António Fidalgo

Saber sair


Nesta época de final de ano costuma-se desejar aos outros “Boas saídas e melhores entradas”. De facto, sair bem é importante; da saída do ano velho depende muito o modo como se começa o ano novo. A pergunta que se coloca é qual o significado de sair bem. A interpretação simplista é de que se passem bem os últimos dias do ano, com saúde e alegria, culminando numa passagem de ano a brindar com champanhe ao novo ano. Mas uma boa saída terá necessariamente uma outra dimensão que não se reduz aos últimos dias do último mês do ano, ela terá de compreender todos os dias do ano, os dias bons e os dias maus. Sair bem de um ano engloba todo o ano. Quem aprende a lição dos erros cometidos e da má fortuna aproveitará mais do que alguém que não toma consciência da sorte que o acompanhou no ano decorrido.

Sair bem, entendido desta maneira, não é fruto do acaso, mas acção consciente de quem sabe e quer sair bem. A expressão “saber sair” aplica-se habitualmente ao término de funções, no sentido de que os detentores dos cargos não podem deixá-los pura e simplesmente. Sair bem é o contrário de um abandono. Exige preparação, prudência, avaliação, previsão de consequências, escolhas. Ora é isso que se advoga para a saída do ano. Claro que é uma saída diferente, temporal, inevitável. Mas o ponto em causa é a consciência de um término, de um momento propício à revisão do passado, ao exame do que se fez, à sua avaliação, e a extrair as devidas lições. Ou seja, não basta a alguém viver muito para ser experiente, no sentido de ter aprendido com o vivido. A experiência de vida adquire-se não por se viver anos atrás de anos, mas por se aprender com os anos. Há pessoas com muita idade a quem a experiência nada ensinou. A experiência de vida adquire-se vivendo, como condição necessária, mas claramente insuficiente. Para isso é preciso aprender.

Sair bem de um ano significa então que se aprendeu com esse ano. Como tudo na vida, para tudo o que tem um começo há um fim e a sabedoria está em ter presente o fim de cada coisa em que estamos metidos. Viver sem a consciência dos muitos fins que nos circunscrevem é viver inconscientemente, será mais um sobreviver que um viver próprio de um ser humano.

Sair bem de um ano é algo que se aprende, e aprende-se não só mediante as saídas de anos anteriores, mas também através da saída de dias, de semanas e de meses. É nessas saídas que se joga o sentido ou a falta dele do que se vive, do que se faz, de bem e de mal, e do que se omite. Por fim, será essa aprendizagem do saber finalizar as coisas que nos prepara dia a dia a saber sair um dia da vida.