“Mar
Adentro”
de
Alejandro Amenábar
Por Rosa Ramos
O Globo de Ouro e o Óscar para melhor filme estrangeiro
fez de “Mar Adentro”, de Aménabar,
um sucesso de bilheteira. Se num primeiro olhar, apetece
dizer que o realizador já merecia, há muito,
o prémio da Academia, por “Abre los ojos”
(que deu origem ao sucesso hollywodesco “Vanilla
Sky”) e “Los otros” (o filme com Nicole
Kidman cujo final é, no mínimo, surpreendente).
Poderia, deste modo, tratar-se de um mero prémio
de consolação, bem ao jeito da Academia,
depois da adaptação bem sucedida e rentável
destes dois filmes do realizador espanhol à magia
do cinema americano.
Porém, Aménabar surgiu com um filme algo
complicado. Fala sobre a eutanásia, sobre o direito
de viver com liberdade e morrer com dignidade. Um primeiro
olhar sobre qualquer sinopse dir-nos-à que, na
verdade, a temática presente em “Mar Adentro”
é um tanto ou quanto vulgar. Contudo, o filme deu-nos
a ver pequenos momentos de pormenor extremamente bem conseguidos,
onde se conjugam elementos sonoros fortes (nota para a
participação de Carlos Nuñez que,
com Aménabar, se encarregou da banda sonora) com
um argumento bastante bem conseguido e boas interpretações.
O desejo inabalável de abandonar a vida perante
toda uma série de limitações físicas
marca o percurso do protagonista, preso há quase
30 anos numa cama. Rámon Sampedro lamenta o próprio
desejo de morrer e faz uso, em todos os momentos, de uma
lucidez comovente.
Uma das cenas marcantes do filme, pontuada com um toque
subtil de humor, e que poucos realizadores conseguiriam
ilustrar de forma tão divertida, foi o encontro
de Rámon com um padre que o visita, a fim de o
convencer a escolher a vida. As diferenças ideológicas
e religiosas são ridicularizadas por Aménabar,
fazendo as personagens discutir à distância,
uma vez que a cadeira de rodas do padre (também
ele impedido de se mover) não conseguia passar
pela escadaria que levava ao quarto do protagonista. Aliás,
é neste tipo de ilustrações que Aménabar
ganha pontos. Porque, como dizia no início, se
o tema é vulgar, a forma de o abordar assume, em
“Mar Adentro”, muitas maneiras diversificadas.
Embora não fazendo disso uma bandeira (há,
apenas, uma nota discreta no ecrã, mesmo no final
da película), a história de Rámon
é, afinal, verídica. Durante anos, um sujeito
espanhol, com o mesmo nome que o protagonista de “Mar
Adentro”, tentou obter na Justiça o direito
de morrer. Por fim, concebeu um plano para cometer o suicídio.
A investigação aberta após a sua
morte, em 1998, não chegou a nenhuma conclusão
quanto aos responsáveis pelo seu desaparecimento.
No final de contas, “Mar Adentro” funciona
de forma exímia no sentido de nos forçar
a uma análise interior que pode revelar-se impiedosa,
cruel e surpreendente. Apesar de tudo isto, existem muitos
momentos em “Mar Adentro” a roçar o
lugar-comum. Muitas das cenas obedecem a criteriosos clichés.
No entanto, o filme acaba por nos tocar e por causar uma
estranha impressão que cada um definirá
individualmente, conforme a sua crença e as suas
experiências.
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