Tinha interesse pela
música e aos dez anos decidiu vir para a Banda
da Covilhã aprender, por iniciativa própria.
Na altura, aproveitava todo o tempo disponível
que a escola lhe deixava para estar nas instalações
da instituição a praticar os conhecimentos
que lhe eram transmitidos para a iniciação
musical. Aprender a ler uma pauta ou a teoria musical.
A fase do solfejo, que permitiu a Helena Leitão,
agora com 16 anos, começar a dominar o clarinete,
que ainda toca nos ensaios semanais e nas “saídas”
a que vão. Normalmente cerimónias municipais,
arruadas ou acompanhamento de procissões em festas
religiosas.
Tal como Sara Silva, de 18 anos, que também optou
pelo mesmo instrumento há seis e foi “nesta
casa” que aprendeu as bases do que sabe, antes de
ter ido estudar para a Escola Profissional de Artes da
Beira Interior. Mas frisa que não esquece as raízes
e enquanto puder faz questão e tem gozo em continuar
na Banda da Covilhã.
No dia do ensaio os sons dos vários instrumentos
ecoam pela sede, junto ao Jardim Público. As várias
secções vão afinando os seus instrumentos
e aperfeiçoando as partes em que têm de dar
o seu contributo na melodia, com a percussão e
os sopros de maior porte mais atrás. “Isto
está muito lento”. “Essa entrada está
muito forte, toquem mais piano”, vai corrigindo
o maestro, António André. Na sala misturam-se,
num convívio saudável, pessoas de diferentes
faixas etárias, dos dez aos 73, mas os jovens são
cada vez menos que há uns anos atrás, o
que se reflecte no número de elementos da banda,
que é também muito mais reduzido. Uma constatação
confirmada pelas fotos antigas espalhadas pela sede, que
mostram um colectivo com mais gente, embora com menos
mulheres.
Até há três anos a escola de formação
da Banda da Covilhã funcionava em pleno, de manhã
e à tarde, por onde passaram “centenas de
pessoas”, salienta o maestro. E esta era uma forma
de aprender música gratuitamente. Mas as instalações
estavam degradadas, chovia lá dentro e isto, aliado
a outros factores, “foi desmotivando as pessoas”.
Há dois anos a Câmara começou a fazer
os melhoramentos na sede, mas a escola não voltou
a abrir por falta de alunos, o que vai acabar por se reflectir
no recrutamento de gente para a banda, já que alguns,
ou porque vão estudar para fora ou por outros motivos,
não podem estar sempre presentes.
Faltam crianças e uma viatura
Embora a escola seja para toda a gente a solução,
diz António André, passa por ir ter com
as crianças às escolas, fazer demonstrações
e tentar cativá-las. Porque entende que é
por volta dos sete, oito, nove anos que é mais
fácil incutir-lhes o gosto pela música.
Um trabalho que não está a ser feito mas
para o qual o maestro espera que a direcção
avance em breve, porque entende que o futuro destas instituições
são as escolas. Quanto à campanha de angariação
de interessados em aprender, lançada há
alguns meses, com papéis colados em montras da
cidade, não surtiu efeito.
Outra dificuldade, que impossibilita que haja mais um
ensaio por semana e que desmobiliza algumas pessoas, é
o facto de a Banda não ter transporte próprio.
A cidade cresceu, as pessoas estão dispersas por
vários locais e tem de ser o vice-presidente da
instituição a fazer a recolha e distribuição
no seu veículo, para poder vir mais gente.
Mas segundo António Taborda, o elemento mais velho,
que tem 73 anos e entrou para a Banda da Covilhã
à 58, entende que para além de agora as
pessoas estarem mais espalhadas há outros motivos
para a banda só ter actualmente 26 músicos
e as coisas terem mudado. Um deles é o facto de
agora haver mais diversões e locais para ir. E
diz que enquanto há 60 anos, quando a banda nasceu,
a 1 de Dezembro de 1944, não havia muitos sítios
onde passar o tempo, agora, para além da televisão,
computadores e os cafés, que se multiplicaram,
há também várias colectividades na
cidade com diversos desportos que se podem praticar. Clubes
que surgiram entretanto, alguns deles a completarem este
ano 50 anos.
