Certas
designações, de tão abstractas que
se apresentam que perdem o verdadeiro significados. Pelo
código linguístico actual criamos expressões
como “danos colaterais”, que a semântica
da guerra se encarrega de minimizar aos olhos do comum
mortal.
No “campo de batalha”, por mais bombas teleguiadas,
por mais artilharia sofisticada, continuam a viver seres
humanos. Igual, ou melhor, semelhantes aos que dão
a ordem de partida para as tropas. Seres com sentimentos,
seres como Lateef. Este jovem iraniano serve chá
e bolachas aos refugiados afegãos que trabalham,
ilegalmente, na construção de habitações.
Lateef, ainda novo, tem um salário baixo, do qual,
o patrão retira alguns dividendos. Mas um salário
suficiente para ir silenciando os maus tratos e a exploração
feita aos refugiados, pelo superior. Bem como, ajudar
no procedimento combinado para quando as autoridades aparecem.
Se a obra é examinada, há que esconder os
trabalhadores.
É no meio destes contratempos que o jovem Lateef
vai encontrar dois episódios que mudam radicalmente
a sua vida. O acidente de um dos trabalhadores que mais
lidava com o este jovem distribuidor de chás, um
refugiado afegão de nome Najaf. Quando Najaf parte
uma perna durante o trabalho, Lateef tenta ajudá-lo.
O pouco dinheiro que ganhava neste trabalho forçado
e ilegal sustentava a família. Agora tem de ser
o seu filho varão, apenas com 11 anos, a estar
no lugar do pai.
O patrão de Lateef não vai ver com bons
olhos esta troca, até porque o pequeno Rahmat não
tem capacidade para executar este trabalho. O distribuidor
de chás vai ajudar no que pode, até ao dia
em que vislumbra o sentido da sua vida por detrás
de um pano opaco utilizado como cortina.
Lateef é atraído pelo canto de uma jovem
que compõe a mesa do pequeno espaço que
serve de habitação ao nosso herói.
Este, ao ver o seu rosto apaixona-se de imediato.
Com o passar do tempo, a paixão vai crescendo até
ao dia em que Lateef pretende conhecer a família
da rapariga. Quando entra no pequeno barracão de
plásticos e paus, descobre que o pai da jovem é
o homem de que tanto gostava e tinha ajudado tempos antes,
e o seu irmão, o pequeno Rahmat.
Este impressionante romance tem como fundo um cenário
destruído pelas acções de alguns
e falta de amor desses mesmos. Um gesto, uma vivência
e uma paixão onde a obra cinematográfica
é, por vezes, colocada em segundo plano e o que
de fundamental se transmite prende-se com os sentimentos
das pessoas. A capacidade do ser humano de amar até
nas condições mais limites da sua existência,
prova como a guerra nunca triunfará.
A não perder.