José Geraldes

A lanterna de Diógenes


Um dia, em Atenas, na praça principal, Diógenes, filósofo grego, andava de lanterna acesa, em pleno dia. Os transeuntes abanavam a cabeça, pensando que Diógenes enlouquecera. Alguns mais afoitos perguntaram-lhe o que fazia àquela hora do dia com a lanterna acesa. Diógenes respondeu-lhes que andava à procura de um Homem.
A sociedade perdera tantos valores em Atenas que Diógenes tinha dificuldades em encontrar um Homem no sentido verdadeiro da palavra.
Em muitas praças de cidades do País e do mundo, o gesto poderia ser hoje repetido. E certamente as dificuldades também seriam muitas para encontrar os homens de que o nosso tempo precisa.
Costuma dizer-se que os cemitérios estão cheios de homens insubstituíveis. A afirmação até tem foros de verdade. Mas, é preciso reconhecê-lo, há homens que fazem história.
Olhando para a Europa contemporânea, como não lembrar De Gaulle em França, Churchil na Inglaterra, De Gasperi na Itália e Adenauer na Alemanha, os reconstrutores do pós-guerra ? E os fundadores da Comunidade Europeia R. Schuman e Jean Monet ? Todos eles eram homens de vistas largas e que souberam agarrar o seu tempo.
Mas, como em Atenas há milhares de anos, a sociedade do nosso tempo também perdeu muitos valores. Houve –é verdade- uma evolução e uma mudança que não se discute. A sociedade fechada tornou-se sociedade aberta para utilizar uma expressão de Karl Popper.
No entanto, sociedade aberta não significa fazer tábua-rasa dos valores que definem o homem como a coerência, a responsabilidade, a integridade do carácter, a verdade nas relações humanas, o respeito de uns pelos outros, as boas maneiras, o uso correcto da liberdade, o sentido da justiça.
A coerência implica uma maneira de estar na vida de acordo com o que se pensa. E não ser como os cata-ventos das torres das igrejas que mudam de posição conforme sopram os ventos. Mas quantos e quantas encontramos por aí que, conforme os seus interesses pessoais e egoístas, alteram os seus pontos de vista de manhã para a tarde. Ou mesmo de uma hora para a outra.
A responsabilidade leva a assumir em consciência os compromissos. E a cumpri-los inteiramente. E a não brincar com coisas sérias. Veja-se quantos irresponsáveis se passeiam à nossa volta não assumindo as tarefas que lhes competem. E a quem nada se pode confiar.
Ter carácter íntegro é ser o que se é na aplicação das suas convicções. Sem malabarismos nem manipulações. Nem segundas intenções. Com rectidão e consciência limpa. Quem vive da corrupção, destrói a integridade do carácter.
Não se pode viver em sociedade sem nos relacionarmos com os outros na verdade. Por isso, a hipocrisia é malsã. Ter duas caras envenena qualquer relação humana. E gera o ódio e o rancor. “ Ser ou não ser”, eis a questão. Tanta mentira que pulula por aí vestida de simpatia. E tantos punhais apontados nas costas com ar das maiores juras de amizade pela frente.
Nas escolas e nas famílias, torna-se urgente ensinar as boas maneiras às crianças. Mas é preciso primeiro que os professores e os pais tenham essas boas maneiras. Quem tem hoje o sentido do respeito do superior ? E quem cultiva a boa educação ? A impressão que se tem, é que os meninos e meninas sós sabem grosserias e se comportam como grosseiros com colegas e adultos.
Foi Voltaire que escreveu : “Liberdade, quantos crimes se cometem em teu nome”. A liberdade, acto de escolha responsável que se faz sem qualquer violência, é um valor sagrado. Mas a libertinagem é o mau uso da liberdade que leva à negação da própria liberdade. E a minha liberdade acaba onde começa a liberdade do outro.
Sem justiça, não há sociedade que subsista. Justiça e liberdade andam de mãos dadas. Para se avaliar o estado de uma sociedade, basta ver o grau de liberdade que tem e a justiça que se aplica.
São todos estes valores que fazem o Homem. E sem os quais não se pode construir uma sociedade moderna.