José Geraldes

Mal de Inveja


A inveja é um mal português. Não se encontra outro povo em que a inveja, de forma preponderante, esteja tão presente nas relações sociais, nas instituições, no mudo da política e da literatura, no círculo de amigos e até na própria família.
A inveja dita formas de comportamento, enraíza atitudes e leva à formulação de juízos de valor. Por vezes, torna as pessoas doentias. Aliás, há autores que afirmam haver toda uma sintomatologia da inveja : palidez , olhar abatido, aspecto turvo. E também provocação de ansiedade, perturbações do apetite e alterações do sono.
Já no séc. XVII, o diplomata Conestagio, de Génova, num livro sobre a sua estadia em Portugal, anotava serem “ os portugueses invejosos por índole” e “sentirem com maior desgosto o proveito alheio do que o próprio dano”. E Camões termina o último canto de Os Lusíadas precisamente com a palavra inveja.
Estudiosos da maneira de ser dos portugueses têm chegado à conclusão da inveja fazer parte dos nossos hábitos e costumes.
Mas como se define a inveja? Filósofos e artistas têm-se debruçado sobre o assunto. Para Aristóteles, a inveja aparece como uma dor causada pela sorte que bafeja pessoas que nos são semelhantes.
Espinosa definiu-a como o ódio em si próprio. E explica que ela presdipõe o homem para o gozo do mal de outrem e para a tristeza pelo bem de outrem. Kant considera a inveja uma tendência para observar com dor o bem dos outros.
Dante na Divina Comédia coloca os invejosos no segundo círculo do Purgatório. O pintor Giotto representa-a com uma boca cheia de serpentes.
Na famosa peça de teatro Otelo de Shakespeare, a inveja aparece associada ao ciúme.
Otelo torna-se ciumento pois tem receio de perder Desdémona, a sua jovem mulher. Lago, outra das personagens, inveja Otelo pelo seu prestígio e também Casio, um jovem escolhido para seu braço direito em vez dele próprio. Lago consumido pela inveja inventa uma história falsa sobre o relacionamento de Casio com Desdémona. Tal facto suscitará o ciúme destrutivo de Otelo.
Incluída no rol dos sete pecados capitais pela Igreja Católica, a inveja pode desdobrar-se em vários graus, segundo psicólogos e psiquiatras. Assim temos a inveja depressiva, a hostil e a emulativa.
A inveja depressiva centra-se no sofrimento causado pela felicidade dos outros. Os pensamentos negativos dirigem-se contra si próprio.
A inveja hostil leva ao ódio quem nos ultrapassa em terminada área, seja amigo ou familiar. A tentação neste caso é passar uma “rasteira” ao invejado no emprego ou noutro sector social.
A inveja emulativa provoca o desejo de alcançar o mesmo nível de excelência do invejado, o que em si pode ser uma atitude sã.
Mas a inveja permanece sempre como uma derrota perante os outros.
Será possível ultrapassá-la ? Os mestres espirituais estão convencidos de que sim. E os sociólogos também concordam. Como? Primeiro reconhecendo que se é invejoso. Depois, relativizar as vantagens dos outros e considerar desapaixonadamente os êxitos alheios.
Os portugueses têm que seguir este caminho para que o mal de inveja de que sofrem, não impeça o êxito das causas nacionais para o bem comum. E, sobretudo, os políticos tenham isso em conta.
O filósofo inglês Francis Bacon bem o disse : “A inveja é um verme que corrói o mérito e a glória”.