José Geraldes
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Reformar
o Estado
A dependência
dos portugueses do Estado tornou-se um empecilho para
a modernização do País. Por sua vez,
o Estado com os seus tentáculos centralizadores
apoderou-se de uma série de domínios que
também constituem um entrave para o dinamismo da
sociedade civil.
Medina Carreira, ex-ministro das Finanças, estudou
a fundo a questão e chegou a conclusões
preocupantes. Escreve: “Dispersos na nossa sociedade,
temos 4,5 milhões de indivíduos que integram
uma espécie de “Partido do Estado”.
Têm em comum uma dependência directa do Orçamento
e representavam em 2003: 43 por cento da população
residente, 56 por cento do eleitorado, 62 por cento da
população com mais 24 anos de idade”.
E continua: “ Pensionistas e subsidiados (mais de
3,8 milhões) equivaliam a 70 por cento da população
activa. Este “Partido do Estado” absorvia
70 por cento dos impostos cobrados (1980). Atinge agora
os 85 por cento (2003)”.
Perante estes números, a conclusão que se
impõe é uma reforma urgente do Estado. Não
se afigura possível a um País progredir
com 4,5 milhões de pessoas a viver da mesa do Orçamento.
A questão agrava-se mais quando os indicadores
da Direcção-Geral das Contribuições
e Impostos revelam que, em 2003, só 5 por cento
das famílias totalizou 54 por cento, em números
redondos, dos valores de IRS liquidados. E já nem
se fala das mais de 50 por cento de empresas que declaram
prejuízos para não pagar impostos. Além
disso, o Estado não pode continuar a absorver 48
por cento da riqueza que os portugueses produzem.
Será que se trata de um atavismo impossível
de eliminar? Eça de Queirós, em “As
Farpas”, descreve com mão de mestre, esta
dependência: “Fomos outrora o povo do caldo
da portaria, das procissões, da navalha e da taverna.
Compreendeu-se que esta situação era uma
aviltação da dignidade humana: fizemos muitas
revoluções para sair dela. Ficámos
exactamente em condições idênticas.
O caldo da portaria não acabou. Não é
já como outrora uma multidão pitoresca de
mendigos, beatos, ciganos, ladrões, caceteiros,
carrascos que o vai buscar alegremente, ao meio-dia, cantando
o Bendito; é uma classe média inteira que
vive dele, de chapéu alto e paletó. (...)
Todos vivem na dependência: nunca temos por isso
a atitude da nossa consciência, temos a atitude
do nosso interesse”.
Somando à dependência do Estado a corrupção
reinante, não sabemos onde vamos parar. Um ex-ministro
socialista João Cravinho, recentemente, em conferência
na Fundação Gulbenkian, traçava a
negro o panorama actual português: “O Estado
foi apropriado por grupos de interesses e lóbis
que envolvem o próprio sistema político.
A corrupção existe e está a agravar-se.
Em resumo, vivemos um recorde de crescimento económico
em 30 anos e ao mesmo tempo estamos possuídos por
um clima de desencanto, perplexidade e angústia
sobre o futuro”. A agravar ainda mais a situação
é o facto de Portugal, segundo dados do Conselho
da Europa, Portugal assumir que não tem uma estratégia
específica contra a corrupção.
O peso do Estado na sociedade existe por culpa do próprio
Estado que se apodera de sectores onde devia dar liberdade
aos cidadãos. O Vaticano II diz sem subterfúgios:
“É plenamente conforme com a natureza do
homem que se encontrem estruturas jurídico-políticas
nas quais todos os cidadãos tenham a possibilidade
efectiva de participar livre e activamente, dum modo cada
vez mais perfeito e se qualquer discriminação”.
Daí que o Estado não possa ser, para usar
uma expressão de Mário Pinto, “proprietário
e produtor colectivo e monopolista de bens e serviços
públicos”. Seja na saúde, na segurança
social ou na educação. O princípio
da subsidiariedade é fundamental no estado democrático.
Ao Estado compete um dever regulador para deixar que a
sociedade civil possa ter iniciativas para o bem comum.
No discurso de tomada de posse, José Sócrates
formulou o desejo de um Portugal com igualdade de oportunidades
para todos. Esperemos que reforme o Estado para se cumprir
este desejo que os portugueses querem concretizar.
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