Um dos atractivos da banda
reside no facto de se aprender música de
forma gratuita
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Solfejo é a fase mais difícil
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Filho, sobrinho e irmão de músicos, foi
aos 13 anos que António Taborda começou
a aprender música na Banda. A pior parte, segundo
o maestro André, que diz que o tempo que demora
a passar para o instrumento depende “do gosto de
cada um, da facilidade em aprender e da dedicação”.
“Pode levar poucos meses ou um ano, depende”.
E acrescenta que alguns desistem neste período,
mais aborrecido. “Mas quem ultrapassa esta fase
ganha-lhe o gosto”, frisa. As primeiras saídas
de António Taborda com o trompete foram arruadas.
Tal como a de Sílvia Silva, que entrou há
dois meses, convidada pela colega que anda também
na EPABI para tocar flauta. Já sabia tocar e aquilo
que lhe fez confusão foi ter de andar, ainda por
cima com passo acertado, e tocar ao mesmo tempo, a olhar
para a pauta. “Parecia que o chão me estava
a fugir por baixo dos pés, é estranho”,
confidencia. Uma situação que os mais velhos
dizem que em pouco tempo se torna uma coisa natural, com
o hábito.
Outra coisa que a surpreendeu, diz, foi “a familiaridade
que há entre os mais novos e os mais velhos”.
Um ambiente reiterado pelo maestro, que vê vantagens
nas diferenças etárias, porque “aprendem
uns com os outros, os mais velhos e os mais novos”.
O repertório vai sendo actualizado e, a par dos
clássicos da banda, como as marchas, tocam também
músicas mais actuais. Contudo, é necessário
escolher músicas que todos consigam executar, porque
António André é da opinião
que é preferível uma coisa mais simples
mas que seja bem tocada. Para além disso, o repertório
tem também de ser adequado aos instrumentos que
têm, que por sinal estão, tal como as fardas,
a precisar de renovação. O que não
foi feito ainda devido às dificuldades financeiras.
Incêndio na sede destruiu tudo
O maestro explica que os instrumentos nem são muito
antigos, porque depois do incêndio de 92, que destruiu
tudo o que a banda tinha na sede da Rua Senhor da Paciência,
foi adquirido material novo. “Mas como o dinheiro
era pouco foi-se ao mais barato e passados 14 anos o nosso
instrumental está velho, e isso reflecte-se na
qualidade”, realça António André,
que lamenta o facto de em Portugal os instrumentos musicais
ainda serem considerados “artigos de luxo”
e bastante caros.
António Taborda conta que as origens da Banda remontam
a antes de 1944. Explica que em 37 foi encerrada uma banda
que existia por a seguir a um concerto terem aparecido
nas paredes mensagens consideradas subversivas pelo regime.
Em 44 um grupo de pessoas tentou reorganizar um grupo
de músicos e "o mestre era um indivíduo
do regimento militar Infantaria XXI", onde é
actualmente a universidade. Os encontros eram "na
rua do antigo asilo".
Mas tarde mudaram-se para a sede que viria a arder. E
se o músico mais antigo da banda fala com gosto
dos outros momentos, é com a voz embargada que
diz que não gosta de recordar o incêndio.
"Andei mais de três meses a pensar no trompete
que lá ficou no meio das chamas", diz, e acrescenta
que se pediu dinheiro a toda a gente para a banda voltar
a funcionar. Mas esse foi um golpe duro que já
passou. Para o futuro, espera melhores dias e que a Banda
da Covilhã volte a ter o movimento e dinamismo
por que era conhecida até à pouco.
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