Foram muitos os professores que esta semana foram par o sindicato tentar resolver os problemas de colocação
Concurso nacional
O desespero dos professores

Prioridades não respeitadas e eliminação de anos de serviço são alguns dos erros que persistem na lista definitiva e que fazem desesperar alguns professores, que a poucos dias do início do ano lectivo ainda não sabem onde vão leccionar.


Por Ana Ribeiro Rodrigues
NC / Urbi et Orbi


Sentada na sala de reuniões da delegação da Covilhã do Sindicato dos Professores da Região Centro (SPRC), por onde durante os últimos dias já passaram muitos docentes, Maria (nome fictício) vai mexendo e remexendo os papéis, olhando de vez em quando para o vazio, e acende cigarros atrás de outros, enquanto preenche o recurso hierárquico para enviar à ministra da Educação. A única forma este ano que os professores têm de reclamar.
Maria é uma das muitas pessoas afectadas pelos erros que se continuam a verificar na lista definitiva de colocação de professores, divulgada na semana passada. Revoltada, explica que após 20 anos de serviço não aparece colocada. Uma situação para a qual não encontra explicação senão "a incompetência" do ministério da tutela. Concorreu a uma vaga de quadro que tinha visto no aviso de abertura, mas as listas dizem que não foi colocada. No entanto, a vaga também não foi preenchida.
Com os olhos a conter as lágrimas diz que sabe que o recurso hierárquico não vai ter resultados práticos atempadamente, "mas é a única alternativa". E conta uma experiência antiga que não a deixa ter ilusões. "Há dois anos meti o recurso e só passados nove meses é que me deram razão. Ora, ficou tudo igual", frisa. "Agora eu pergunto é quem é que nos vai pagar o ordenado de Setembro".
Esta professora salienta que "há casos tão ou mais flagrantes quanto este" e não tem dúvidas este é o pior ano de que tem memória na forma como está a decorrer o processo de colocação de professores. E sublinha que "estes concursos estão cada vez mais escuros" e que é cada vez mais difícil ser professora, já que não está no quadro e todos os anos tem de andar nestas andanças, com esta agravante este ano.

"A nossa vida depende deste totoloto"

Para além deste caso há muitos outros, mais ou menos graves. E também quem se dirija ao Sindicato apenas para esclarecer dúvidas, um vez que os erros das listas provisórias já foram corrigidos. Lídia Sousa, da Covilhã, é uma dessas pessoas. Professora há 17 anos ainda não sabe onde vai ser colocada e continua com problemas de aproximação à residência. O ano passado estava em Vila Velha de Ródão e para estar junto à família ia e vinha todos os dias. Este ano ainda continua indefinido e o atraso de três meses do concurso só vem complicar ainda mais a situação. "É difícil gerir a nossa vida porque não sabemos o que nos espera. Tudo parece um totoloto. E desse totoloto depende a nossa vida profissional, pessoal e também o nosso desgaste", frisa.
Dulce Pinheiro, delegada distrital do SPRC, diz que pelo que tem visto continua a haver muitos erros. O mais comum é a ultrapassagem na lista de professores mais graduados por menos graduados. Mas verificam-se outros com frequência, como professores que deviam concorrer na primeira prioridade e concorrem na segunda e pessoas a quem são retirados anos de serviço. "O caso mais grave que nos aqui apareceu a esse nível foi uma professora a quem foram retirados quase dois mil e 500 dias e caiu 700 lugares na lista", conta.
Mas há outras penalizações. A maioria dos professores teve que se apresentar até dia 2 na escola onde deram aulas no ano anterior, embora não saibam onde vão ficar. Acontece que normalmente são deslocados e já não têm aí casa. Desta forma têm de encontrar por estes dias onde ficar e quando souberem para onde vão ir procurar casa à pressa.
Depois dos atrasos sucessivos na divulgação das listas de ordenação e colocação o Governo entendeu que seria preferível, numa tentativa de acelerar o processo, de só aceitar as candidaturas a destacamentos e afectações via Internet. Mas o sistema bloqueou. Por isso o ministério da Educação dilatou o prazo de domingo para terça-feira. Antes disso já tinha surgido o problema do atraso no envio dos dados para que os docentes pudessem fazer a candidatura.

Custas devem inibir muitos de avançar para tribunal

Quanto aos professores excluídos, que o ministério diz serem três mil e 500 e algumas associações sindicais mais de seis mil, Dulce Pinheiro explica o que se pode esperar, uma vez que o recurso hierárquico não tem efeitos suspensivos. "Ou já tinham uma escola e regressam ou estavam-se a candidatar a um quadro e não têm hipótese de aceder a uma nova colocação. Há outro tipo de professores que estavam num QZP e queriam aceder a um quadro de escola. Nesse caso não ficam sem colocação, estão é numa nova fase de candidatura para saber para que escola vão". Só depois de colocados os quadros e conhecidas as vagas é que serão divulgadas as listas dos professores contratados.
E embora a ministra da educação tenha dito que até dia 23, data limite para o início das aulas, todos os professores estejam colocados, Dulce Pinheiro duvida. "Não sei a que universo de professores ela se estava a referir, mas duvido muito que esses prazos possam ser cumpridos, devido aos muitos prazos intermédios que ainda estão por cumprir".
No que diz respeito aos efeitos práticos do recurso hierárquico a sindicalista diz que não quer estar já a tirar expectativas a quem o está a fazer, mas duvida que a ministra tenha capacidade para dar resposta a todos. E se não o fizer num mês gera indeferimento tácito. Aí, restam os tribunais. E embora o advogado fique por conta do sindicato as custas para meter o processo rondam os mil euros, o que deve inibir muita gente que tinha vontade de ir até ao fim.