Imagine que tinha a
capacidade de criar um ser humano, com todas as suas virtudes
e sem defeitos. Agora imagine que essa criação
não sairia como esperava e, ao invés de
um humano perfeito, nasceria um monstro. Foi esta ideia
que a Aula de Teatro Universitária de Ourense (Espanha)
nos trouxe à Covilhã, através do
grupo de teatro Maricastaña.
Num cenário carregado de luzes e cores bruscas,
um elenco de 14 actores dá vida a Frankenstein,
uma peça que conta a história de um cientista
que ambicionava ser um vencedor. Victor Frankenstein vive
obcecado com a vontade de inventar um ser racional e sensível,
capaz de superar dogmas e preconceitos sociais. Contudo,
algo corre mal e o ser humano ideal dá lugar a
uma criatura horrenda, manchada de terror. Incapaz de
comunicar com os restantes humanos, devido à sua
fealdade, o Monstro torna-se num ser triste e frio. Rejeitado
por todos, inclusive pelo seu próprio criador,
a criatura embrenha-se na sociedade para conseguir o triunfo
da morte sobre a vida. Baseado na obra de Mary W. Shelley,
este trabalho teatral pretende mostrar à comunidade
em geral que “todos nós temos um monstro
dentro de nós, capaz de, por vezes, desencadear
guerras e ferir o próximo”, refere Fernando
Dacosta, encenador da peça. No mundo em que vivemos,
“há indivíduos poderosos que criam
algo de ruim e depois não querem ver essa criação,
acabando por destruir inocentes”, acrescenta Fernando
Dacosta.
A peça de teatro centra-se sobretudo na violência
e na falta de comunicação entre as pessoas,
donde, por vezes, resultam lutas bélicas e mortes.
Relembrando o ataque terrorista ocorrido em Madrid, a
11 de Março do ano passado, Fernando Dacosta salienta
que «a violência que trespassa do palco para
os espectadores acontece, no fundo, na própria
realidade social. O “11 de Março” é
um exemplo disso».
Esta obra está integrada na triologia do Monstro
de Maricastaña que começou no ano anterior.
O processo criativo de Frankenstein iniciou-se em Novembro
de 2004, estreando-se no Teatro-Cine da Covilhã
no passado dia 13 de Março. Frankenstein resulta
de um trabalho exaustivo de pesquisa e recolha de opiniões
dos diversos participantes que entram na peça.
Com várias coreografias, textos emocionantes e
músicas arrepiantes, os figurinos tentam que o
público sinta “a capacidade do ser humano
em se transformar num Deus que é capaz de eliminar
aquilo que inventa”cita o dramaturgo Fernando Dacosta.
“De vez em quando imploramos, rogamos ou blasfemamos
a um Deus que nos repele, ou seja, o nosso criador. Isso
é o que o Monstro faz ao seu inventor: pergunta
o porquê da sua rejeição”. Temas
como a Filosofia Humana, Genética, Religião,
Morte e Naturalismo preencheram os diálogos dos
actores que, ao longo de duas horas, cativaram o público
presente.
Para Maria João Canadas, estudante de Jornalismo
na UBI, os Maricastaña “foram, sem dúvida,
a companhia que mais gostei neste ciclo de teatro. Penso
que deveriam ganhar pelo seu dinamismo e energia em palco”.
No penúltimo dia do encerramento do IX Ciclo de
Teatro Universitário da Beira Interior, o grupo
Maricastaña trouxe uma peça assinalada pela
originalidade na apresentação de uma obra
literária complexa, transposta para o teatro.
|