Anabela Gradim

Uniformizar e exigir


Três medidas foram nestes últimos dias anunciadas pelo Ministério da Ciência e Ensino Superior, tutelado por Mariano Gago, para o sector:

1. É já em 2005 que o efeito “percentil” deixará de se verificar no acesso dos estudantes ao superior. Doravante, ter menos de 9,5 valores nos exames ou provas específicas de acesso implica não poder frequentar o Superior.

2. Proceder à uniformização das designações dos cursos do primeiro ciclo de estudos superiores.

3. Deixar progressivamente de financiar os cursos que contem com menos de 20 alunos inscritos, em ordem a eliminar as formações de reduzida empregabilidade.


Quanto à primeira, aparentemente, nem todos os alunos do secundário se terão apercebido que, por melhor que seja a nota interna, se chumbarem no exame, estão out. Trata-se de uma elementar medida de moralização do sistema, quando os rankings de escolas secundárias elaborados nos últimos anos permitiram perceber, entre outras coisas, a abissal diferença, em algumas escolas, entre a nota interna, que podia ser muito elevada, e o clamoroso chumbo no exame, cujo peso na determinação da média também tinha vindo progressivamente a ser reduzido. Mariano Gago diz que quer passar a mensagem de que «é preciso estudar», e convenhamos, essa é uma mensagem que precisa não só de ser passada, como inscrita na consciência de todos.

A segunda, aproveitando o embalo das reformulações a efectuar no âmbito do processo de Bolonha, é da maior oportunidade. Há mais de mil designações diferentes de cursos superiores em Portugal. Uniformizá-las, reduzindo-as à centena, aproveitando o facto do primeiro ciclo de estudos privilegiar uma formação abrangente ou de «banda larga», conducente a uma maior especialização a realizar no segundo ciclo, é uma medida necessária, que conduzirá à racionalização do sistema, e de que os estudantes colherão grandes vantagens, nomeadamente porque essa uniformização contribuirá para alargar o leque das oportunidades de especialização a que terão acesso no segundo ciclo. Só para dar um pequeno exemplo do caos lançado pela proliferação incontrolada de designações no campo das habilitações para a docência: a Licenciatura em Estudos Portugueses e Ingleses permite ensinar inglês ao 2º ciclo do básico; a Licenciatura em Estudos Ingleses e Portugueses, com um plano de estudos em tudo idêntico, não.

Decorrendo da implantação das outras duas, a terceira medida - deixar progressivamente de financiar os cursos com menos de 20 alunos inscritos - poderá, com algumas ressalvas, ser igualmente positiva. A ressalva é, evidentemente, o facto de existirem áreas do saber que são estratégicas para uma sociedade e que não podem por conseguinte ficar dependentes da procura ou da moda. Será positiva no quanto contribuir para eliminar formações sem saídas profissionais. É uma medida que só se compreende se articulada com as duas últimas anteriores, e com outra ainda mais fundamental, também já anunciada: a uniformização dos requisitos de acesso aos diferentes cursos, cujas designações já foram entretanto também elas uniformizadas. Isso evitará que encerre um excelente e valioso curso de Engenharia Civil apenas porque exige Matemática como prova de ingresso, enquanto se mantém no mercado um outro curso de Civil (que os há) que não exige que os seus candidatos tragam Matemática do secundário, e portanto tem elevado número de inscritos.

Uniformização, acompanhada de exigência – uniformizar e exigir – não nos elevará certamente aos píncaros do sucesso e qualidade absolutas, mas também não nos afasta delas, tornando-as inatingíveis miragens. Ergo, pode ser bom.

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