O prazer e a felicidade,
o humor e o ócio são características
“cada vez mais transmitidas pela comunicação”,
diz José Pacheco Pereira. O político, o escritor,
o autor do blogue “Abupto” veio até à
Universidade da Beira Interior (UBI) tentar responder a
alguns dos desafios mais prementes que o fenómeno
comunicacional tem colocado. Na óptica de Pacheco
Pereira, a escola não devia só ensinar a ler,
escrever e contar, mas também “a ver televisão”.
Uma tese que este professor do ISCTE diz ser a que mais
se coaduna com os dias de hoje.
Este sensacionalismo que impera nos media actuais faz com
que o discurso político seja cada vez mais “assassino,
mais incendiário”. O verdadeiro debate, a discussão
retórica das ideias “fica cada vez mais à
margem dos padrões de informação que
se registam nos nossos dias”. Pacheco Pereira lembra
que “os políticos de hoje já aprenderam
a falar em tom de espectacularidade mediática”.
Como o público “vota através da televisão”,
torna-se quase impossível e é cada vez mais
raro, “o político que tome decisões
impopulares”. O autor do blogue Abrupto refere que
“a democracia é isso mesmo, é a capacidade
de tomar decisões que nem sempre agradam”.
Neste emaranhado de decisões e acções,
onde os líderes políticos são escolhidos
“pela sua capacidade mediática de ganhar eleições”,
os media são cada vez mais apetecíveis para
os políticos.
Democracia torna-se demagogia |
Nos dias que correm, os políticos são
escolhidos pela sua "habilidade mediática" |
Outro dos convidados a participar nestas jornadas de
comunicação e política, promovidas
pelo Departamento de Comunicação e Artes
foi o investigador Enric Saperas. Com um vasto leque de
obras publicadas na área da comunicação,
este professor espanhol falou no caso do 11 de Março.
Actualmente, e depois de alguns acontecimentos produzidos
pela classe política, “o povo espanhol desconfia,
continuadamente, do discurso mediático”.
Segundo este docente, que se encontra a meio de um estudo
sobre a credibilização dos telejornais,
“toda a gente passou a olhar para as notícias
apresentadas pelas cadeias televisivas, como uma espécie
de mentira disfarçada”. A mensagem que sai
dos televisores, dos rádios, dos jornais, “não
é de confiança”.
E se ao contrário de Portugal, onde Pacheco Pereira
diz estar a viver-se “uma demagogia”, no país
vizinho, “o discurso político, por força
dos media, está a mudar”. Esta demagogia,
explica o professor do ISCTE, “deriva de uma série
de decisões políticas importantes que são
tomadas por pessoas que não o Governo, ou uma conjunto
de disfarces utilizados pelos políticos, para tentar
iludir os eleitores”. A democracia das decisões
difícies e impopulares, “deu lugar uma demagogia,
onde tudo corre bem e onde não existem dificuldades”,
remata Pacheco Pereira.
Saperas explica o fenómeno de relação
entre estes dois campos sociais, através do exemplo
do aparelho democrático. Este docente espanhol
veio até à UBI dizer que “hoje, a
maior oposição dos políticos no Governo,
são os media”. Os media devem funcionar “como
mecanismos de controlo dos políticos”, mas
a má utilização destes levou a que
sejam mais do que isso.
Os blogues são vistos
como uma poderosa ferramenta para a fomentação
de opiniões
|
Novos meios trazem boas perspectivas
|
Num encontro marcado pela troca de ideia e de teorias,
deu-se grande destaque a um novo fenómeno comunicacional.
Os blogues, que têm vindo a registar um índice
de crescimento assinalável, tiveram direito a uma
sessão. João Canavilhas, docente na UBI
explica que “a política esteve, desde o primeiro
momento, ligada aos blogues”. Segundo este investigador,
“os blogues mais conhecidos e que hoje registam
maior número de visitas estão relacionados
com o humor e com política”. Esta mescla
dá um toque muito especial a estas páginas
pessoais da Internet, nas quais, Pacheco Pereira diz “estar
a renascer uma nova forma de debate”. Para o autor
de um dos mais conhecidos espaços cibernáuticos,
o blogue “Abrupto”, “este tipo de comunicação
representa uma melhoria qualitativa e quantitativa do
espaço público”. Nestas páginas
pessoais, na sua maioria mantidas sobre a forma de diários,
“favorece-se a proclamação de uma
opinião”, diz Pacheco Pereira. Esta “forma
cronológica de ver o mundo” tem levado a
um debate “mais aprofundado e mais equilibrado”
das questões políticas. O autor de “Abrupto”
mostra-se bastante confiante em relação
aos blogues e diz mesmo que estes podem ser os pilares
de uma “democracia comunicativa”.
UBI pode ter rede europeia de comunicação |
A UBI pode vir a integrar uma rede de Universidades
onde se estuda a relação entre política
e comunicação |
João Carlos Correia foi o docente responsável
pela organização deste encontro. Durante
um fim-de-semana debateu-se a relação entre
a política e a comunicação e foram
apontadas algumas das possíveis conclusões
de um estudo “que se quer vasto”. O docente
da UBI lembra que “em Portugal, verifica-se a ausência
de uma área de investigação que especificamente
assuma a problemática da comunicação
e política”. Este encontro serviu também,
“para lançar os primeiros passos no cruzamento
desta áreas”. As próximas acções
vão no sentido de “promover o intercâmbio
entre investigadores portugueses e outros congéneres
estrangeiros”. Daí que, a criação
de uma rede europeia de estudos de comunicação
e política “tenha sido abordada” ao
longo do encontro. Uma ideia que os responsáveis
da UBI pretendem desenvolver a curto prazo. |