António Fidalgo
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Português
e inglês no ensino
Deve o ensino da língua inglesa
começar logo na escola primária, no agora
chamado primeiro ciclo do ensino básico? Há
quem defenda que sim e se socorra do exemplo dos países
nórdicos, onde o inglês se tornou quase uma
segunda língua. Também em colégios
privados portugueses, as crianças começam
logo a aprender inglês, seguindo o preceito de que
quanto mais cedo melhor.
Não há dúvida que o inglês
se tornou a língua da globalização,
da comunicação entre os mais diferentes
povos e culturas. Falado nos cinco continentes, sendo
a língua oficial de países importantes,
Inglaterra, Estados Unidos, Austrália, Nigéria,
África do Sul, e tendo um lugar predominante em
países muito populosos como Índia e Paquistão,
o inglês é certamente a língua franca
dos nossos dias. Com o peso económico do mundo
anglo-saxónico, tornou-se a língua do comércio,
da finança, da informática. Além
disso, e não menos importante, o inglês é
também a língua do show-business e da cultura
pop e rock. Os filmes vêm, na sua grande maioria,
da indústria cultural de Hollywood, e a música
também vem da Inglaterra e da América. O
mesmo se passa na ciência. Em certos campos científicos,
nomeadamente nas ciências da vida, o inglês
tornou-se não só língua franca, mas
quase exclusiva, escrevendo os cientistas directamente
em inglês.
Parece assim, á primeira vista, que os adeptos
da aprendizagem do inglês logo nos primeiros anos
do ensino oficial português têm pelo seu lado
a força dos números e dos factos. Mas, aqui
há a considerar um ponto que não é
menos importante. Se uma língua fosse apenas um
instrumento de comunicação, então
o inglês, enquanto a língua franca de facto
dos nossos dias, deveria ser aprendida depressa e em força.
Só que uma língua é muito mais que
comunicação, ela é também
e sobretudo a formulação do pensamento.
Quem não dominar bem uma língua terá
muitas dificuldades em elaborar um raciocínio complexo.
Mais importante que aprender o inglês de tenra idade
é aprender muito bem a língua materna, o
português. Este é um dos problemas do nosso
ensino: Os estudantes portugueses têm enormes dificuldades
no português. Não são apenas os célebres
erros ortográficos, pior é a falta de léxico,
o não domínio de estruturas sintácticas,
dos conjuntivos e das concordâncias verbais de tempo
e de modo, da falta de compreensão de textos lidos
e da incapacidade de redacção. Professores
das chamadas ciências exactas queixam-se que um
dos problemas graves que enfrentam é o de os alunos
não entenderem sequer as perguntas feitas.
Não há ensino que se aguente, seja em que
nível for, se faltar a base da língua. Obviamente
o ensino de mais uma língua não é
empecilho à boa aprendizagem da língua materna.
Outrora sabia-se bem português porque se aprendia
latim desde muito cedo. Hoje nada obsta a que se aprenda
o inglês a par do português, mas com a certeza
de que não há poliglotismo que substitua
o conhecimento profundo da língua materna como
condição de pensamento com cabeça,
tronco e membros.
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