António Fidalgo
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Santo da casa
José Sócrates,
novo primeiro-ministro de Portugal, é certamente
um dos santos de casa da Beira Interior neste ano de 2005.
Ainda que se diga que os santos de casa não fazem
milagres, a verdade é que desta vez o santo já
fez milagres. Sócrates também tem mérito
nas medidas importantes levadas a cabo no governo de Guterres,
nomeadamente a auto-estrada de Abrantes a Vilar Formoso,
a Faculdade de Ciências da Saúde da UBI e
o gás natural. Que Sócrates é da
casa, entendendo esta como Beira Interior, não
restam dúvidas. Sempre foi eleito pelo distrito
de Castelo Branco, começou a campanha para secretário
do PS na Covilhã, mais concretamente na UBI, e
é aqui que tem as suas raízes.
O que a Beira Interior, a Covilhã e a UBI precisam
de Sócrates não é de milagres de
casa, favorzinhos à medida, mas de um primeiro-ministro
que governe bem Portugal. O pior seria o nosso santo de
casa ser caseiro. Os milagres a fazerem-se têm de
ser feitos aqui, pelos que cá estão. Do
governo central liderado por um homem que conhece o interior
esperam-se políticas que não discriminem
o interior. Com efeito, não é favor que
não se paguem portagens na A23, mais caro ao Estado
ficam os défices das empresas públicas como
o Metro e a Carris localizadas em Lisboa.
O governo de José Sócrates inclui Mariano
Gago na pasta da Ciência e do Ensino Superior. A
UBI não tem boas lembranças dele como ministro
da Ciência nos tempos de Guterres. De Sócrates,
enquanto santo da casa, espera-se apenas que tenha a influência
tutelar e tácita necessária para que o seu
ministro da ciência não discrimine a UBI.
Só isso, mais nada. Os episódios à
volta da decisão política da criação
da Faculdade de Ciências da Saúde na UBI
mantêm-se na memória.
As grandes universidades do Litoral, nomeadamente a Clássica
de Lisboa e a de Coimbra, têm sido ano a ano beneficiadas
no Orçamento do Estado. A UBI tem visto o seu orçamento
descer quando foi a universidade em Portugal que mais
cresceu nos últimos anos. O contrato programa para
a construção do edifício da Faculdade
de Ciências da Saúde não tem sido
cumprido pelo governo central. A UBI já gastou
muitas das suas receitas próprias para o edifício.
O que se pede a Sócrates então é
que o governo seja pessoa de bem e honre os seus compromissos,
nomeadamente os financeiros.
Do que o Interior menos precisa é de caridadezinha.
Precisa sim de uma visão estratégica, nacional,
que sirva a região e que sirva Portugal. Se a solução
para Portugal é o aumento significativo da produtividade
a obter através do investimento científico
e tecnológico, como tem sido preconizado pelo novo
primeiro-ministro, então a solução
para o Interior não pode ser diferente. Invista-se
aqui na ciência e na tecnologia e isso quer dizer
investir na UBI como a grande instituição
científica do Interior. Mas não investir
apenas atirando dinheiro. De modo algum. A UBI deve assumir
uma função eminente de intercâmbio
científico com as universidades espanholas. As
razões para isso não são apenas de
cariz geográfico, o que de si é importante,
mas sobretudo por estratégia de desenvolvimento.
A cooperação anterior de programas Interreg
com as universidades fronteiriças da Estremadura
espanhola e de Castela-Leão, a existência
de um curso de Língua e Cultura Espanholas na UBI,
os laços construídos nos últimos
anos pelas novas licenciaturas, a saber Medicina, Ciências
da Comunicação, Cinema, com congéneres
espanholas, devem servir de alavanca para uma linha clara
no investimento científico e tecnológico
português: a cooperação com as universidades
espanholas. A UBI tem mostrado que possui as capacidades,
o espírito de corpo e a vontade, para assumir esse
papel.
Se se continuar a privilegiar as ligações
ao mundo universitário e científico anglo-saxónico
e a descurar as ligações às instituições
científicas espanholas é de prever que não
haja um forte investimento científico na UBI, mas
se houver uma estratégia clara de fortalecer a
nossa comunidade científica ligando-a à
comunidade espanhola, então a UBI ganhará
imenso, e com ela toda a região do Interior.
O desenvolvimento científico e tecnológico
que Sócrates quer para o país passará
muito na sua concretização pela acção
política do ministro José Mariano Gago à
frente do Ministério da Ciência, Tecnologia
e Ensino Superior. Espera-se que desta vez a atitude do
ministro relativamente à UBI seja mais positiva
e que as apreensões actuais se desvaneçam.
Para isso servem também os santos de casa.
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