Por Rui Pires




As mulheres são em maior número, no que respeita ao Ensino Recorrente

São na maioria mulheres, que de acordo com o sistema que rege as sociedades contemporâneas, capitalistas, já não têm idade para trabalhar, e por outro lado são muito novas para se poderem reformar. Mesmo assim há quem se preocupe e tente de
alguma maneira proporcionar-lhes a aprendizagem de novos conhecimentos.
É o caso da Coordenação do Ensino Recorrente e Educação Extra-Escolar dos concelhos da Covilhã e Belmonte, que põe à disposição anualmente "cursos" das mais diversas áreas: Pintura em Vitral, Gravação em Estanho, Reciclagem, Pintura em Cerâmica, Internet, entre outros, num total de 34, e que este ano receberam cerca de 800 pessoas interessadas, nesta que pode ser a sua última oportunidade de aprender uma das artes decorativas que em outros tempos lhes foi vedada.
Anabela Ribeiro é a professora responsável pela Coordenação de Ensino Recorrente e Educação Extra-Escolar, que não se cansa de realçar a extrema importância destas formações. "Estes cursos têm uma grande importância para as pessoas que os frequentam. Ao abarcarem várias faixas etárias, possibilitam a convivência entre pessoas com experiências de vida diferentes. No que diz respeito aos mais idosos, ajuda-os a combater a solidão, as depressões, e servem muitas das vezes como terapia."
Anabela Ribeiro relata ainda, a propósito da importância destes cursos, uma história de grande regozijo: "Uma senhora disse-me há algum tempo, que a frequência destes cursos a ajudou a curar alguns problemas de saúde - deixou de tomar o "xanax" e não sei mais quantos comprimidos para adormecer - acontecer isto deixa-me pessoalmente bastante contente", salienta. Conta ainda que estas formações ajudam a recuperar a auto-estima perdida, visto que muitas pessoas se inscrevem num curso, para o qual pensam não ter jeito nenhum, e no final acabam surpreendidas com os resultados.
Estas formações decorrem anualmente entre Janeiro e Abril/Maio. Em Setembro do ano anterior é feita uma divulgação dos cursos aprovados pelo ministério, e daí passa-se à apresentação dos mesmos à comunidade. Utilizam-se para isso os meios de comunicação regionais, afixam-se cartazes em locais públicos, nas juntas de freguesia e autarquias, e por vezes é divulgada a sua abertura na homilias dominicais - tudo isto para que os cursos cheguem a todos. Após a divulgação dos mesmos, há um período de inscrições, onde é feita uma selecção dos candidatos. Estes são escolhidos de forma criteriosa e o mais rigorosamente possível, explica a coordenadora. "Primeiro seleccionamos as pessoas que na idade própria não tiveram a oportunidade de frequentar este tipo de formações ou a escola, depois damos prioridade a antigos alunos destas formações, seguem-se os beneficiários do Rendimento Mínimo Garantido, as pessoas com o nível de instrução mais baixo, e por fim pessoas que nunca tenham frequentado este tipo de cursos". Diz, visto que o seu objectivo é também contribuir para a inserção das pessoas na comunidade


Para além de aprenderem a ler e a escrever, estes alunos especiais desenvolvem outro tipo de trabalhos



Mãos de oiro

Estas são as mãos que dão vida as estes trabalhos, elaborados a partir das técnicas correspondentes a cada uma das artes decorativas. Após terem passado, na maioria dos casos, por um percurso de vida atribulado, estas mãos que já passaram pelos campos ou pelas fábricas, dedicam-se agora à arte. Não são nenhumas candidatas a artistas, mas fazem-no com total dedicação, amor e carinho. Maria João Grandão, 48 anos, frequentou os cursos de "Reciclagem" e "Cerâmica", pois acha que é muito importante aprender coisas e técnicas novas; "já frequentei outros cursos, mas nestas área não tinhas grandes conhecimentos e a convivência com novas pessoas, também é muito gratificante", salienta.
Maria José Pinto, 50 anos, frequentou "Cerâmica" e "Vitrais". Também é uma repetente nestes cursos, já antes passou pelas artes decorativas, e salienta igualmente o convívio com as colegas como um dos factores fundamentais. "Fazer coisas novas e diferentes que no dia a dia nunca consegui fazer e poder conhecer pessoas novas é o mais importante", diz. Também Filipa Raposo, de 29 anos, passou este ano pela formação de "Estanho". Tal como as suas colegas, indica a convivência e vontade de aprender como aspectos a ter em conta nestes cursos. "Adquiri conhecimentos para além da minha formação académica. E a possibilidade de fazer coisa novas e conhecer pessoas é uma mais-valia”, conclui.


Experiência enriquecedora

O contacto com as novas tecnologias é uma realidade

A orientar estas formações, estiveram vários professores, que durante alguns meses dedicaram o seu tempo a estas pessoas. Sérgio Novo foi um dos formadores que leccionou vários cursos: Pintura em Vitral, Gravação em Estanho, Reciclagem, Pintura em Cerâmica, e Internet. Para este formador foi uma experiência muito enriquecedora e gratificaste, pois além de partilhar o seu conhecimento pode adquirir outros saberes, além de ajudar estas pessoas a passar o tempo de forma diferente e pedagógica. "Estou muito satisfeito com o trabalho realizado, resultaram trabalhos muito bons e só o facto de poder de alguma forma ajudar estas pessoas no seu dia a dia foi óptimo. Tendo em conta que algumas das formandas têm uma auto estima muito baixa e que estão sempre a dizer que não são capazes, e ver agora no final que elas próprias ultrapassaram esses medos, foi o melhor que poderia ter acontecido," salienta.
A principal dificuldade encontrada por Sérgio Novo registou-se no curso de introdução à internet, onde grande parte dos formandos nunca tinha sequer estado em frente a um computador. "Muita gente não sabia sequer como se ligava um computador," conclui.
Este processo chegou agora ao fim, após um longo caminho, que durou sensivelmente um ano. Os trabalhos realizados nos diferentes cursos foram expostos no Teatro-Cine da Covilhã e houve uma cerimónia de entrega de diplomas aos alunos.

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