegar a formas conjuntas de investigação
e de estudos, conseguindo algumas relações
interessantes, quer com Salamanca, quer com a Extremadura,
aqui com as Universidades de Badajoz e Cáceres,
e com outras tantas instituições espanholas.
Estas parcerias têm-nos permitido concorrer a projectos
europeus, uma vez que estamos certos de que as ligações
internacionais são muito importantes, visto que
hoje, num ambiente europeu torna-se necessário
estudar os problemas de um e de outro país e ver
onde estão as soluções. No futuro
pretendemos alargar estas parcerias a outros países
europeus e também ao Brasil. Este país tem
a vantagem da língua mãe ser a mesma e de
ter um enorme mercado.
U@O – Deve haver estratégias de competitividade
entre as instituições de Ensino Superior?
M.R. – Num mundo cada vez mais global as
instituições têm de encontrar os seus
caminhos próprios e as suas especificidades próprias.
As Universidades, num futuro próximo, terão
de competir de igual para igual. Contudo, e devido a alguma
mentalidade instalada no nosso País, assiste-se
ainda ao preconceito de que tudo o que se faz em Lisboa,
no Porto e em Coimbra é bom, fora dessas áreas,
nada presta. Não é que isso seja real ou
que acontece. Nem só a nossa Universidade, mas
também outras instituições no interior
do País têm demonstrado que as investigações
feitas têm qualidade. Mas este é um processo
que se ganha aos poucos, caminhando para um mesmo fim.
A imagem da UBI tem vindo a mudar, notamos isso quando
as empresas seleccionam alunos, fazem-no de forma geral,
não limitam as escolhas a alunos formados nesta
ou naquela Universidade, mas em todas.
Por outro lado, é também já um facto
consolidado, o de que a UBI tem ganhado prestígio
nalgumas áreas específicas o que leva os
alunos a procurarem-nos em primeira opção.
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